17.4.19

"Marias" segue a segunda temporada na Casa Cuíra

Fotos: Dani Cascaes
Em plena Semana Santa, de Sexta da Paixão (19), passando pelo Sábado de Aleluia (20) e o Domingo de Páscoa (21), o convite é para ir ao teatro e refletir sobre o amor incondicional e a violência, dois viés da história vivida por Maria e seu Filho Jesus. Em segunda temporada, e em cartaz neste final de semana, na Casa Cuíra, “Marias” traz em cena cinco atrizes talentosas das artes cênicas paraense, com direção de Saulo Sisnando e dramaturgia de Edyr Augusto Proença. Sempre às 20h, na Rua. Dr. Malcher 287 - Cidade Velha - Centro Histórico de Belém do Pará.

“Marias” fala de perdas, de morte. Versa sobre mães que, como Maria, perderam seus filhos para a intolerância e para a violência urbana. Em forma de fragmentos de dramas reais. Em cena, Zê Charone, Monalisa da Paz, Gilsele Guedes, Pauli Baños e Sandra Perlin. O espetáculo, que estreou em novembro de 2018, dentro de um processo, como explica a atriz Zê Charone, “estranho e doloroso”.  Já havia um pré-texto escrito por Edyr. 

“Estávamos em meio às eleições para presidente e nossa fala foi se transformando na história que estávamos vivendo. Cinco atrizes que foram mexidas e instigadas pelo aqui e agora. O diretor foi enlouquecido e também saiu de sua área de conforto. Isso virou um espetáculo recortado pela realidade”, explica Zê. “Voltamos em cena agora, com um espetáculo nem alegre e nem triste, mas totalmente real”, conclui. 

Espetáculo teve construção coletiva

Edyr Augusto trabalhou sobre um texto que partiu de um livro sobre Maria Mulher e Jesus seu filho, em que ela refletia sobre o que teriam feito com seu filho. 

“Começamos a discutir esse tipo de dramaturga, em que estamos desenvolvendo todos juntos. As atrizes são expressivas e cada uma tem sua opinião. O próprio Saulo saiu da zona de conforto, do tipo de trabalho dele. Houve discussão, elas trouxeram questões e a dramaturgia foi surgindo, enquanto o Saulo as colocava em cena”, diz Edyr.  “Marias é sobre o amor incondicional, mães que amam seus filhos sendo eles o que forem. E teatro é um resultado coletivo, cada uma que está ali tem propriedade do que está dizendo”, continua. 

A montagem, que conta com a assistência de direção de Leonardo Moraes, também constrói sua narrativa em torno da criação de luz de Patrícia Gondim (com operação de Amanda Melo) e dos figurinos de Maurício Franco. O cenário e os figurinos são construídos com velhas cortinas, com a mensagem de que precisamos descortinar as histórias destas Marias desconhecidas e dar voz aos seus dramas tão ignorados e não-sabidos. 

“A construção do espetáculo foi uma grande surpresa pra mim, porque a partir de uma história que se deu milhares de anos atrás. É a história da Maria, a mãe de Jesus, que perde o filho pra violência. 

Muitas mulheres perdem seus filhos pra violência e de diversas formas, inclusive neste mundo contemporâneo. O diferencial, nesse espetáculo é que dessa vez são essas mulheres que estão dizendo o que é perder um filho para a violência. Não estamos falando de Jesus crucificado e o que ele disse na cruz, mas sim como essa mãe se sentiu diante da morte do filho”, diz Sandra Perlin. 

O espetáculo conta então a história da perda. “E contracenar com essas atrizes é absolutamente maravilhoso. São mulheres entregues na pesquisa, na cena, super profissionais e que já trabalharam em diferentes espetáculos”, diz Sandra Perlin, para quem o trabalho chega com um gosto de estar iniciando um trabalho como se fosse a primeira vez. “A ideia é sempre de que estamos começando hoje, inclusive passando pelo Saulo e o Edyr, resultando num trabalho muito instigador na parte técnica e na parte emocional também”, avalia a atriz.

Pesquisa trouxe à tona a voz das mulheres

A partir de uma pesquisa em que as atrizes ouviram muitos depoimentos, e leram sobre essas situações de violência, o espetáculo traz fatos históricos, como a dos desaparecidos no período da Ditadura Militar, ou dos que foram vítimas da violência na periferia das grandes cidades, além de personagens mais icônicos, como Gisberta Salce Junior, mulher transexual, sem-teto, imigrante brasileira assassinada em Portugal e que se tornou um símbolo da LGBTIfobia na Europa, mas é pouco conhecida no Brasil ou Stuart Angel, filho da estilista Zuzu Angel que foi torturado e morto pelo regime militar e, até hoje, seu corpo não foi encontrado. 

Para a atriz Monalisa da Paz, esse trabalho é também uma nova experiência. “Esse é o meu trabalho de verdade, fora do Grupo Gruta de Teatro, onde eu trabalho há mais de 30 anos. 

Uma direção diferente. Atrizes que eu conheço, mas que nunca tinha trabalhado junto. Com direção do Saulo Sisnando, que pra mim foi uma surpresa muito grande, de ter esse momento de troca com ele, acho ele um diretor extremamente sensível e seguro no que ele faz, com uma linha muito marcante e esse trabalho, quando eu falo da troca, foi uma novidade pra todo mundo, até pro Saulo”, comenta Monalisa da Paz. 

Ela conta que entrou em um lugar que é bem diferente do que vem ocupando no Gruta e que tem proporcionado a ela se entender mais como atriz no processo de criação. “Foi um processo criativo, embora tenha a dramaturgia do Edyr. As atrizes trouxeram histórias próprias. A gente fala do feminicídio, nos desparecidos da ditadura, enfim, e eu, como mãe, fazendo esse trabalho, não foi fácil, foi extremamente doloroso, porque eu só pensava nos meus filhos o tempo todo, ao ouvir depoimentos de mulheres que perderam seus filhos, de pesquisar e ouvir muito sobre isso”, diz Monalisa.

A importância desse espetáculo para o público, em sua opinião, é não deixar banalizar a violência. “A gente fala da violência, desses adolescentes que morrem muito cedo na periferia. É não julgar uma mãe que perdeu um filho bandido. O filho roubou, foi linchado na rua e morreu. E essa mãe muitas vezes é julgada por isso, por ter um filho bandido. As mulheres são julgadas pelos filhos que têm nessa sociedade. Está sendo um trabalho muito importante pra mim como mulher, atriz, mãe. Em cena, com essas mulheres de teatro, que admiro muito e hoje estou junto”, finaliza. 

FICHA TÉCNICA / MARIAS

Elenco
Monalisa da Paz
Sandra Perlin
Gisele Guedes
Pauli Banhos
Zê Charone

Dramaturgia
Edyr Augusto Proença

Direção
Saulo Sisnando

Assistente de Direção
Leonardo Moraes

Luz / Som/ Palco
Patricia Gondim
Amanda Melo

Serviço
“Marias” em cartaz nos dias 19, 20 e 21 de abril, às 20 horas, na CASA CUÍRA - Rua. Dr. Malcher 287 - Cidade Velha. Belém.

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