1.9.15

Um bate papo híbrido com as meninas do “Trunfo”

Fotos: Débora Flor
Levando o público a arriscar-se no jogo do Tarô e no universo do circo, Marina Trindade, Inaê Nascimento e Katherine Valente apresentam “Trunfo", espetáculo contemplado pelo Prêmio Funarte Caixa Carequinha de Estímulo ao Circo 2013, em cartaz quinta, 3, e sexta, 4, às 20h, na Praça da República.


Norteadas por técnicas circenses, experimentações e pela criação colaborativa, as três jovens atrizes nos conduzem de forma lúdica e divertida ao universo híbrido do circo com o teatro, trazendo exercícios da dança e artes visuais, e evidenciando suas pesquisas em busca de uma poética focada na transversalidade das linguagens artísticas.  Elas integram o Projeto Vertigem, grupo que chega ao seu terceiro espetáculo.

Inaê Nascimento se formou em Oceanografia, atua na área, e tem Mestrado em Ecologia de Ecossistemas Costeiros e Estuarinos pela UFPA, mas depois de alguns contatos com teatro e dança, na infância, em 2009, participou de oficinas de técnicas circenses, aprendendo acrobacias aéreas com tecido.

Marina Trindade, integrante e coautora do Projeto Vertigem, é graduada em Licenciatura plena em Dança pela UFPA, já tendo participado de vários seminários de pesquisa em artes.

Já Katherine Valente escolheu ser atriz. Cursa o técnico em ator e trabalha no aperfeiçoamento de técnicas como maquiadora, palhaça e circense. Em 2012, iniciou sua carreira no GTU (Grupo de Teatro Universitário). Participou do grupo “Perifeéricos”, de teatro de rua, e realiza outras atividades como performances e oficinas.

O grupo Vertigem estreou em 2012 com "Te vira! Tu não és de circo?", também contemplado com o Prêmio Funarte/Petrobrás Carequinha de Estímulo ao Circo 2011 e integrou em 2012 e 2013, a organização do 1º e 2º Seminário de Pesquisa em Artes Circenses. E vem se afirmando. Em 2013, trouxe à tona o espetáculo “mARESia”, contemplado com bolsa do Instituto de Artes do Pará e agora já se prepara para novos projetos. Após esta estreia em Belém, a ideia é circular com “Trunfo” em outras paisagens.

Holofote Virtual: É muito legal essa proposta da mistura de linguagens que vocês trabalham nos espetáculos do Vertigem. Como é que essse projeto nasce?

Inaê Nascimento: O Projeto Vertigem nasceu da intenção de transformar o que a gente sabia fazer a partir das oficinas de circo com o Charles, numa poesia. Eu não me sentia a vontade em fazer apresentações em eventos. Acho que a Marina também não. A gente queria algo que fosse pra além da técnica pura, atravessar linguagens.

E através dos projetos que fomos desenvolvendo fomos tentando por isso em prática, nos alimentando através de oficinas e pesquisas, compartilhando e agregando com artistas de outras áreas. O foco principal do Projeto Vertigem é esse hibridismo, esse atravessamento do circo nas outras artes e vice-versa. Acho que ainda não chegamos lá, mas estamos caminhando.

E é uma tendência atual, eu sinto, de quebrar com nomenclaturas, classificações, uma vontade geral de transpor limites e expandir possibilidades. Percebo essa tendência em muitas coisas que ando consumindo de artes e ciências. O Trunfo surge disso, exatamente.

Holofote Virtual: Qual o maior trunfo, do "Trunfo"?

Marina Trindade: O Trunfo do Trunfo (risos). A grande historia do Trunfo que eu percebi na pré estreia, é que o que desperta o público é o jogo mesmo, essa possibilidade de ser único. De ter em cada apresentação um jogo diferente. Muitas pessoas foram nos dois dias e viram dois espetáculos. Como é que a gente se prepara pra isso? A gente não manipula as cartas, não sabemos que cartas vão sair. Então, o grande trunfo do trunfo é o jogo. É o que nos tira de qualquer lugar comum.

Inaê Nascimento: Pessoalmente, é o terceiro espetáculo que eu faço, e a cada processo de criação é um aprendizado. Agora falando do espetáculo mesmo, acho que a grande sacada do Trunfo é o público tirar a nossa sorte. Toda apresentação será um Trunfo diferente e único. As pessoas vão ter que assistir todos os dias! hehehe

Holofote Virtual: Vocês já tinham tido um contato maior com o Tarô?

Marina Trindade: Antes de começarmos a imaginar esta pesquisa do Trunfo, eu não tinha tanto contato com o Tarô, eu nunca tinha tirado as cartas. Nunca nem tinha visto de perto um baralho, mas lembro que na universidade uma amiga que pesquisava Tarô, trouxe um baralho pra um resultado de uma disciplina que a gente apresentou e a partir daí ele foi aparecendo pra mim. 

A Inaê é que trouxe a proposta do tarô pro espetáculo. Em principio ela queria fazer um ensaio fotográfico reproduzindo as lâminas dos arcanos maiores no tecido aéreo, especificamente. Mas aí, achamos que isso poderia ser um espetáculo e o inscrevemos no edital da Funarte. A partir disso comecei a ler estudar e a compreender o jogo, a leitura da cartas.

Holofote Virtual: Antes do início da montagem, vocês realizaram uns laboratórios, os chamados Café Tarôs, como foi esse processo?.

Inaê Nascimento: Os Café-tarôs foram muito importantes pra alimentar essa bagagem que se manifestaria intuitivamente nos exercícios e nos treinos. O treinamento físico com os equipamentos, as oficinas que a gente teve com o papai e com a Michele Campos foram muito importantes pra um condicionamento técnico mesmo pra dar conta dos 11 arcanos que vieram. Eu mesma tenho dificuldades com estar em cena, mas ao mesmo tempo tenho uma confiança de que no fim sempre dá certo, e eu me sinto bastante a vontade com os mistérios do tarô :) 

Katherine Valente: Entrei no processo á no finalzinho. Ou seja, o espetáculo já estava quase todo encaminhado quando cheguei! Estava treinando havia um ano, fazendo algumas apresentações paralelas quando chegou essa proposta! Gostei muito da ideia de mesclar teatro, circo e tarô em uma montagem e aceitei de cara! 

Antes de conhecer o circo eu já tinha dois anos de atuação em artes cênicas. Eu tinha um contato prévio com essa linguagem maior do que as meninas, portanto, ficou um pouco mais fácil para eu ultrapassar a técnica “dura” que é a circense! Facilitando essa ressignificação das imagens, somente acrobáticas, por uma leitura contextualizada nas simbologias das cartas. 

Inaê Nascimento: Pela experiência anterior do Maresia, eu tinha muita confiança de que os Arcanos iriam se manifestar. Digo isso, porque no Maresia fizemos uma pesquisa densa que se transformou em cena de uma forma muito intuitiva, que só depois de pronto a gente conseguia ver o quanto da pesquisa tinha se manifestado nas cenas. Bem, 11 Arcanos se manifestaram, talvez se o processo tivesse se alongado mais seriam os 22. 

Holofote Virtual: É difícil dar texto, fazer acrobacias e encenar ao mesmo tempo? 

Inaê Nascimento: Muuuuuuuito! Pra mim é bastante difícil, principalmente porque não tenho base de teatro.

Fazer acrobacia é brincadeira, exige preparo físico, treinamento técnico, condicionamento, segurança, mas é "molecagem", mas fazer isso dando texto e encenando exige uma bagagem técnica e uma concentração que me falta. Às vezes fico perdidinha, exausta, dá vontade de dizer "Falô! vou voltar a ser só público" RS

Katherine Valente: O mais difícil, posso dizer, foi gravar a sequência de algumas cenas já concebidas, mas com um pouquinho de esforço e alguns roxos (risos), consegui fazer tudo! Arrisco dizer que esse espetáculo pode ser resumido a uma frase que é citada no início da apresentação: “Arrisque-se nesse caminho!”.

Marina Trindade: É um desafio fazer um espetáculo que tem teatro, circo, dança, acrobacia. Isso nos traz um lugar de desconforto que a gente sempre buscou. No próprio Maresia, a gente enxergava que, de repente, um número de tecido não ia trazer tudo que a gente queria, e então partimos pra pesquisa. Fomos pro mangue fazer improvisação e se pendurou por lá, enfim...

O Trunfo vem dessa forma, traz mais circo, mas estamos buscando a teatralidade dentro disso. Daí o desafio é como transpor isso, sem deixar as coisas delimitadas? Como que eu posso transpor essa plástica bem delineada do circo pra uma expressividade cênica. Então a nossa busca é aperfeiçoar a técnica circense pra transpor isso pra outra expressividade. Esse é um dos nossos grandes desafios, encontrar este lugar de misturar as coisas. O que nos interessa é a transversalidade.

Holofote Virtual: Katherine, você também faz ou fez cinema! Como é isso?

Katherine Valente: Então... Eu ingressei em 2012 na turma de Cinema e Audiovisual da UFPA, mas sai do curso! Acho que ficar atrás de câmeras e computadores durante horas não é muito do meu gosto! Prefiro ser atuante na cena mesmo!

Holofote Virtual: Inaê, como assim da Oceanografia para o teatro?

Inaê Nascimento: Eu não deixei de ser Oceanógrafa, espero que não. Foram coisas que aconteceram paralelamente quase. Bom, desde criança a arte é um prato básico em casa. Cresci assistindo o papai em cena, vendo ensaios, andando pelos teatros...

A minha mãe é arquiteta também, o que ao meu ver é uma arte, sempre a acompanhei nos trabalhos dela, a casa era sempre cheia de lápis de cor, lápis e canetas diferentes... Eu fiz dança durante a minha adolescência inteira, escrevo bastante... Eu fui muito estimulada artisticamente, uma hora isso ia acontecer rs. 

E ao mesmo tempo sempre fui fascinada pela natureza, ciências, as relações ecológicas, principalmente pelos ambientes aquáticos, pelo mar, me sinto extremamente a vontade nesse contato. E quando chegou a hora de fazer vestibular não tinha outra coisa a não ser oceanografia pra eu fazer. E aí durante a graduação, eu soube que o Charles tava dando oficina de circo, e eu queria aprender tecido aéreo, então fui lá fazer a oficina, e não parei mais de treinar aéreos. E as coisas foram acontecendo. 

Holofote Virtual: Quais os planos após esta estreia? Pra onde vai o Projeto Vertigem?

Marina Trindade: Nós temos funcionado como grupo de projeto. Inscrevemos em editais, temos ganho prêmios e vamos fazendo, a política cultural que está aí é essa e vamos abraçando, pois precisamos produzir. Mas estamos com vontade de partir para outros espaços, buscar festivais de teatro e de circo, encontrar espaços de trocas. Somo um grupo jovem que ainda não teve oportunidade pra isso.

A Vitória Sampaio, que tava em cena no Maresia, e agora trabalha mais  na parte visual com a gente, também está com vontade de conhecer outros lugares, viajar. É isso que queremos viabilizar agora, circular com o Maresia quanto com o Trunfo. Queríamos apresentar a grupos de mulheres, estamos fazendo alguns contatos já.

Inaê Nascimento: Eu quero férias (risos)! Gostaria muito de terminar as lâminas. Não necessariamente transformá-las em cena, mas concluir os 22 Arcanos no formato das lâminas que a Victoria Sampaio confeccionou a partir das nossas fotos nos equipamentos. Que era a minha intenção lá no inicio, antes do Trunfo ser Trunfo. Seria muito massa ter um Tarô do Projeto Vertigem :)

Katherine Valente: Eu espero que a brincadeira de viajantes da cena invada a realidade! E que, o espetáculo viaje pelo mundo, pela lua, pelo sol e se possível até por tooodo o universo! (Risos) 

Nenhum comentário: