29.4.17

"Tambores de Rio" traz obras de André Nascimento

Fotos: Divulgação
As canções inéditas do artista ganham interpretação de Cissa de Luna. Inspiradas nas encantarias, pajelanças e nos cultos religiosos de matrizes afro-ameríndias,  as obras expressam poética simples e profunda em sua essência. O evento foi contemplado com o edital Seiva, da Fundação Cultural do Pará (FCP) e terá a participação da cantora Renata del Pinho. O show será no dia 17 de maio, às 20h, no Teatro Margarida Schivasappa.
Idealizador do projeto, André Nascimento explica que o show “surgiu do encontro de dois artistas, um compositor e uma intérprete, que, irmanados por suas experiências de vida e de origem, lançam-se em um interlúdio musical entre o onírico e o telúrico, cujos rios desaguam nos tambores de sonoridade forte, fluente e pujante como a opulenta Amazônia. Cantamos o sagrado em sua dimensão ancestral e divina”, comenta.
Além disso, Cissa cantará cinco músicas de seu disco “Waldemar Caymmi – A Travessia das Águas”, lançado em 2014 com patrocínio da Secult/PA em convênio com a Academia Paraense de Música. Dentre as canções do repertório, estão “A lenda do Abaeté” e “A jangada voltou só”, do baiano Dorival Caymmi, e “A Vela que passou”, “Abaluaiê” e “Valsinha do Marajó”, do paraense Waldemar Henrique.
Foto: Walda Marques
“São cinco músicas do meu álbum anterior que decidimos apresentar neste show, pois abordam a questão das águas, do sincretismo religioso, da força da natureza. E esse show surgiu quando André me convidou para interpretar as músicas dele”, diz a cantora.
O diálogo musical entre as obras de Caymmi e Waldemar parte da simplicidade e da densidade reveladas nas canções desses compositores, sobretudo nas que tratam das águas.
“Elas têm uma ressonância mítica de questões como o sagrado, o amor, a morte, o tempo, banhados pela opulência da natureza e das águas, que transcende os limites da Bahia e da Amazônia. É o encontro do rio com o mar. Em Salvador fui absorvendo desde pequena esse sincretismo brasileiro. A Lavagem do Bonfim é um lindo momento de integração entre religiões, em que padre anda de mãos dadas com mãe de santo. Também as festas de Iemanjá, as águas e a força percussiva me marcaram muito", explica.
Cissa teve contato com várias expressões artísticas na família e, por meio de sua mãe, a cantora criou gosto pelo canto, dança, teatro, poesia e artes plásticas. "Esse ambiente imprimiu em mim sobretudo o interesse pelo canto e pela dança", conta. Outras duas pessoas também contribuíram com esse universo lúdico: a avó materna, prima de Ary Barroso, que de vez em quando cantarolava para Cissa músicas de Ary, e seu avô paterno, que era primo de Jorge Amado.
A música e o divino maravilhoso
Foto: Walda Marques
André Nascimento, que é artista plástico e também um dos fundadores da banda Epadu, teve, ainda na infância, contato com religiões como Umbanda e Tambor de Mina, por meio da mãe, que frequentava terreiros, mesmo sendo católica. 
Da memória de criança se fortaleceu no artista o interesse em reinterpretar o som percussivo dos rituais sagrados. Ele também começou a se interessar por pajelanças e é da união desse universo divino que surgiu sua inspiração para compor.
"Isso foi evoluindo com a minha vivência e andanças pelo Brasil e as referências das entidades se mostraram no meu trabalho como um todo, na música, como artista plástico e poeta. E também tenho forte relação com o carimbó, que é o meu ritmo primeiro. Para mim, o tambor do carimbó também é sagrado. É por ter fé e crença, elementos fortes da cultura brasileira, que eu componho”, diz André.
Serviço
Show Tambores de Rio, com Cissa de Luna. No dDa 17 de maio, às 20h, no Teatro Margarida Schivasappa – Centur (Av. Gentil Bittencourt, 650, Nazaré). Ingressos: R$ 20,00. Disponíveis na Loja Ná Figueredo (Estação das Docas). Ingresso Promocional antecipado online pelo Sympla: https://goo.gl/sYGDXA . Informações: (91) 98726-4128 / 99806-2754.

26.4.17

Clei Souza lança novo e premiado livro de poemas

O poeta Clei Souza lança o livro "Poema pássaro e outros versos migratórios" neste sábado (29), a partir das 20h, no Espaço Sinhá Pureza, em Belém. Durante o evento haverá show das banda Folha de Concreto, com a participação da banda Koan.  A segunda publicação editada por Clei Souza é resultado do prêmio Dalcídio Jurandir de criação literária, na categoria poesia, edição 2015, da Fundação Cultural do Pará. 

Os escritos foram realizados nos últimos quatro anos, mas ele já escreve há mais de 20 e tem produção de livros artesanais além de outro livro premiado em 2010 e lançado em 2012, pelo antigo Instituto de Artes do Pará (IAP).

“Também faço letra de música com as bandas Coisas de Ninguém e Folha de Concreto. Poema pássaro é o título de um poema em que os versos finais falam da questão de se deslocar no espaço e da estranheza do tempo de hoje, mas que mesmo assim esse pássaro ainda quer voar em busca da liberdade e pelo grande voo”, explica o escritor.

A renda do evento será destinada para a gravação da canção "O Estrangeiro", que terá um clipe feito a partir de fotos e vídeos enviados por internautas, contendo matérias que expressem protestos contra a homofobia, a xenofobia, o racismo e a exploração. 

