21.9.20

Amazônia Doc anuncia vencedores esta semana

A mostra “Primeiro Olhar” exibiu 11 curtas, abrindo um espaço especial para a produção audiovisual de jovens estudantes da rede pública de ensino. Já o 1º Festival As Amazonas reuniu 21 filmes dirigidos e roteirizados por mulheres. Enquanto isso, o Amazônia Doc, que recebeu cerca de 300 inscrições, este ano, exibiu 33 títulos. 12 dias de programação, três mostras competitivas. Os vencedores do 6o Amazônia Doc 3 em 1 serão conhecidos nesta quarta-feira, 23, em  evento on-line, que será transmitido, a partir das 19h, pelo canal do Youtube do Amazônia Doc, com retransmissão pela conta do Facebook da Equatorial Energia. 

Estes mais de 30 filmes exibidos na mostra principal trouxeram, entre curtas, longas e médias metragens conversaram sobre as diversas realidades que cabem no Brasil e em países como Colômbia, Peru e Guiana Francesa.  No curta metragem “Mãe Céu”, o diretor peruano Alberto Flores Vílca, por exemplo, passa a documentar as águas da estação pela janela da casa de sua mãe, Honorata Vílca, uma analfabeta de descendência quíchua que vive no altiplano peruano. E ali, entende o que deveria fazer.

“Sempre quis fazer um filme sobre minha mãe, mas não encontrava a forma nem o momento. Um dia, a captei embaixo da chuva, aí encontrei o que procurava. Apesar do governo peruano ostentar números que indicam melhorias, vemos realidades como a da minha mãe, que não frequentou escola e vive da venda de doces. Na verdade, os problemas de 50 anos atrás seguem vigentes e imóveis como pedras”, nos conta o diretor, que este ano foi selecionado para a “Berlinale Talents”, no 70º Festival Internacional de Berlim, na Alemanha.

Já no longa-metragem “Amoka”, da cineasta María José Bermudez Jurado, somos conduzidos à Peña Roja, uma comunidade tradicional no interior da Colômbia que vive os conflitos do minério.  Quem nos leva até lá é o jovem Elvis Matapi, protagonista do documentário. Um retorno às origens após anos vivendo em Bogotá, capital do país.

“Elvis vai à Peña Roja para participar de um ritual de morte do seu pai, Daniel Matapi, que era uma importante liderança indígena. Através do retorno dele,  ‘Amoka’ propõe a reflexão sobre as perdas culturais e os problemas socioeconômicos pelos quais estes povos passam”, diz a diretora. “É profundamente importante conservar o conhecimento tradicional, mesmo que seja inevitável sua transformação. O cinema tem esse papel, de documentar e transmitir essas memórias”, completa.

Os filmes brasileiros Amazônia Sociedade Anônima (RJ) e Xadalu e o Jaguarete (SC), como também o colombiano Nasa Yuwe, entre outros, também trazem ao festival memórias e processos de luta de povos tradicionais que habitam este poderoso bioma.

Pan Amazônia e ancestralidade

Outras nuances dos países que integram a Pan-amazônia também emergem na mostra principal. Como é o caso da força da ancestralidade nos processos de formação das identidades. Um exemplo é o curta “Filhas de Lavadeiras” (DF), de Edileuza Penha de Souza.

“Meu filme reverência e dialoga com o livro ‘As Filhas de Lavadeiras’, de Maria Helena Vargas. É uma homenagem a ela, que tem uma história como a minha e de minha mãe Laura, também lavadeira, e de outras tantas mulheres que conseguiram romper com essa ‘predestinação’ que insiste em nos colocar em um lugar de subserviência. E foram nossas mães que lutaram para mudar nossos destinos”, nos conta Edileuza, que também é a organizadora da coleção de livros “Negritude, cinema e educação” (2003). 

Na mostra,  “Ruído Branco” (SP) e “A morte branca do Feiticeiro Negro” (SC), também tecem nuances da história e resistência afro-brasileira. Lá do pequeno distrito baiano Arraial D’Ajuda, mais exatamente da Aldeia Velha, vem a história de Jaçanã, pajé e parteira de sua comunidade. O curta, intitulado com o nome da protagonista, foi dirigido por um grupo de três mulheres, uma delas é a fotógrafa paraense Yasmin Alves. 

