"Nós de Aruanda - Artistas de Terreiro" já foi assunto aqui no blog. Arthur Leandro, envolvido na curadoria e organização nos falou sobre as perspectivas da exposição, cuja segunda edição será aberta nesta sexta-feira, 7, às 19h, e segue com programação diversa de 10 a 28 de março, sempre das 9h às 19h, na Galeria Theodoro Braga, do Centur. Abaixo, trecho de um dos textos de Aruanda, livro de crônicas de Eneida de Moraes, seguido de texto dos organizadores da mostra.
"Quando foi mesmo que ela chegou pela primeira vez a meus
ouvidos, não sei. Era apenas uma palavra, mas trazia um cheiro violento de
terra e de liberdade, gosto de fruta madura, uma palavra apenas, porém usando
paladar e olfato.
Por que me embalava tanto como se fossem os braços de minha
mãe? Pés se arrastavam, corpos dançavam, vozes cantavam e ela vinha clara e
sonora, não se explicando ou definindo, mas evocando lembranças, saudades,
passado, distante país, tempos idos, mocidade, vida vivida...
Aruanda é o país
que sempre trazemos dentro de nós, país de Liberdade e de Paz, país sem
desigualdades nem ódio, sem injustiças ou crueldades. (...) Aquele que
carregamos como uma arma ou uma joia tão brilhante, pois foi por nós
construído, vivido, criado, e por nós defendido. (...) Em Aruanda o lírio é
mais lírio e as estrelas brilham com maior intensidade, porque tomamos parte
direta na construção de toda a paisagem."
Eneida de Moraes (“Aruanda” [crônicas], Livraria José
Olympio Editora – Rio de Janeiro, 1957)
Aruanda é uma referência ao porto de São Paulo de Luanda,
lugar de onde partiam os negros sequestrados e trazidos ao Brasil na condição
de escravos, e a referência ficou na memória coletiva como o lugar onde se
encontraria novamente a liberdade que vinha com as lembranças do continente de
origem. Aruanda chama, Aruanda acolhe, Aruandas dão-se as mãos!
Nós de Aruanda, nossas Aruandas, nosso passado, nosso
presente e nosso futuro! E ao mesmo tempo um tempo-lugar-fantasia-documento de
nós, sobre nós. Nós que somos filhos e filhas de tantos santos quanto são os
tempos das Áfricas amazônidas.
Espaços-tempo reunidos para superar concepções
que separam a arte da religiosidade e das tradições afro-brasileiras.
Arte-Aruanda deve ser entendida como território tradicional negro que tem uma
vontade imensa de transpor esse muro gigantesco que separa comunidades
tradicionais do mundo branco normatizado.
Na contracorrente da indústria cultural, nós de Aruanda
caminhamos em qualquer lugar e transitamos por estrada trilhada entre folhas
que não separam a vida da arte, caminhamos para a política da construção do
nosso lugar em todos os lugares. Misturados ao solo que nos abriga, somos parte
desta terra preta, terra fértil, que alimenta novos brotos em
território/terreiro que gera a vida!
Vidas exuberantemente diversas, selvagens, fortes, mágicas,
e, porque não, criativas... Verás de tudo um pouco, de memórias, objetos do cotidiano,
oferendas, práticas ritualísticas, enfrentamento político, afirmação de
identidades a construir sonhos, narrativas e poéticas.... Práticas artísticas
diversificadas, e se por aqui a arte te parecer mais viva, é porque revertemos
a violência colonizadora para nos tornarmos paisagem de reconstrução do cosmos
cultural sustentado em afetos.
Arthur Leandro, Isabela do Lago e Aurilene Ferreira
Serviço
Serviço
Exposição Nós de Aruanda - Artistas de Terreiro. Galeria Theodoro Braga - FCPTN (Centur). Abertura: 7 de março de 2014. Visitação: 10 a 28 de março de 2014, de segunda a sexta, das 9h às 19h. Entrada franca.
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