Priscilla Brasil tem 31 anos, nasceu em Belém do Pará. É arquiteta e comunicóloga, com pós-graduação em marketing e negócios do audiovisual. Fez Comunicação e mestrado na Puc-Rio.
Atualmente à frente da empresa produtora de audiovisual Greenvision, que iniciou sua carreira em 2004, ela desponta na cena cinematográfica paraense como diretora de documentários.
Nesta nesta terça-feira, ela fala de suas experiências com audiovisual no debate da sessão do Inovacine, que exibirá "Serra Pelada - Esperança não é Sonho", prêmio do DOC TV de 2007, da jovem diretora.
A programação também traz "F For Fake", de Orson Welles e faz parte do projeto de cineclubismo da Fapespa - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Pará -, em parceria com a APJCC - Associação Paraense dos Jovens Críticos de Cinema - e Espaço Cultural Na Figueredo.
Priscilla Brasil traz na trajetória a produção de “As Filhas da Chiquita” (2006), “Serra Pelada” (2007), “Terra de Negro” (2008) e “Brega S/A” (como produtora executiva - 2009). Atualmente trabalha outro documentário, o “Notas sobre Waldemar”, que deve ficar pronto até o final deste ano.
“Não sei se isso pode ser considerado uma carreira tardia, pois demorei um tempo pra poder fazer o que eu faço. Fiz um monte de tentativas, mas agora acho que não tem mais mudança, não”, diz em meio a uma risada de quem sabe o que está dizendo.
Curto ou não, seu tempo de profissão já lhe redeu vários prêmios como o do Mix Brasil (SP) e o da Mostra Amazônica do Filme Etnográfico, além de premiações em mostras menores. Mas o que dá mesmo orgulho em Priscilla é ver seus filmes selecionados e exibidos em festivais como o Festival do Rio, o Los Angeles Outfest, o London BFI LGFF e para o CINEPORT, além ter uma obra chegado a aquisições por canais nacionais. “Ainda não deu para ganhar um festival grande, mas vamos trabalhando. Quem sabe esse dia chega logo?”, conclui.
Acreditando nas novas tecnologias e suporte para a difusão do audiovisual no mundo inteiro, essa semana a produtora Greenvision está disponbilizando todo seu conteúdo já produzido no site www.greenvision.com.br. “A internet é uma ferramenta muito importante pra divulgação do audiovisual independente”, afirma a diretora.
Nesta entrevista, Priscilla Brasil fala sobre sua trajetória e adianta questões relevantes sobre a produção de Serra Pelada. Ela confessa que foi difícil fazer e que o contato com a realidade que encontrou ali lhe deixou muito afetada emocionalmente. Priscilla também fala de produção de cinema em Belém e do movimento cineclubista.
A Sessão do Inovacine acontecem sempre às segundas-feira, mas esta semana, por causa do feriado do dia 12, será realizada nesta terça-feira, 13, a partir das 18h. No Espaço Cultural Na Figueredo, que fica na Av. Gentil Bittencourt, 449, entre Dr. Moraes e Rui Barbosa. A entrada é franca.
Durante a produção de Serra Pelada, esperança não é sonho você estava esperando um filho. Houve uma certa demora para finalizá-lo. Conta um pouco dessa história.
Priscilla Brasil: Foi duro demais pra uma mulher grávida. Eu me envolvo muito com as realidades que filmo e sofri muito pra fazer isso aí que está na tela. Ainda penso em um reencontro com essas pessoas, em uma passagem de cinco anos nessas vidas e também na minha, obtendo um novo final. Por isso, o final do que está montado é aberto, e ainda penso de algum jeito, que não é o final. Ainda quero encontrá-los. Minha relação com Serra Pelada não acabou. Não acabou mesmo, de jeito nenhum.
O que ficou de mais marcante?
Priscilla Brasil: A idéia da vida aprisionada por uma esperança foi muito forte. Chorei durante três horas seguidas no último dia. Eu amava aquelas pessoas, queria tirá-las dali, uma por uma. Queria mudar as histórias de vida, queria mudar o futuro. Mas ninguém pode fazer isso. De alguma forma, me senti muito mal, como se eu os estivesse abandonando, depois de terem confiado a mim todas as suas angústias. Mas eu só podia jogar isso pro mundo, eu não tinha mais nada pra fazer. Eu me senti impotente. Achei meu trabalho ridículo durante uns meses. Demorei uns meses pra voltar a gostar de fazer o que eu faço. É muito duro não poder fazer nada. A gente só pode gritar e esperar que alguém ouça. Mais nada.
Quais as impressões de Serra Pelada que não foram pra tela?
Priscilla Brasil: As que eram mais sobre o passado, sobre como era Serra Pelada. Escolhi não usá-las. São discursos que as pessoas aprenderam a fazer. Toda vez que chega alguém com câmera lá, eles dizem ‘ah, a gente trabalhava na cava, era duro, as escadas eram grandes...’. Tem um pouco disso no filme, mas muito pouco. Todo mundo já sabe dessas histórias de ficar rico e comprar avião. Eu queria o que está além disso, como a angústia do hoje. Eu queria saber o que eles querem e o que são, não o que queriam quando chegaram lá.
Mudando de assunto, cineclubismo: qual tua opinião sobre estes espaços?
