7.1.16

Estreia de musical reconta história da Cabanagem

“Cabanagem, o musical”,  adaptado da obra “Cabanagem - Poema”, escrita pelo pesquisador, professor e médico, especializado em saúde pública, Valdecir Manuel Affonso Palhares, traz novas luzes sobre a história da maior revolução popular já ocorrida do país. A estreia, neste sábado, 9 de janeiro, às 20h, no Teatro Margarida Schivasappa do Centur, conta ainda com o lançamento do livro e do CD que deram origem ao espetáculo.

Janeiro é marcante na história da capital paraense. Além de ser o mês de sua fundação no dia 12 (chegaremos aos 400 anos na próxima semana), foi também quando, exatamente no dia 7 de janeiro, há 181, estourava a Cabanagem, única revolução popular em que o povo, de fato, tomou o poder neste país. Em pleno Império do Brasil, na então província do Grão-Pará, em 7 de janeiro 1835, período regencial brasileiro,  tapuias, cabanos, negros e índios liderados por Antônio Vinagre, toram o quartel e o palácio do governo de Belém. 

O império consegue sufocar a revolta, em 1841, promovendo um extermínio em massa da população paraense. Esse história, porém, até hoje, é pouco pesquisada no país, ou mesmo estudada nas escolas paraenses. Um cidadão paulista, porém, teve curiosidade para revirar mais de 300 obras, conseguindo elucidar vários pontos obscuros para recontar uma história antes só contada sob a ótica do império que, depois de derramar muito sangue, recuperou o poder.

Valdecir Palhares escreveu assim o livro “Cabanagem, Poema”, que rendeu mais de 230 versos, que foram adaptados pela diretora, atriz e também pesquisadora Ester Sá, integra um projeto que além do livro poema e do espetáculo, conta com um CD com 18 músicas, que compõem a trilha sonora do musical, trazendo arranjos de Luiz Pardal e Jacinto Kahwage, e interpretação de Allan Carvalho, Nanna Reis e Rogério Brito. O CD e o Livro serão lançados na ocasião da estreia do espetáculo, neste sábado, 9, com realização da UNICON - Cooperativa Mista de Consumidores do Brasil e patrocínio da UNICON e COOPERUFPA.


ESPETÁCULO REÚNE VÁRIAS LINGUAGENS ARTISTICAS


Ester Sá dirige cena / Fotos: Uirandê Gomes
Para Ester Sá, o projeto traz uma enorme contribuição histórica, que elucida fatos sobre uma fase ainda obscura sobre a nossa história.

“O livro já é um si uma grande contribuição e o espetáculo, que faz essa tradução da palavra para o cênico, tem a função de gerar o afeto , no sentido de ‘ser afetado por’. Essa foi a ideia desta encenação. Fazemos um passeio pela história, desejando que a plateia ria, sinta dor, comoção, revolta, reflexão”, diz Ester Sá.

No seu conjunto, o projeto é uma valiosa aula de história, repassada de forma lúdica, unindo arte e a educação e que pretende, em uma segunda temporada, prevista para os meses de maio e junho, circular por escolas e por cidades paraenses, principalmente aquelas em que a revolução cabana se fez mais presente.

As cenas do espetáculo foram sendo compostas e a equipe de criação começa a trabalhar e dar forma a ideia primeira que vai sendo moldada com muitas mãos. “Nesta tarefa contei com o apoio luxuoso da muitas pessoas que compõem o trabalho, muitas mãos, vozes e inteligências somadas”, ressalta Ester Sá.

Elenco: Paulo Vasconcelos, Vandiléia Foro e Sandra Perlin
Os atores Paulo Vasconcelos, Vandiléia Foro e Sandra Perlin conduzem a trama. A Direção de Elenco é de Adriana Cruz, com coreografia de Nazaré Azevedo, dos próprios atores e dos 19 bailarinos do Grupo Parafolclórico Frutos do Pará. A visualidade do espetáculo vai surgindo pelo olhar dos artistas criadores Maurício Franco (figurinos), Malu Rabelo (Luz), Nívia e Sam do Projeto Camapu (bonecos), André Mardock (vídeo), Jorge Cunha (Malas-cenário) dentre outros. 

As ilustrações de Biratan Porto, que estão também no livro, foram utilizadas incorporando o vídeo que é projetado no espetáculo, ora contextualizando, ora narrando e jogando cenicamente com o elenco. No comando da Produção, os "Produtores Criativos" com Direção de Produção de Cristina Costa. 

Reunindo várias linguagens artísticas, o espetáculo tem as músicas que, nesta temporada, ainda serão executadas de forma mecânica, mas na próxima, serão realizadas ao vivo. 

“Após o trabalho de edição do texto (adaptação) os compositores criaram as músicas já em conexão com a criação cênica. Pude interferir nesta criação no sentido de solicitar ao Luiz Pardal e o Jacinto Kahwage estados, ritmos, climas, e até tempos nas músicas... Eu ia explicando para eles o que queria encenar e eles iam criando para a cena. Foi um trabalho muito rico essa troca com os músicos que entenderam a proposta e trabalhamos numa parceria muito sintonizada”, diz Ester Sá.

