O delírio genial de um padre italiano em terras marajoaras está no documentário de Paulo Miranda. O filme traz à tona a memória do processo de construção do Museu do Marajó e do trabalho realizado pelo Padre Giovanni Gallo na região. A exibição ocorre nesta terça-feira, 05 de julho, no Ponto de Exibição ABDeC-Pa Cineclube Pedro Veriano, na Casa da Linguagem, a partir das 18h30, com entrada franca. A programação contará com o making of e um bate papo com a equipe. Abaixo o diretor conta como foi que chegou a temática central do documentário.
O lançamento de “O Ajuntador de Cacos” (Documentário/56 min/ Marajó/2010)
foi, no mínimo, emocionante, no dia 14 de junho, no auditório do Instituto de Artes do Pará. Na plateia, pessoas vindas do Marajó especialmente para a exibição, além de um público formado também por professores e pesquisadores que lutam pela preservação das riquezas culturais, naturais e arqueológicas do arquipélago.
A maioria acompanhou de perto e admiram até hoje o trabalho desenvolvido pelo Padre Giovanni Gallo na região e, principalmente, no que diz respeito a inovação com que ele pioneiramente desenvolveu no Museu do Marajó, um espaço onde a interatividade é que leva os visitantes a entenderem melhor o que é o Marajó e seus personagens protagonistas. A exibição de hoje será mais uma oportunidade para conhecer a fabulosa história de Giovanni, o homem que como ele mesmo disse, implodiu! (nome de seu livro biográfico).
Padre Giovanni foi museólogo, ex-padre jesuíta e atuou por mais de trinta anos junto à população mais pobre do Marajó, desenvolvendo ações no campo da promoção humana, preservação da memória histórica, arqueologia e organização das comunidades em Santa Cruz e Cachoeira do Arari.
Focar todo o trabalho de Giovanni Gallo e junto a isso a sua trajetória seria algo pretensioso e que jamais caberia em um filme de 56 minutos. “Como é que iríamos contar em menos de uma hora, como ele foi expulso de Santa Cruz, onde morava antes de se mudar para Cachoeira do Arari, ou como que ele se ordenou padre, depois foi ameaçado de morte, como a própria igreja o perseguiu e o abandonou, como entrou no seminário e acabou deixando de ser padre, ainda querendo ser, ele foi expulso da ordem”, argumenta Paulo Miranda.
Por isso, de acordo com Paulo Miranda, a opção foi centralizar o Museu do Marajó, obra que ficou como memória de toda a intervenção que sua existência trouxe ao Marajó. O amor dos marajoaras por ele, está registrado no documentário, assim como a paixão dele por toda a gente do Marajó. Arrepia! Em imagens raríssimas, há momentos em que vemos o padre arrumando o Museu, trabalhando com as pessoas do local em prol de um projeto coletivo e definitivo para o Marajó.
“Quisemos reunir um material que preservasse a memória do processo de construção do museu do Marajó e memória do trabalho e da intervenção do Giovanni no Marajó. Para isso fomos pesquisando e ouvindo muitas pessoas. Tivemos aí, a assessoria importantíssima do professor Lino, Cachoeirense, que trabalhou com Gallo por muitos anos no Museu do Marajó. Ele fez a pesquisa e o trabalho de campo e conseguiu mobilizar as pessoas para irmos entrevistar”, explica Miranda.
O cineasta conta que chegou no Marajó em 2002 com um outro projeto, que falaria sobre os Caruanas, mas no meio do caminho tinha um padre. Giovanni conversou com a equipe e disse que para falar do Marajó, era preciso antes conhecê-lo como um todo e os convidou a adentrar no Museu do Marajó.
“Passamos um dia inteiro lá e ele a nos mostrar cada detalhe. Para mim foi uma espécie de faculdade sobre o Marajó, quando saímos de lá já era noite. Aprendemos, não só sobre a sua arqueologia perdida em cacos de cerâmica, mas sobre todo o seu universo, desde o linguajar e o jeito do Caboclo Marajoara se relacionar com a vida, até como ele descobre que está doente, como se trata, a relação dele com os animais, como dá nome para seus barcos, canoas. Tivemos o privilégio de estudar isso com o melhor professor que poderia haver”, lembra Miranda.
O documentário utiliza também vários trechos do livro “O Homem que Implodiu”, a biografia de Padre Giovanni onde ele narra como soube da existência do Marajó, como veio para o Brasil e todas as injustiças que passou na vida.
“O Giovanni se dizia um brasileiro Marajoara. Sabemos que ele vem de Turim, na Itália, mas há um texto lindo dele dizendo que não sabia como, mas ele sabia que tinha que vir pro Marajó, desde a primeira vez que ouviu falar no Marajó sentiu isso. O texto é usado no off de abertura do documentário, retirado do livro O Homem que Implodiu. Todos os textos em off são dele, retirados deste livro. Achamos que era uma forma dele próprio narrar o filme”, conta o diretor.
Uma das coisas que chama atenção de todos que vêem o filme está na cor que tonifica a exuberância do Marajó, chamando atenção das pessoas e dando-lhes aquela vontade de conhecer a região. Mas Paulo Miranda faz uma observação interessante. “Giovanni não via as cores, era daltônico, o Marajó para ele, só existia em preto e branco, logo não foram as cores que o fizeram se apaixonar pela região”, comenta.
A idéia daqui em diante é levar o filme a mais escolas, universidades e deixá-lo correr o mundo a fim de se discutir o Marajó, hoje, uma região com problemas sociais e outras mazelas, como tantos outros municípios do Pará.
O DVD teve uma pequena tiragem, de mil cópias, que está sob administração da Instituição do Museu do Marajó para vender, tendo como retorno o que for arrecadado. Realizado com incentivo do Ministério da Cultura através da Lei Rouanet, o projeto contou com o patrocínio da Eletrobrás e apoio do Museu do Marajó.
Para a produção do documentário a Lux Amazônia Filmes realizou quatro expedições ao Marajó, para o registro de paisagens, ambientes e os personagens principais do que o próprio Giovanni Gallo definiu como “a fase mais marcante de sua vida”.
Ficha técnica
Direção: Paulo Miranda/ Roteiro: Paulo e Rutinéa Miranda/ Pesquisa: Lino Ramos/ Direção de fotografia: Sandro Miranda/Direção de Produção: Álvaro Andrade/Produção Executiva: Rutinéa Miranda / Produção: Lux Amazônia Filmes.
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