"A letra diz: sou o ilegal garimpeiro deportado da Guiana/um nordestino linchado na avenida paulista/um brasileiro suspeito à polícia londrina/um gay espancado por um grupo neonazista/vou manchar tua cor/vou sujar o teu sangue/e te dar o meu beijo impuro/meu amor/sou um africano vigiado nas ruas de Berlim/a mulçumana proibida de usar burca em Paris/sou um índio incendiado numa praça de Brasília/O morro pacificado na cidade maravilha", canta Clei.

Serviço
Lançamento do livro Poema Pássaro e outros versos migratórios e show da banda Folha de Concreto. No Espaço Sinhá Pureza (Av. Alm. Tamandaré, 401A - Cidade Velha). No sábado, 29 de abril, às 20h. Ingressos: R$ 5,00. O livro custa R$ 20,00.

25.4.17

Casarão traz sábado cênico e lúdico no Amostra Aí

O Casarão do Boneco realiza, neste sábado, 29, a partir das 18h, mais um Amostra Aí, evento voltado ao público infantil, mas que adulto também adora. A proposta segue a linha de sustentabilidade do espaço, com ingresso na base do ‘Pague quanto puder’.​ Na Av. 16 de Novembro, 815, entre Veiga Cabral e Praça Amazonas.

Sempre recheado de bons espetáculos, performances e contações de histórias, e datado do ano de 1903, além de manutenção, o Casarão do Boneco precisa de reparos em seu corredor, pisos e fachada. Em 2015, foi lançada uma campanha Salve Salve Casarão do Boneco, com projeto de captação de recursos pelo Catarse. A meta de  R$ 60.000,00 não foi alcançada: https://www.catarse.me/salvecasaraodoboneco. 

O Casarão segue sua jornada, abrindo suas portas, recebendo o público, trazendo momentos lúdicos e de emoções diversas, com apresentações no Anfiteatro dos Tajás e em suas salas, realizando oficinas, encontros e sim, tramando sempre mil ideias para que se cumpra a real meta de seu destino. O espetáculo não pode parar!

Histórias, exposição de mamulengos e performance

Marluce Oliveira conta história
A nova edição do projeto Amostra Aí, inicia às 18h, ainda no portão do Casarão do Boneco, quando o público é recebido pelo mascarado Evanescente, uma performance mascarada ou um teatro de rua na calçada. 

Maurício Francco coloca a máscara Evanescente, os sinônimos do seu nome demarcam suas características, da leveza no andar ou o esvanecer do até logo. A ação artística provoca o jogo do relacionar-se com o entorno.

Próximo passo é para dentro do Casarão, onde os bonecos anfitriões recebem todos na diversificada e colorida exposição de Mamulengos do Casarão. A mostra remonta um histórico de trabalho da In Bust – Teatro Com Bonecos, na Tv Cultura com o programa infantil Catalendas, além de bonecos de oficinas e espetáculos construídos ao longo de duas décadas do grupo.

Moradores totais do casarão, é lá mesmo, que eles vivem e fazem a festa, vejam: https://www.youtube.com/watch?v=l6lUPJKjczc

Inaugurada na última edição do projeto Circular Campina-Cidade Velha, no começo do mês de abril, a exposição atraiu a atenção de crianças e adultos, que têm a oportunidade de se encantar com a originalidade e detalhes dos bonecos, construídos com características da cultura paraense: o patchouli, a juta, as sementes, o miriti, que por si, já contam histórias da região nortista.

Vandileia Foro conta história
Ás 19h, duas histórias serão apresentadas no Anfiteatro dos Tajás, “A menina que Reencantou seu mundo”, de Marluce Araújo. Arte-educadora que sempre enriquece a programação da casa com a ludicidade de suas histórias, conta como a menina AUE descobre na arte de contar histórias, seu encanto pelo mundo.

Em seguida Vandiléia Foro apresenta “Clarinha na ilha”, que narra a história de uma menina que ao brincar de barco em sua banheira, imagina fazer um passeio por uma ilha, onde encontra animais diferentes dos que conhecia, estranhos, mas que garantem uma história cheia de aventuras e novas descobertas. Tudo isso é contado por uma vendedora de brinquedos que está perdida, sem saber como chegar na Ilha de Cotijuba.

Entre a abertura e o início da contação de histórias, o público também pode dar uma voltinha e se deliciar com as comidas da Alimentação Gentil, e adquirir na lojinha, DVD's, CD's e livros, com preços acessíveis. O bazar de roupas vai funcionar também com novidades em seu acervo.

In Bust encerra programação com espetáculo

O Conto que eu Vim Contar, com In Bust
Fechando a noite, a In Bust Teatro com Bonecos apresenta “O conto que eu vim contar” a história se passa numa fazenda, no Marajó- Pará. Seu Bastião, um homem muito brabo, é o dono do lugar. Ele tem uma filha linda, Hosana, que sonha em ser mãe. Desde que a mãe de Hosana se foi, o Bastião nunca mais sorriu e tem medo de perder a filha. 

A história se passa em um lugar que é banhado por um rio cheio de segredos, guardado pela Mãe D’água, onde vivem muitas criaturas, inclusive.o Boto. O texto, de Adriana Cruz, é inspirado no texto Um Conto de Natal, que David Matos criou para o programa Catalendas, da TV Cultura do Pará.

O Casarão do Boneco é a sede do grupo In Bust – Teatro Com Bonecos a mais de 14 anos. De três anos para cá um coletivo de artistas, com o desejo de manter em funcionamento um espaço cultural que exerça a função social de difundir a arte na cidade de Belém, tem mantido uma programação anual. São eles: In Bust Teatro Com Bonecos, Produtores Criativos, Cia de Teatro Madalenas, Bando de atores independentes, Projeto Vertigem, Cia Sorteio de Contos. A Amostra Aí tem apoio da Cultura Rede de Comunicação e do blog Holofote Virtual.