“Jaçanã é uma força na Aldeia Velha, uma comunidade que foi devastada por vários processos de colonização, mas vem ganhando fôlego por meio da união e da escola local, que faz um trabalho incrível de diálogo entre conhecimentos ancestrais e o mundo. 

Entre ervas, rezos e conselhos, esta entidade em forma de mulher é uma das cuidadoras desse saber tradicional e vale muito a pena conhecer esta história”, conta Yasmin, que atualmente empreende o estúdio fotográfico “Casa Tajá”, em Belém. Também costuram poesia e história por meio de narrativas de resistências, os filmes “O mestre da farinha” (MG) e “Hmong de Javouhey” (Guiana Francesa). 

Cinema para transformar

Assim como todas as expressões artísticas, o cinema é um termômetro que mede inquietações, anseios e comportamentos sociais vigentes. Na mostra principal do Amazônia Doc, vários filmes trazem perspectivas pessoais que passeiam por temas atuais com sensibilidade. 

“Preciso dizer que te amo”, curta-metragem do diretor Ariel Nobre, parte da performance e deságua numa produção cinematográfica pessoal e repleta de poesia, mas que acusa um grande problema social: a alta incidência de suicídios entre pessoas transgêneros.

“Quando me assumi homem, em 2014, minha vida deu uma reviravolta e me deparei com a realidade que pessoas  trans enfrentam: a violência diária, a falta de perspectiva na vida pessoal e profissional. É tudo tão desanimador que num momento de desespero absoluto decidi pelo pior, mas esta frase, ‘preciso dizer que te amo’,  me salvou”, conta Ariel. 

A frase, escrita pela primeira vez em uma carta que seria de despedida para uma amiga, virou uma intervenção poética, um culto a vida, sendo reproduzida na pele de pessoas e em muros. “Já escrevi esta frase mais de dez mil vezes. A potência foi tanta que virou uma campanha contra o suicídio de pessoas trans. O filme é mais um desdobramento performático deste trabalho. Precisamos, na verdade, dizer a nós mesmos o quanto nos amamos”, reflete. 

“Um passo importante para nossa afirmação é deixarmos de ser vistos como um ‘tema’. Somos pessoas, e totalmente capazes de contar nossa própria história”, conclui. O longa “Transamazônia” (PA) e os curtas “Maria Luiza” (DF) e “Homens Invisíveis” (RJ) também são protagonizados por pessoas trans.

Pontos de partida

De modo geral, no Amazônia Doc podemos ver produções que trazem diversos pontos de partida. Com uma perspectiva mais política, a mostra exibe “Copacabana Madureira”(RJ), “A praga do cinema brasileiro” (DF) e, entre outros, a produção paraense “Jaburu”, de Chico Carneiro, que discorre sobre as dificuldades que professores enfrentam para exercer o ofício em uma comunidade ribeirinha do Estado. 

Já os filmes “Ary y yo” (PA) e “À beira do planeta mainha soprou a gente” (BA) partem de um olhar mais pessoal e biográfico. Ou seja, é cinema para todos os gostos.

O 6º Amazônia Doc este ano traz mais dois festivais, o 1º As Amazonas do Cinema e o 1º Curta Escolas. A realização é do Instituto Culta da Amazônia, com a Correalização do Instituto Márcio Tuma; patrocínio da Equatorial Energia, por meio da Lei Semear de Incentivo à Cultura - Fundação Cultural do Pará - Governo do Pará. A produção é da ZFilmes; com apoio do Sebrae-PA; Rede Cultura de Comunicação; Ufpa - Curso de Cinema e Estrela do Norte - Elo Company.

Serviço

Os filmes das mostra competitivas do 6º Amazônia Doc foram exibidos gratuitamente, no site www.amazoniaflix.com.br. Acesse, cadastre-se e veja os conteúdos oferecidos pela plataforma.

(Holofote Virtual, com texto de Luiza Soares e edição de Luciana Medeiros)

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