Foram muitos meses de trabalho. A adaptação e formação de equipe iniciaram em agosto de 2015. Os ensaios, em outubro.  Os desafios foram muitos até esta estreia, mas também foi um processo prazeroso e cheio de aprendizado, como conta Ester Sá.

“Tanto na questão desta criação do Cabanagem, que me trouxe conhecimento de história, e isso é uma coisa que sempre me instiga, quanto na composição de uma equipe coesa e azeitada para realização de trabalho como esse, de grande porte, no sentido de dimensão da produção. Temos capacidade e talento para a criação de grandes espetáculos como esse com nossos profissionais na cidade, e vejo isso como abertura de mercado para todos da área”, comenta.

PESQUISA CONTEXTUALIZA CABANAGEM NA HISTÓRIA MUNDIAL


Sandra Perlin, representando a Corte Portuguesa
Ester Sá percebeu a dimensão do poema criada pelo Valdecir. “Ele foi minuncioso na pesquisa e compôs sua obra com encadeamento dos fatos desenhando o histórico de exploração e injustiças que o povo sofreu para que a revolução fosse sendo formada. A Cabanagem em sua obra é mostrada como um fato integrado no tempo, uma culminância aos acontecimentos políticos e sociais da época de uma forma bem ampla, conectada com o Brasil e o mundo todo, que estava em transformação”, diz a diretora.

Isso resultou numa obra extensa demais para um espetáculo, então o primeiro desafio da diretora foi escolher o que ficar para o roteiro do espetáculo, privilegiando esta construção do tempo na mente do espectador e buscando boas soluções cênicas. “A obra do Valdecir tem sua força maior em seu compromisso didático, e para mim, isto foi um desafio também, pois foi a primeira vez que criei um espetáculo com esse viés em primeiro plano”, finaliza Ester Sá.

O musical ficou então dividido em 18 cenas: Quem conta a história da história/ Cenário histórico mundial/ Guaiamiaba – O primeiro herói da Amazônia/Ajuricaba – Revolta indígena em Manaus/A Corte Portuguesa no Brasil/Revoltas políticas no período Regencial/A Independência: Um Império para Dom Pedro I/O mercado da Independência/Ação mercenária/Brigue Palhaço/Presença do Clero na Cabanagem/Ofensas em Cametá/Um quadro histórico analítico/Consagração popular/Tomada do poder/Governos Cabanos/Uma história de Eduardo Angelim/Heroísmo Cabano.

300 OBRAS E MAIS DE CINCO ANOS PRA ESCREVER UM POEMA


Escrito pelo professor Valdecir Palhares, o livro poema é resultado de uma minuciosa pesquisa que durou mais de cinco anos, sobre a Cabanagem, a maior revolução popular já vivida no Brasil. A tarefa nada fácil de traduzir a história da principal insurreição brasileira, foi apoiada por sua visão acerca dos escritos sobre as raízes das mobilizações cabanas. 

“A pesquisa gerou mais de 200 versos. Quando fui escrevendo, fiquei surpreso com a dimensão que foi a Cabanagem, eu não tinha nem ideia disso, por exemplo, que foi a única revolução popular que o povo tomou o poder. Eu nunca vi isso, nunca teve outra, primeiro que mataram dois governadores, segundo que durou cinco anos de guerra, e não foi só aqui em Belém, foi em toda a Amazônia”, comenta Palhares.

Para chegar ao resultado final, o autor fez toda uma contextualização dos fatos que ocorreram, antes, durante e depois da Cabanagem. De acordo com sua pesquisa, a revolução Cabana começou em Belém e foi até a divisa do Brasil com o Peru, subindo pelo Rio Negro. 

“Foram 05 anos de luta, morreram 40.000 pessoas. Em nenhuma guerra morreu tanta gente, até então. A que mais matou depois dessa foi a do Paraguai, com 20.000, depois foi a Balaiada, que matou 9.000 e a guerra de Farrapos, no Rio Grande do Sul, que durou 10 anos e foi contemporânea a Cabanagem, em que morreram 3.400 e poucas pessoas”, continua. 

Mas a diferença, diz ele, é que a luta da Farroupilha, por exemplo, foi feita por fazendeiros que queriam separar o Rio Grande do Sul do Brasil. “Aqui não. Era uma luta republicana contra o Império, não havia intenção de separação de nada, e era uma revolta que o povo tinha desde a fundação de Belém”, revela. 


REVOLTA CABANA NASCE DA RESISTÊNCIA INDÍGENA


Ilustrações, Biratan Porto
Revirando mais de 300 obras, Palhares chegou a descobrir o primeiro e único herói indígena, Guaiamiaba, o Morubixaba dos Tupinambás, o guerreiro mais corajoso, que ia à frente, na guerra. “Cada aldeia tinha o seu. Este veio antes do mais conhecido Ajuricaba, de Manaus”, conta Palhares.