Priscilla Brasil: Muito importantes. Muitos desses meus filmes já fizeram circuitos de cineclubes em outras cidades. Muito bom que isso esteja acontecendo em Belém. No fundo, eu acho ótimo. É um espaço de discussão de audiovisual, mais do que uma simples exibição de filme.
No caso da Greenvision, como rola a captação para os projetos independentes?
Priscilla Brasil: Na Greenvision, estamos juntos quando temos dinheiro ou quando não temos e apoiamos os projetos uns dos outros. Patrocínios vêm aos poucos, mas ainda não dá pra viver disso totalmente, mas está dando pra tocar a minha vida e desse "time" que estamos formando. Aprendemos a trabalhar com poucos recursos: a gente não vai deixar de fazer só porque ninguém quer patrocinar. Já foram dois filmes grandes sem um tostão. Me orgulho de pensar que por mais polêmico que o assunto seja, vamos conseguir fazer, mesmo que os patrocinadores não apareçam. Sinto-me mais livre, pensando assim.
Como a Greevision se situa neste mercado do audiovisual?
Priscilla Brasil: A Greenvision provisoriamente trata de documentários sobre a Amazônia e videoclipes de bandas independentes brasileiras. Um curta está previsto para o primeiro semestre do ano que vem (espero). As coisas estão indo bem, as pessoas tem progressivamente respeitado mais nosso trabalho tanto aqui quanto lá fora. Gosto de pensar que estamos calmamente evoluindo, sem precipitações e sabendo dos limites do que podemos propor, para que o trabalho fique decente apesar das limitações.
O teu primeiro doc “As Filhas da Chiquita” fez um grande sucesso, até internacional...
Priscilla Brasil: Público gay é um público de ouro pra qualquer cineasta (principalmente os iniciantes). Cara, eles levaram o filme pra todos os lugares que eu já pisei na vida. Toda a cidade que eu chego, o filme já passou. Eles piratearam tudo e eu achei lindo. Distribuíram o filme, ele caiu no mundo e eu sou só agradecimentos sinceros, por isso. Às vezes a gente não tem tempo pra tirar o filme da gaveta. È ótimo ver que ele sai da gaveta sozinho.
Alguma observação sobre a atual produção paraense?
Priscilla Brasil: Fico feliz de ver uma galera filmando: Fernando Segtowick, o pessoal do Edital da Secult. Será que Belém está acordando? De alguma forma, eu tô apostando muitas fichas nisso. Não quero sair daqui, não.
O que está faltando para que o Pará dispare no circuitão brasileiro de cinema?
Priscilla Brasil: Dinheiro... está faltando grana. Cinema é atividade de grana, não tem jeito. Tá faltando uns coletivos também, eu acho, mas já vejo eles se formando. As entidades de classe, tipo a ABD, que representam todos existem, mas eu acho muito saudável formar um grupo de pessoas que gosta tanto quanto tu de fazer isso e te apoiar nelas. Os grupos são muito importantes. Eles tornam as coisas viáveis.
Os festivais são bons espaços para mostrar novos filmes?
Priscilla Brasil: Festival é um mercado muito importante. Muito mesmo. Há uma audiência qualificada, que gosta de cinema e quer ver o filme e, principalmente, disponibilizou um tempo da vida dela pra sentar ali na frente daquela tela. O cara saiu de casa, tomou banho, enfrentou o trânsito e tá ali sentado. Ele quer entender, ele não vai zapear. Esse público é incrível, não tem outro igual.
Havia um projeto teu, um documentário sobre os prostíbulos ambulantes na Amazônia....
Priscilla Brasil: Ainda demora. Chama "As Visitadoras". Ainda vai ser feito, ainda vai ser feito (rs). Mas o projeto original não dava pra agora, então foi pro final da minha fila constante de quatro projetos mais o que eu trabalho no momento.
Cinema e novas tecnologia. Como um namora o outro?
Priscilla Brasil: Só filmo em digital. É algo meio doido. Eu estou tentando achar um workflow possível para a periferia do terceiro mundo (ai, que pretensão). Penso tanto nisso, em como podemos fazer mais e melhor com isso. Fico satisfeita com o visual dos filmes (pra mim é tudo filme, não venha me dizer que filme é só o que é feito em película). Na internet estamos em contato com gente do mundo todo que pensa essas estruturas pequenas de produção. Eu quero testar o que eu puder, me bater se tiver que me bater, mas achar soluções. Fazer a coisa mais barata e mais possível, todo dia. Século XXI, né, gente? Vamos nos conectar!
2 comentários:
Luciana, estou muito impressionado com o talento da Priscilla. Já assisti "Brega S/A" e "As filhas da chiquita". Graças à internet, esses filmes chegaram em BH.
Os dois filmes já viraram o meu presente de aniversário padrão.
Parabéns pela matéria!
Querido, a Pris é mesmo um talento. O SA é produção dela, quem dirigiu foi o Vlad, outra cara muito interessante.
De Priscila já vi os doc sobre Serra Pelada, o Salvaterra - Terra de Negro, sobre a cultura de resistencia das comunidades quilombolas de Salvaterra - Marajó e o Filhas da Chiquita. Ainda não vi o doc sobre o maestro Waldemar Henrique.
bjos
Postar um comentário