Serviço
“Amostra Aí” de abril. Neste sábado, 29, a partir das 18h, no Casarão do Boneco – Av. 16 de Novembro 815 próximo a praça Amazonas. Os portões abrem às 18h. O ingresso é: Pague quanto puder.

24.4.17

"Ponte do Galo" em busca da reedição pelo Catarse

Esgotado em livrarias, talvez com sorte achado em algum sebo, o livro “Ponte do Galo”, do romancista Dalcídio Jurandir está prestes a ser reeditado pela Pará.grafo, uma editora bragantina, atenta para a relevância da obra e de seu autor. A campanha de financiamento coletivo pelo site Catarse ganhou fôlego e se espalha na imprensa e redes sociais. A arrecadação já chega a quase metade do valor total do recurso necessário. Já garanti o meu exemplar e, enquanto o aguardo, bati um papo com o professor e poeta Paulo Nunes, que assina o prefácio da nova edição.

“Ponte do Galo”, do romancista paraense Dalcídio Jurandir está há 46 anos sem nova edição. A editora Pará.grafo, de Bragança (PA), iniciou no dia 7 de abril uma campanha de financiamento coletivo no Catarse, que ficará no ar por 60 dias, com objetivo de arrecadar os recursos necessários. Nesse período, leitores e apreciadores da obra dalcidiana poderão apoiar financeiramente a iniciativa doando R$ 10,00 ou ainda adquirindo o e-book (R$ 15,00) ou o exemplar físico (R$ 45,00).

Acesse o site e veja como é fácil: www.catarse.me/ponte_do_galo.

Pela relevância e riqueza da sua literatura em retratar a amazônia, seu povo e sua cultura, é dito  que Dalcídio está para a sua região, como Graciliano Ramos, Jorge Amado e Érico Veríssimo estão para as suas.

"Ponte do Galo", o sétimo romance dos dez que formam o chamado Ciclo do Extremo-Norte, foi publicado em 1971 pela Editora Martins/MEC. A história, dividida em dois momentos, se passa em Cachoeira (Ilha do Marajó) e Belém, respectivamente, narra a história de Alfredo, menino marajoara que sonha em ir para a cidade grande continuar seus estudos.

Dalcídio Jurandir revela em seus livros, outro mundo, das pessoas comuns de uma vila no meio de uma ilha e introspecções e desejos. São emblemas humanos que circundam a narrativa. Ao explorar, em sua obra, a região e seus habitantes, dando ênfase ao ser humano, seus medos, angústias, sentimentos e sobrevivência, o autor vai além do simples retrato da Amazônia.

"Em 50 anos de literatura, ele escreveu dez romances amazônicos, e teve um livro de poemas publicados post mortem, o 'Poemas Impetuosos' (Belém, 2011), que organizei  para a editora Paka-Tatu em convênio com a Casa de Cultura Dalcídio Jurandir",  diz Paulo Nunes. O professor, poeta e pesquisador conversou com o Holofote Virtual, sobre a obra e importância de Dalcídio Jurandir para a literatura e cultura brasileira.


Capa da edição de 1971
Holofote Virtual: Como você apresentaria Dalcídio Jurandir às novas gerações que talvez ainda não o conheçam?

Paulo Nunes: Dalcídio Jurandir (Ponta de Pedras, 1909/ Rio de Janeiro, 1979) é um grande romancista, um brasileiro incomum, sempre preocupado em retratar o Brasil a partir de sua gente mais humilde (“a minha criaturada dos pés no chão”, como ele mesmo dizia), que habita as periferias do país, onde a Amazônia, palco dos dramas do ‘teatrum mundi’ dalcidiano, é também uma periferia incompreendida. 

Um romance é um primor da Negritude e da Amazonicidade, coisa que Dalcídio aprendeu a respeitar com seus pares da Academia do Peixe Frito, congregação informal liderada por Bruno de Menezes, que se reunia no Ver-O-Peso cerca de treze moços pobres e quase todos pretos. 

Nos idos dos anos 30 do século passado, com o intuito de renovar nossa cultura e nossas letras, Dalcidio começa a escrever a primeira versão do premiado Chove nos Campos de Cachoeira, provavelmente em 1929 e a publica em 1941, resultado de concurso literário instituído pelo jornal D. Casmurro e editora Vecchi. Seu último romance é Ribanceira, publicado em 1978, graças ao apadrinhamento de Jorge Amado, junto ao editor da Record.

É possível ler mais sobre o escritor na biografia – Dalcídio Jurandir, o romancista da Amazônia - organizada por Benedito Nunes, Ruy Pereira e Soraia Reolon, e publciado pela SECULT Pará, em convênio com a Casa de Rui Barbosa, do Rio de Janeiro.

Publicado em Moscou
Holofote Virtual: Qual a importância de “Ponte do Galo” dentro da vasta obra do autor?

Paulo Nunes: Ponte do Galo, que agora sairá pela editora Pará.grafo, é um dos volumes mais raros e menos lido do romancista marajoara que ganhou o Brasil, e teve 2 livros publicados também no exterior: Belém do Grão-Pará (Portugal, duas edições) e Linha do Parque (Moscou).

De estrutura narrativa mais inovadora que os demais romances, o livro divide-se em duas partes, a primeira, em Cachoeira, onde Alfredo, o protagonista, goza férias escolares, e a segunda: em Belém, onde a periferia da Belém, sobretudo o Telégrafo e arredores, ganha destaque. Em boa hora a Pará.grafo resolve tirar do baú o Ponte do Galo, uma pungente narrativa, que talvez seja a mais complexa do conjunto de romances dalcidianos. Além de mim, também participam do projeto de reedição, a artista plástica e ilustradora Paloma Franca Amorim e o fotógrafo marajoara Eliseu Pereira. 

Holofote Virtual: Como situar Dalcídio Jurandir no panorama romancista brasileiro?

Paulo Nunes: Dalcídio inicia-se como integrante tardio da segunda geração do romance modernista, onde militavam Graciliano e Raquel de Queirós, Zé Lins e Jorge Amado, recrutado ao romance do realismo socialista, ele escreve para desvelar as vozes do povo das periferias  que não recebiam destaque e protagonismo até então. 

A Acadamia do Peixe Frito ajudou a formar a sensibilidade deste grande romancista. Impossível falar do romance brasileiro sem citar Dalcidio, seria uma lacuna incompreensível de uma fala gritante. Se o romance ajuda a revelar um povo, não podemos desconsiderar autores como Dalcidio, Benedicto Monteiro, Marcio Souza e Milton Hatoum, por exemplo.

Holofote Virtual: Você acha que Dalcídio Jurandir já possui o devido reconhecimento dentro da cena literária do país?

Paulo Nunes: O reconhecimento está em curso, principalmente no Pará e em algumas capitais brasileiras, de modo muito discreto, menos intenso do que deveria. Falta a ele uma grande editora nacional que lhe dê o tratamento merecido. Se elas, as grandes editoras, não se interessam, as universitárias e a Marques fizeram edições necessárias. Agora vem a Pará.grafo mexer num romance pouco lido e um dos mais originais que é Ponte do Galo", comenta Paulo Nunes.

Espetáculo "Chão de Águas" volta à cena da cidade

O espetáculo Chão de Águas teve sua estreia no ano de 2015 com sucesso de público e crítica e retorna em sua segunda temporada nos dias 05 e 06 de maio no Teatro Experimental Waldemar Henrique às 20h.

Integrando música, poesia e teatro, Chão de Águas busca apresentar as várias facetas da Água, elemento essencialmente feminino, mostrando sua força e delicadeza em um mesmo nível. 

A trilha sonora representa grandes nomes da Música Popular Brasileira, desdobrando-se num ar de mistério e leveza, convidando cada espectador a navegar com melodias que vão-se desenhando a partir de luz, sombra, cor, emoção e força. 

O artista Maurício Franco desenvolveu o figurino, que numa fluidez quase que líquida dos tecidos, desenha a silhueta de cada personagem, revelando as ideias que se projetam em imagens. Assim vão-se construindo intenções em torno do estado líquido, tanto do espetáculo em si, quanto das ações das intérpretes. 

No elenco, Cristina Kahwage, Karimme Silva, Tarsila França e Cacau Novais - que também faz a direção geral. A banda é formada por André Gaby - piano e direção musical, Tom Salazar - violão e bandolim, e JP Cavalcante - percussão. A iluminação é de Marckson de Moraes e o mapping é elaborado por Leandro Macujah.

Serviço
Chão de Águas - espetáculo lítero-cênico-musical. Dias 05 e 06 de maio às 20h, no Teatro Experimental Waldemar Henrique.  Ingressos já disponíveis: R$20,00 à venda no www.sympla.com.br (meia entrada: R$10,00) .

Zimba Groove leva "Identidade Preta" ao Margarida

A banda apresentará repertório com influências afro-amazônicas, como samba de cacete, rap, ritmos latinos e samba. Haverá participação das crianças do grupo de capoeira da Terra Firme Sou Angoleiro, das cantoras do Afoxé Axé Dudu, do rapper Pelé do Manifesto, das atrizes negras – AmÉrika EstÉrika, Kassandra Bony e Katty Nunes, além dos alunos da Escola Brigadeiro Fontenelle. O espetáculo será apresentado no Teatro Margarida Schivasappa, nesta quarta-feira, 26, às 20h, por meio do edital Pauta Livre 2017.

Nascida nas ruas de Belém, a banda dedica-se a narrar a trajetória de reconhecer-se negro na Amazônia. A banda é composta por Jeff Moraes, voz, que tem em seu repertório sambas, afoxés, música regional e black music, e é ator, contador de histórias e estudante da Escola de Teatro e Dança da UFPA; Wendell Raiol, violonista, também professor de violão da Fundação Carlos Gomes e atuante em projetos sociais como a República de Emaús; Ney Trindade, baixo, publicitário com trajetória em bandas de reggae e na noite de Belém; João Paulo Pires, percurssão, professor de música reconhecido na cena local; e Edivaldo Filho, trompete.

“Nós somos artistas de rua. Quando eu começo a cantar e me encontro enquanto pessoa negra e militante, eu tenho esse encontro nas batucadas das ocupações que rolam artísticas da Praça da República, do Ver-o-Peso e de São Brás. Então é muito importante e simbólico ocupar o teatro Margarida Schivasappa, que abriga grandes shows, de grandes artistas da terra, a maioria brancos. Esse processo de levar pessoas pretas com música preta música da rua artistas da rua para esse espaço está sendo a realização de um sonho”, afirma Jeff Moraes.

Foto: Bruno Carechesti
A ideia do espetáculo é levar a música dos artistas de rua, de performance e resistência, para o que os integrantes da banda chama de ‘caixa preta’ – um espaço de apresentação fechado. Segundo o baixista Ney Trindade, o espetáculo busca retratar, especificamente, a realidade do negro nesse contexto urbano amazônico, de ocupação de beira do rio mas de grafite contexto amazônico que se vê em Belém.

“Nossas músicas já perpassam por várias questões nacionais, como empoderamento, genocídio da juventude negra, mesmo que seja nacional é também regional, porque a gente vivencia isso, então a maior importância de levar esse espetáculo é poder levar várias linguagens vistas da rua para dentro do teatro. É legitimar todo o movimento de resistência preta de rua só que agora numa caixa preta. A gente está muito feliz, empolgado e cuidando com muito carinho desse trabalho”, conclui Ney.

Zimba Groove é a tradução do próprio nome: Zimba significa brincadeira, roda; Groove se apresenta em todas as vertentes das influências sonoras negras apresentadas. A banda que se formou a partir de encontros nas ruas da cidade de Belém, se comporta como parte da comunidade que aqui habita, transitando e ocupando com arte e música os espaços abandonados, violentos e históricos da capital paraense.

Foto: Bruno Carechesti
Apesar da recente formação, o grupo surgiu no início de 2015, a trajetória artística da banda já conta com apresentações importantes como a abertura do show da banda conhecida nacionalmente "Liniker e os Caramelos" (Novembro/2016) e outros shows de âmbito regional como o Boulevarte 2016, Tatto Day Pará 2016 e XXII Auto do Círio. A banda também já conquistou espaço na mídia local e foi citada em artigos de cultura de blogs nacionais.

No final do ano de 2016, um web vídeo da música “Menino Preto” foi lançado e já tem mais de mil visualizações. Das músicas autorais, sete já foram apresentadas ao grande público.  Algumas já repetidas em coro pelo plateia, as músicas têm letras que falam sobre o empoderamento das mulheres negras, o momento atual do movimento negro no Brasil, dos batuques que ocupam e resistem a violência policial na capital paraense e faz duras críticas ao genocídio da juventude negra nas periferias de Belém.

Serviço
Banda Zimba Groove apresenta espetáculo “Identidade Preta” pela primeira vez no teatro Margarida Schivasappa no dia 26 de abril, às 20h. Ingresso: R$ 20,00. Locais de Venda: Ná Figueredo (Estação das Docas) e Art Ato Tatuaria (Av. José Malcher, 2666). Informações nos telefones (91) 98366-6494 e (91) 98321-2011.

23.4.17

Sonido realiza duas noites de música instrumental


O Mercado de Carne Municipal Francisco Bolonha, em Belém do Pará, ferveu nas noites de sexta e sábado, feriado prolongado de Tiradentes. Em pleno complexo do Ver-o-Peso, o Sonido, em sua 2a edição, reuniu grupos da música instrumental brasileira, bebidinhas e comidinhas num lugar que é também espaço de memória da cidade.

O projeto realizado pela Se Rasgum Produções vem ao encontro de um desejo de espaço para difusão e intercâmbio da música experimental e instrumental brasileira, na região norte, em suas diversas vertentes.

Na sexta-feira, 21, os tambores do Jardim Percussivo, projeto de Márcio Jardim, deram boas vindas, de forma visceral, ao público, que chegou no horário e, mesmo sob chuva, ou se esgueirando pelas laterais das estruturas de ferro do mercado de carne, permaneceu firme e atento até o fim.

Além do Jardim Percussivo, que reúne alunos de percussão, o professor Márcio Jardim (bateria), e ainda William Jardim (guitarrista) e Wesley Jardim (baixo), a sexta feira também reuniu no palco os trabalhos "E aí Negão", de Nego Jó (trombone e piano) e "Loxodonta", de Rafael Azevedo (contrabaixista). Tudo muito suingado, grande performance. Em seguido, vieram os shows do "Aeromoças e Tenistas Russas" (SP), com um som eletrônico experimental, e Esdras Nogueira, saxofonista de Brasília (DF), ex-Móveis Coloniais.

Último dia apresentou trabalhos de pesquisa e experimentos

Chega o sábado, 22. Mais chuva em Belém do Pará. Mais uma vez, o público chegou na hora e não arredou o pé. Paraense não é tapioca, costumamos dizer. Por conta do temporal, um pequeno atraso na passagem de som fez com que a primeira atração entrasse uma hora depois do previsto. Algum problema isso? Nenhum. 

O show de Albery Project foi vibrante na abertura da última noite do Sonido. O show do  grupo "Astronauta Marinho"(CE), veio em seguida e antes de Lucas Estrela, que eletrizou a moçada com sua tecnoguitarrada. 

A noite não acabou aí, só após os excelentes momentos da "Quartabê", banda paulista ligada diretamente ao projeto Claras e Crocodilos,  releitura do Arrigo Barnabé de sua obra-prima de 1980. Ana Karina Sebastião (baixo), Joana Queiroz (sax, clarinete e clarone), Maria Beraldo Bastos (clarinete e clarone) e Mariá Portugal (bateria), na Quartabê, ao invés de tocarem com Barnabé, se apresentam com o tecladista Chicão, formando assim um paredão sonoro experimental vibrante. O repertório do show trouxe músicas do maestro Moacir Santos, executado com novas leituras.

Albery Albuquerque emociona e surpreende público

A apresentação do violonista, compositor e pesquisador,  foi enérgica, com plateia plural como é seu trabalho. Albery Albuquerque agradeceu a presença de todos. "Como é bom estar aqui com o meu povo. Eu amo vocês", disse.

O repertório de 40 minutos, tempo que cada banda tinha de programação, trouxe "Canto da Semente", "Uirapuruzinho", "Encandeado", "Tucano", "Ritmo de Floresta" e "Trancelim de Tucano", músicas compostas a partir da pesquisa desenvolvida pelo violonista, já há 30 anos, baseada na vocalização de pássaros e outros animais da natureza.

Onça, Tucano, Uirapuru. Estavam todos lá, neste sábado de encerramento do Sonido. Na plateia, pessoas que já acompanham a trajetória do músico, e muita gente, talvez a maioria, de gerações mais novas, principalmente, que pode até conhecer um pouco da história do Albery, mas certamente ainda não conhecia ou tinha ouvido, ao vivo, a sua Música Transmórfica. Todos vibraram, muito!

Emoção no palco. Além de Albery e seus dedos ligeiros percorrendo o braço do violão, Tom Salazar Cano (guitarra), Thiago Albuquerque (teclado e samples), Príamo Brandão (baixo) e Carlos Canhão Brito (bateria) tocaram inspiradíssimos. Para completar, uma bela performance no palco, que entusiasmou a todos. 

O Albery Project promete nova apresentação no segundo semestre e novidades para o público, muito em breve. O grupo está gravando o Cd Música Plural, com lançamento de um EP, nas plataformas virtuais, ainda este ano.

20.4.17

Romance traz história sobre clausura e memória

“O Passado é Lugar Estrangeiro”, da jornalista Suelen Carvalho, traz uma trama engenhosa e absorvente que envolve um convento de clausura no Pará. Diana, a protagonista, é castigada pela descoberta de um segredo perturbador no computador do marido e de um passado que acredita poder formatar. O lançamento em Belém é nesta quinta-feira, 20 de abril, às 19h, na Casa do Fauno.

Lançado em janeiro em São Paulo pela Editora Patuá, o romance reflete sobre passado, luto, as chances de esquecimento e as possibilidades de se apagar registros da própria história ou escolher outro passado para ter vivido.

“O livro é sobre um segredo, sobre para onde vão as palavras que não conseguimos pronunciar ou comunicar nem para nós mesmos. É um percurso de uma personagem para o descolamento de seu próprio passado, a tentativa de se separar de um passado. E se uma mulher devastada por um segredo que não consegue revelar quisesse apagar o tal segredo da sua vida, o que ela faria? A narrativa oferece uma resposta para isso”, diz a autora, em entrevista ao blog. 

Nascida em Castanhal, no Pará, em 1982, Suelen me diz que se mudou para Belém em 2000, quando entrou para o curso de comunicação da UFPA, e morou na cidade, até 2013, quando partiu para São Paulo. “Mas viajo sempre que possível, umas duas vezes ao ano. Tenho sobrinhos pequenos e sinto saudades”, diz a jornalista e roteirista que na semana passada, lançou o livro em sua cidade natal, onde ainda moram seus pais.

Ela se diz uma paraense clichê, que gosta da gastronomia, é devota de Nossa Senhora de Nazaré, e traz aquele sotaque chiado característico e que despacha isopor pesado no aeroporto. “Belém é um amor idealizado, daqueles que a gente quer de qualquer jeito, que faz a gente agir irracionalmente e acreditar que é feliz”, finaliza.

O livro tem apresentação de Élida Lima e prefácio de Karina Jucá. O título “O Passado é Lugar Estrngeiro” faz referência à epígrafe do escritor inglês L.P. Hartley, que indica a recusa do presente e das cores, que causam à personagem dor como em uma enxaqueca perene e que é também a tentativa de se proteger do passado impondo fronteiras instransponíveis. É o que vai levar Diana à obsessão pelo convento de clausura. 

Suelen já publicou contos em revistas literárias, antologias e um e-book infanto-juvenil. O gosto pela leitura vem desde muito pequena e que o passo dado para começar a criar histórias foi curto. 

“Eu achava que livros eram as redações que a gente escrevia na escola, mas longuíssimas. Eu enchia meus cadernos. Com o tempo, o ensino médio e as questões de vestibular, as leituras permaneceram, mas a escrita inventiva ficou de lado. Deu lugar ao jornalismo. Nos últimos sete anos, a necessidade de criar histórias ressurgiu e eu corri para atendê-la”, diz.

“O Passado é Lugar Estrangeiro” foi escrito em quatro anos. Para chegar a sua forma final, passou por várias reescritas e muitos cortes. A ideia principal partiu de um conto escrito anteriormente e que lhe pareceu pedir mais. Foi aí que ela voltou criar narrativas mais longas. “No final do processo, já em São Paulo, fiz algumas oficinas de escrita criativa que me deram um olhar mais crítico e desapegado sobre o meu próprio texto. Esse distanciamento ajuda muito na decisão de por ou não um ponto final nos originais”.

Pergunto a ela quais suas referências na literatura brasileira e, em específico, na literatura paraense. Ela me dá uma lista enorme. “Gosto muito dos livros do Edyr Augusto, que narra histórias que jogam vísceras na nossa cara. Há aquilo que só a ficção consegue mostrar e essa é a razão de existir da ficção, da literatura. Nos último anos, redescobri Max Martins pelo olhar de Élida Lima, escritora paraense que admiro, com o seu Cartas ao Max.

Li o último livro do Caco Ishak, que recomendo. Benedito Nunes, com seus livros sobre o drama da linguagem e o tempo na narrativa me tiram do lugar e isso é bom para a escrita. Isso para falar de alguns paraenses. Hoje, tenho acompanhado bastante escritores contemporâneos, sobretudo latino americanos. 

O cubano Leonardo Padura e a argentina Selva Almada foram leituras relativamente recentes que me assaltaram. Tem muitos outros. A Elvira Vigna, para mim, é o que há de maior na literatura brasileira atualmente. É fundamental. Há outras escritoras que admiro e que leio com sede, Virgínia Woolf, Clarisse Lispector, Lygia Fagundes Telles, Alice Munro, Margaret Atwood. Guardo o desejo de que me influenciem”. 

Suelen Carvalho está há cinco anos radicada em São Paulo, trabalhando em projetos de conteúdo para internet e em audiovisual, como freelancer para produtoras. “Hoje, estou trabalhando como roteirista numa série documental sobre corpo e movimento para a TV Sesc, pela Init Arte Visual. Paralelamente, trabalho na "transposição" para roteiro de longa metragem de um livro infanto-juvenil que escrevi, mas ainda não foi publicado”, revela. “O passado é lugar estrangeiro é meu primeiro romance. A minha expectativa é continuar escrevendo ficção”. 

A escritora diz que já tem um projeto de novo romance, que está bem no início, ainda com título provisório. “Comecei a trabalhar nele. Atualmente, também quero finalizar um infanto-juvenil que está quase pronto, eu diria, para buscar publicação”, finaliza. 

Serviço
Lançamento O Passado É Lugar Estrangeiro, Editora Patuá, de Suelen Carvalho. Nesta quinta-feira, 20, às 19h, na  Casa do Fauno. Rua Aristides Lobo, 1061, entre Benjaimn e Rui Barbosa. Preço: R$ 38,00. Informações : 91 98705.0609.

12.4.17

Frei Betto lança e debate em Belém sua biografia

O lançamento da biografia na segunda-feira, 10 de abril, na OAB, contou com a presença de Frei Betto e dos autores Américo Freire e Evanize Sydown. A iniciativa, de Milton Kanashiro, teve apoio da OAB, que cedeu o espaço, da Toró Gastronomia que serviu um delicioso coquetel, do Movimento Ocupa República e do Holofote Virtual que com muita honra apoiou na divulgação do evento junto à imprensa.  

Após o debate, a cantora e compositora Iva Rothe e o músico Maurício Panzera fizeram a trilha sonora para os autógrafos (apoio M.M. Produções) e o artista visual Armando Sobral presenteou Frei Betto com uma tela de sua autoria.

Frei Betto agradeceu a acolhida e com humor e tranquilidade falou à plateia atenta, sobre a experiência de ser biografado. “Comentam comigo sobre estar vivo e já ter biografia. E digo que é melhor ter biografia que obituário”, brincou.  “E é curioso a gente ser biografado, porque é um espelho que de um lado reflete a trajetória de vida da gente, mas ao mesmo tempo surpreende”, disse. “Muitas coisas vão se apagando da memória, mas pessoas têm essas referências e é enriquecedor. A gente lê sobre a própria vida e recebe essas informações como novidades”, disse Frei Betto.

Foi uma noite de aula histórica. Frei Betto contou várias passagens de sua vida e algumas bem peculiares, como estar em Belém no dia em que o golpe de 64 foi deflagrado. Na plateia, pessoas interessadas em buscar uma saída para atual situação do país. Contundente, Frei Betto disse que não há outra senão o movimento popular.

"Só acredito em mudança que vem de baixo pra cima. E perceber qual o sentido da minha existência. Vou reforçar que lado?", indagou. Foram algumas horas em que respiramos profundo e renovamos a esperança. Para cada um ali presente, foi uma experiência libertadora e que agora minimamente compartilho com vocês.

Trajetória viva e de grandes novidades

Para elaboração do livro 200 pessoas foram entrevistadas, além do biografado. Arquivos preciosos com informações das atividades Dominicanas, ordem religiosa de Frei Betto, foram acessados. Os autores viajaram por vários lugares do Brasil e foram a dois países onde Frei Betto tinha trabalho intenso, Nicarágua e Cuba. 

“Eu mesmo me surpreendo quando leio o livro porque tem informações que já não estavam presentes na minha memória. Eu já não me lembrava, por exemplo, que o Januário (Guedes, cineasta paraense) estava comigo na noite em que fui preso pela primeira vez, em 1964, no Rio de Janeiro”, comentou Frei Betto. 

Januário, na plateia também comentou. “Hoje eu vim aqui vê-lo, 52 anos depois daquela fatídica noite. Éramos companheiros da época do JEC - Juventude Estudantil Católica e JUC – Juventude Universitária Católica”, disse Januário, emocionado.

O livro ajuda a precisar também, aspectos dos anos de prisão de Frei Betto, que também ficou preso entre 1969 e 1971, de quando morou numa favela no estado do Espírito Santo, por cinco anos, e aborda seu trabalho no ABC paulista, na Pastoral Operária. 

“É de onde vem minha ligação ao Lula e a criação do PT e a CUT, embora eu nunca tenha entrado em nenhum partido político. E ainda o meu trabalho nos países socialistas, em Cuba, principalmente e, por fim, o trabalho no Planalto Central como assessor do Lula no programa Fome Zero.

Fome Zero era programa emancipador

Frei Betto comentou, na noite de segunda-feira, entre outras coisas, sobre como o programa Fome Zero, que era uma iniciativa emancipatória, foi extinto, dando início ao programa Bolsa Família, que é bom, mas que não emancipa.

"No Fome Zero, em três ou quatro anos, a família cadastrada já não dependeria do Governo Federal. Ao contrário, no Bolsa Família, quem sai, volta à miséria", ressaltou Frei Betto.

O controle do cadastro para o Fome Zero estava nas mãos de comitês gestores independentes, onde vinham despontando lideranças políticas, dentro do movimento social, o que, obviamente, desagradou políticos corruptos, interessados em deter o poder do cadastro e escolhas para participação no Fome Zero, usando isso, claro, à favor de suas condutas má intencionadas, ou seja, utilizar o Fome Zero como barganha política em períodos eleitorais. Assim, prefeitos de vários municípios brasileiros se uniram, foram ao Planalto, pressionaram  Lula, que cedeu à pressão eo Fome Zero, acabou! E assim, Frei Betto deixou a assessoria do então presidente.

10 anos e o suicídio de Getúlio Vargas

Carlos Alberto Libanio Christo, o Frei Betto nasceu no dia 25 de agosto em Belo Horizonte, no ano de 1944. É filho do jornalista Antônio Carlos Vieira Christo e da escritora e culinarista Maria Stella Libanio Christo. A data de aniversário de seus dez anos foi marcada por um fato surpreendente, o suicídio de Getúlio Vargas.

Frei Betto estava em Belém, no dia 1º de abril de 1964, quando foi deflagrado o Golpe Militar contra o governo legalmente constituído de João Goulart. E diz que este fato ele não tem como esquecer.

“Esse episódio é marcante, eu não esqueci porque era marcante na vida de todos nos brasileiros, mesmo dos que nasceram depois. E foi no dia 1º de abril. Não no dia 31 de março, como os militares tentam retroagir com vergonha do Dia da Mentira, mas foi 1º de abril, eu estava em Belém no congresso Latino Americano de Estudantes. Na época eu era Dirigente da Ação Católica”.

No dia seguinte tentou embarcar para o Rio de Janeiro, mas quase não conseguiu, pois sua passagem havia sido emitida pelo governo de João Goulart e, pela nova ordem, todas as passagens que tivessem sido adquiridas pelo governo derrubado, estavam suspensas. Os milagres, aqueles pequenos milagres, porém, acontecem e Frei Betto conseguiu embarcar Rio, mas teve que descer em Recife, onde acabou indo à posse do Arcebispo D. Helder Câmara que estava assumindo o arcebispado da capital pernambucana.

A cultura do ódio e os despolitizados

O bate papo com a plateia suscitou discussões sobre a cultura do ódio que vem sendo nutrida há um longo tempo, alimentando o comportamento de uma massa despolitizada e, consequentemente, manipulada pela mídia.

“A questão do ódio é algo muito bem bolado pelo capitalismo, faz parte da cultura neoliberal, quanto mais você desracionaliza a política, mais as pessoas perdem visão histórica e estratégica, e isso dá margem pra emoção. E ai tá tranquilo, pois a discussão emocional pode levar horas e ninguém conclui nada. O sistema tem colaborado pra isso”, disse Frei Betto. 

“Estamos respirando uma cultura nociva, desconstruindo o humano em função do império do capital. Mas vamos guardar o pessimismo para dias melhores, nós precisamos é construir um novo Brasil. Recolher os cacos que estão aí, não ficar de cabeça baixa, saber que as contradições vão se aguçar, mas também precisamos ter propostas. Tudo pode mudar a qualquer momento. Pode começar uma guerra entre os Estados Unidos e a Rússia por causa da Síria", disse.

Ele também reforçou algo em que acredito plenamente. "São despolitizadas as pessoas que só tem percepção da vida como fator biológico: eu nasci, estudo para ter profissão, me caso, tenho filho e trabalho pra manter a família. São politizadas as pessoas que têm uma visão da vida como biográfica, que percebem que a vida tem sentido histórico, como pessoa, classe social, nação, povo e como momento histórico. Quando entendemos isso, não há sistema que possa nos cooptar, porque a gente percebe o que dá valor a vida é o sentido que imprimimos nessa trajetória", continuou. "Não tem jeito, o caminho é o movimento popular. Precisamos construir um novo Brasil", concluiu.

Quatro anos e mais um golpe

Um livro corajoso, elaborado com cuidadosa pesquisa, que resulta num trabalho necessário, a biografia de Frei Betto levou quatro anos para ser escrita e lançada.  Américo Freire e Evanize Sydown trazem à tona a trajetória de Frei Betto, em 435 páginas, 24 delas, com fotografias. Ao todo, 24 capítulos, páginas de agradecimentos, notas, bibliografia consultada, e um índice onomástico, sem falar no prefácio de Fidel Castro.

“Não queríamos um livro de caráter nem pontificado e nem heroico. Queríamos que fosse um livro que pudesse intervir no debate contemporâneo. Nada de chapa branca, elogioso, superficial. A ideia era fazer uma pesquisa séria e múltipla, abarcando as diversas atividades e aspectos da vida e da obra do Betto. Transitamos por sua obra, ou alguns dos livros dele, que em boa parte estão resenhados e analisados”, disse Américo.

O livro começou a ser escrito em 2012, lembrou Evanize Sydown. “Era um momento mais otimista do que vivemos hoje. Estamos entregando o livro num tempo de pessimismo. Qual a potência do livro neste momento que estamos vivendo. Ele traz um pouco o perfil de um personagem que tem uma trajetória muito coerente”, comentou Evanize.

E é neste contexto tão difícil que o livro tem sido lançado pelo país.

“Estávamos escrevendo em meio à crise, e isso certamente nos inspirou, então esse livro é a resposta do que estamos vivendo. A biografia expressa determinados valores que são caros e precisam ser disseminados e registrados. Serve para combater este conservadorismo radical que nos assola. Estamos vivendo tempos de cólera", disse Américo.

“Há várias histórias a serem contadas a partir da biografia do Frei Betto, pessoa múltipla, que está em redes e núcleos tão diferentes, mas cabendo tudo num livro só”, concluiu Evanize. "Esta biografia não é definitiva, não acredito nisso, ainda mais sendo uma biografia do Frei Betto, que é uma pessoa que tem muitas vidas”, concluiu Américo.