Os indígenas foram a primeira resistência ao domínio do colonizador. Apesar de serem bem recebidos, os Portugueses, aqui, tomaram a arma do índio, sua flecha, sua lança, e é claro que os índios se revoltaram e mataram um monte deles. Os portugueses quiseram se vingar, entraram pelo rio, dizimaram outras aldeias. 

“Em contrapartida, os Tupinambás fizeram uma federação de mais de 600 aldeias e ficaram dois anos em guerra com o portugueses e isso acabou chegando em Belém. O Guaiamiaba quebrou as flechas que indicavam a guerra e incendiou o forte, que na época era de madeira, feito de troncos de açaizeiros. Foi quando os portugueses atiraram e mataram o Guaiamiaba. Por este gesto, por este ato, ele passa a ser o primeiro herói indígena da Amazônia, da resistência e ocupação”, diz o pesquisador.

“O objetivo desse projeto é que a população tenha consciência do que foi esta revolução realmente. O livro é completo, está divido em poemas, músicas com partituras e qualquer escola poderá ter esse material e a peça teatral. Há um desdobramento na área cultural, mas o objetivo é a educação”, finaliza Palhares.

O autor - Nascido em São Paulo, na cidade de Bebedouros, Valdecir Manuel Affonso Palhares se diz paraense por opção. “Vim pra cá fazer medicina e acabei ficando, nunca mais fui embora, mas minha família mora toda em SP”, conta o pesquisador que dirige desde 1986, a Cooperativa Mista de Consumidores do Brasil (UNICON), patrocinadora do projeto da Cabanagem e de outros projetos desenvolvidos sempre nesta área educacional e cultural.

Paulista, que viveu sua juventude ligada ao Movimento Estudantil libertário do anarquismo em São Paulo, foi no Pará que fez vestibular e cursou Medicina na UFPA, onde estabeleceu relações com o movimento esquerdista. Valdecir fez parte da geração que ficou na Faculdade de Medicina após a ocupação de 1968.

Entre outros projetos, ele assina também a obra intitulada 'Um Poema para Belém', redigida por 12 anos, gerando dois CDs, lançados no dia 12 de janeiro de 2011, com arranjos de Manoel Cordeiro e o segundo, dos músicos Jacinto Kahwage e Luiz Pardal.

Ficha Técnica

  • Poema: Valdecir Palhares
  • Adaptação do texto para a encenação- Ester Sá
  • Músicas e Arranjos: Luiz Pardal e Jacinto Kahwage
  • Intérpretes das músicas: Allan Carvalho, Nanna Reis e Rogério Brito
  • Iluminação - Malu Rabelo
  • Figurinos - Maurício Franco
  • Vídeo - André Mardock
  • Ilustrações - Biratan Porto
  • Coreografias - Nazaré Azevedo/ Grupo Frutos do Pará
  • Atores - Sandra Perlin, Paulo Vasconcelos e Vandiléia Foro
  • Coro Coreográfico - Grupo Frutos do Pará: Yasmin Luna, Christiane Azevedo, Kledison Gomes, Gabriel Saraiva,Tatienne Silva, Frank Silva,Luiz Jhonatan, Anny Maués, Taynara Garcia, Vânia Delarosa, Alex Fernandes, Lizandra Nascimento, Marcus Cezar, Markus Menezes, Samantha Campos, Thiago Barbosa, Diego Pereira, Larissa Rocha, Ana Eduarda Santos.
  • Operação de Sonoplastia: Oiran Gomes
  • Bonecos - Projeto Camapu
  • Adereços – Handerson Ramos
  • Malas-Cenário - Jorge Cunha
  • Assessoria de Técnicas Circences - Charles Monteiro
  • Costureiras - Ila Falcão e Nanan Falcão
  • Assistentes de coxia – Mauricio Franco, Ila Falcão, Nanan Falcão e Claudia Duarte Assistente de Iluminação - Thiago Ferradaes
  • Técnicos do TMS – João da Mata, José Igreja e Fernando Dako
  • Equipe de Produção - Produtores Criativos: Andréa Rocha, Fafá Sobrinho, Oiran Gomes, Lucas Alberto, Uirandê Gomes, Thiago Ferradaes e Nanan Falcão
  • Assessoria de imprensa – Luciana Medeiros
  • Registro fotográfico – Uirandê Gomes
  • Arte Gráfica - Mieko Takehana
  • Direção de Palco - Cláudio Bastos
  • Direção de Elenco - Adriana Cruz
  • Direção de Produção - Cristina Costa/Produtores Criativos
  • Direção Geral - Ester Sá

Serviço
UNICON apresenta “Cabanagem – O Musical”, um poema de Valdecir Palhares, com músicas de Luiz Pardal e Jacinto Kahwage, com adaptação e encenação de Ester Sá. Dia 9 de janeiro de 2016, às 20h, no Teatro Margarida Schivasappa. Lançamento do livro (R$ 55,00) e do CD “Cabanagem - Poema” (R$ 15,00). Entrada franca com convite. Mais informações: (91) 9 8171.8282 (tim) / 9 9111.5658 (vivo).

Nenhum comentário: