Na próxima sexta-feira, 23, completa uma semana que a artista visual e fotógrafa Luciana Magno se mudou de “mala e cuia” para a Rua Rui Barbosa, 1660, entre a Gentil Bittencourt e Conselheiro Furtado. Não se trata de um endereço exatamente residencial, embora seja lá que ela esteja morando nos últimos dias.
A Dell Ano, uma loja de decoração e modulados foi o espaço escolhido pela fotógrafa para realizar a intervenção Vit(r)al, com a proposta de habitar (ocupar) um espaço já montado com quarto, sala e cozinha durante uma semana. A idéia que à princípio causou espécie na proprietária e vendedoras da loja, acabou agradando o júri de um dos eventos de arte mais sólidos do Estado do Pará que concedeu à obra, o terceiro grande prêmio do Salão Arte Pará.
Os espaços, já prontos, foram ocupados por Luciana e seus objetos pessoais: roupas, livros, CDs, lençóis, toalhas, pratos, pequenos eletrodomésticos. Desde então, seu dia a dia é acompanhado diariamente pela internet através de câmeras espalhadas pela loja. Prestando atenção em tudo você consegue desenhar o perfil dessa jovem artista que já tem na trajetória outros trabalhos tão instigantes quanto este.
Neste caso, ela dorme na loja, acorda, estuda, lê, trabalha o TCC. E tudo é transmitido em tempo real. No Museu da UFPA, um dos espaços do Salão Arte Pará, uma tela de TV mostra tudo aos visitantes.
Para quem achar qualquer semelhança com um reality show, ela avisa. “É um pouco o oposto, vou sair e também receber amigos, fazer o que faço normalmente só que em uma casa de vidro. Estou abrindo minha casa. Num Big Brother, por exemplo, as pessoas são isoladas em um coletivo. Eu quero abrir esse isolamento”, explica Luciana.
A loja funciona normalmente no período do dia e os clientes se espantam um pouco com aquela moça tão à vontade circulando por lá. Os olhares são curiosos. “Teve uma senhora que achou que eu era uma cliente que tinha saído apressada de casa e esquecido de trocar o pijama”, brinca.
A instalação tem feito sucesso também entre as crianças que passam pela loja. “Tem gente que entra e até abre o meu armário. As crianças ficam maravilhadas no quarto porque eu tenho muitos brinquedinhos. No sábado eu fui até o Museu da UFPA e vi na televisão uma menininha brincando com os senhores Cabeça de Batata em cima da cama. Isso foi ótimo porque além da minha própria vida, do meu corpo, das minhas ações, existem os objetos que ficam aqui quando eu saio e as pessoas ficam muito mais à vontade de tocar nas coisas. Estou vivendo o dia a dia, vamos ver o que mais acontece até sexta”, diz.
Magno tem gostado da experiência e aos poucos se sente mais e mais em casa. No último sábado, por exemplo, ela recebeu alguns amigos para um feijoada, pasmem.
Ela observa, porém, o contraste grande entre o período do dia, quando a loja tem movimento e à noite, quando o silêncio é total. “Chego a ouvir os móveis estalarem”, se diverte.
“Cortei os vínculos com a minha outra casa, desde sexta que não passo lá e pretendo não ir até esta próxima sexta, assim fica mais fácil formar um novo referencial de residência e viver isso”, afirma.
Sobre Luciana Magno sabemos que: ela nasceu em 1987 em Belém do Pará. Ainda criança começou a se interessar pela imagem. Em uma mudança repentina de residência foram abandonados inúmeros objetos assim como todas as fotografias da família que estavam guardadas juntas em uma mala-baú. Essa ausência da imagem, da identidade visual, a fez iniciar na fotografia em 2003 através da oficina Photo Morphosis ministrada por Miguel Chikaoka.
Desde então participa de diversas exposições coletivas, salões, colóquios e seminários de arte. É uma das integrantes do grupo “Espiandomundo” - mais nova prole que nasceu da Associação Foto Ativa. Faz experimentações com fotografia artesanal (pinhole), vídeo, e com novas mídias de imprimir, aprisionar ou libertar imagens. Atualmente finaliza o curso de Artes Visuais e Tecnologia da Imagem na Universidade da Amazônia.
Para saber mais sobre a artista, durante a semana da intervenção, tanto na galeria do Museu da UFPA, quanto no acesso de qualquer ponto de internet, você pode ver o desenvolvimento do trabalho pelo site http://www.blogtv.com/People/vitral. No encerramento do Arte Pará, a artista irá apresentar um vídeo editado de toda a ação.
Magno diz que a idéia de fazer a instalação tem haver com o que ela investiga, hoje, em seu TCC. Pesquisando o reboliço do movimento artístico dos anos 80, ela percebeu como as pessoas viviam pelas ruas, pelos bares, pelas casas uns dos outros e nascia disso um monte de projetos e ações interessantes.
“O TCC é um período de isolamento pirante, foi desse isolamento que nasceu a vontade de abrir as portas de casa”, diz Luciana. “O que faz uma casa ser uma casa é a vida que habita nela. Acho que é um questionamento muito pessoal acerca da intimidade, dos espaços e da utilização disso tudo”, complementa.
3 comentários:
Parabéns Luciana por essa instigante proposição!!
Sua ação é um convite ao público paraense a tomar contato com novas práticas artísticas que discutem questões tão presentes em nossa vida contemporânea: relações entre público e privado; aproximações entre arte e práticas cotidianas; etc, etc, etc...
Alexandre Sequeira.
Lu, adorei a proposta, que experiência interessante! Intrigante, fato. A tua criatividade estimula a minha compreensão. Adorei mesmo. Amei as fotos, o vídeo deve ter ficado o máximo. Parabéns!!!! Tens talento para inquietar a curiosidade dos outros.
Bjaum, Nise.
'Home is where the heart is'.
Genius.
When the artist left the room,
and the camera shut down,
the ghost left the machine,
and the soul left the building.
This artist communicates something personal en masse, a feat of rare poetry.
Alex Reuben, London, UK
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