"Ode a uma Nobre Pianista”, biografia da pianista Helena Maia, hoje com 73 anos, uma homenagem pela contribuição da artista para a música erudita feita em Belém. O livro sai pela Paka-Tatu, com apoio cultural da Escola de Música da UFPA. O lançamento será nesta quinta-feira, 24, na Igreja de Santo Alexandre, às 19h30.
Escrito pela própria filha, Gilda Maia, em parceria com Líliam Barros, o livro apresenta ao leitor o processo de formação e atuação musical de Helena Maia, e transforma em documento histórico a vida e a obra da pianista.
Nascida no ventre de uma família onde a música era o caminho quase natural de seus rebentos, Helena Maia trouxe consigo o sobrenome Nobre, que tem ainda na família homens e mulheres que ajudaram a construir a história da música erudita paraense no final do século XIX e início do século XX.
“Há muito preconceito em relação à pesquisa, as pessoas dizem: ‘Ah, você vai fazer um livro sobre a tua mãe? Mas se eu e Líliam não tivéssemos feito, quem iria fazer? O importante da pesquisa é fazer algo que te toque, porque você faz com vontade, com amor. E o professor Armando [Alves Filho, editor do livro] foi tocado. Ele comprou a ideia. Foi feito por uma pessoa querida [ele foi meu professor de História], que valoriza as coisas daqui. Então, as coisas foram se encaixando. Eu sempre quis homenagear a minha mãe de alguma forma e esse livro é a concretização de um sonho”, afirma Gilda Maia.
Lenita acompanhadora oficial Irmãos Nobre 14 anos |
Conheci Gilda, pessoalmente, no ano passado, quando ela e alguns amigos do mestrado em arte e mais um grupo de artistas e jornalistas organizavam uma ação para homenagear os Irmãos Nobres. E pesquisando a história de sua mãe, Gilda Maia acabou conhecendo mais ainda a emocionante história dos irmãos Ulysses e Helena, os quais sua mãe Lenita, aos 14 anos, já acompanhava ao piano. Portadores de hanseníase, eles moravam em uma casa que ficou conhecida como Gaiola Dourada por enclausurar os “Uirapurus Paraenses”.
Gilda conta que desta casa, a partir de 1931, os Irmãos Nobre só saiam da clausura através das ondas do rádio da PRC-5 (a Rádio Clube do Pará – “a rádio que canta e fala pela planície”), a qual passou a instalar dentro desta casa seu aparato radiofônico e transmitir para seus ouvintes os Festivais Lítero-Musicais dos Irmãos Nobre.
“Dizem as crônicas da época, que a cidade parava para ouvir Helena e Ulysses na noite dos Festivais Radiofônicos dos Irmãos Nobre. As salas desta casa, na Trav. Campos Sales, ficavam repletas de convidados e a rua Campos Sales fechava, interditada pelas pessoas que da rua assistiam a tudo através das janelas da mesma casa”, disse-nos Gilda em uma das reuniões do grupo.
A idéia era realizar um cortejo carnavalesco pelos arredores da casa no bairro da campina, como forma de chamar atenção para a atual situação de abandono em que se encontra a ex-residência dos Nobres, uma casa de fachada róseo-clara localizada à travessa Campos Sales, entre as ruas O´de Almeida e Aristides Lobo, ao lado de um casarão verde, que fica na esquina da Aristides.
Orquestrada UFPA (regida por Nivaldo Santiago) Teatro Paz |
“Esta casa, juntamente com as personalidades de Helena Nobre e Ulysses Nobre, são marcos, que simbolizam a história e o movimento musical de Belém de uma época. Memória que pretendemos divulgar e difundir, informando a sociedade atual”, afirma. A ação acabou não acontecendo, mas abriu caminhos para outras idéias que só agora começarão a colocados em prática.
O livro é dividido em cinco períodos da vida da pianista: “A Nobre Lenita”, que narra a saga da Família Nobre e destaca-se a importância dos irmãos Ulysses e Helena Nobre para a cena cultural e artística de Belém; “Lenita em recital”, no qual estão os principais momentos da carreira da pianista e do aprendizado do instrumento.
Em “Tocar meu conjunto: um ato de amor”, ela fala do talento de Lenita na arte de tocar a Música de Câmera. Em a “Orquestra Juvenil do SAM” (Serviço de Atividades Musicais), traz o momento em que Helena atuou como professora, além de ter ajudado a fundar a Orquestra e finalmente em “Lenita entre Nós”, as autoras destacam o perfil artístico de Helena Maia e o papel exercido por ela na música paraense. Além disso, feliz com o lançamento do livro, Gilda Maia diz que se descobriu pesquisadora. Ela conversou com o Holofote Virtual sobre esta experiência e de seus futuros projetos na pesquisa, que inclui a construção de um site em homenagem aos irmãos Nobres.
Gilda Maia |
Holofote Virtual: Como é revirar o baú da própria mãe para contar a sua trajetória?
Gilda Maia: O interesse em escrever a biografia de minha mãe foi a vontade em homenageá-la ainda em vida. Vê-se que muitos artistas e intelectuais costumam receber apenas homenagens póstumas. Acredito que é muito importante a sensação de alegria em serem homenageados. E isso eu e Líliam quisemos proporcionar à pianista Helena Maia (minha mãe). Presenciei a maioria das entrevistas realizadas com Helena Maia e transcrevi a maioria delas também.
Holofote Virtual: Quais foram tuas principais fontes de pesquisa além das entrevistas com a própria Helena? Você se deparou com surpresas?
Gilda Maia: Além das entrevistas com Helena Maia, foram utilizados recortes de jornais, programas de concertos, fotos, depoimentos de pessoas que conviveram com ela, o currículo de Helena Maia e o álbum de recortes da carreira artística de Helena Maia.
Este álbum foi feito por sua tia-avó Helena Nobre (cantora lírica paraense da primeira metade do século XX). Fiquei surpresa com cada documento encontrado. Na época, estavam dispersos nas gavetas e armários da casa de minha mãe.
Através destes documentos e das conversas com Helena Maia, conheci profundamente a vida desta pianista, que eu ainda não conhecia, pois minha relação com ela era dentro da informalidade de minha casa e no relacionamento de mãe e filha. A grandiosidade desta profissional e o carinho que a sociedade tem para com ela me encantaram. Passei a admirá-la ainda mais após esta pesquisa.
Helena e Luis Cuevas, do trio camerístico da UFPA |
Holofote Virtual: Qual foi teu maior prazer nessa jornada?
Gilda Maia: Além de conhecer uma Helena Maia que ainda não conhecia, me descobri como pesquisadora. A partir deste trabalho, passei a produzir vários outros. Atualmente, estou fazendo um site sobre os Irmãos Nobre, meus tios bisavós Helena e Ulysses Nobre, cantores líricos da época da borracha.
Holofote Virtual: O que você conta sobre eles no livro?
Gilda Maia: Abordo brevemente sobre sua carreira artística (Helena e Ulysses Nobre), sobre seus pais e irmãos também músicos, sobre sua casa localizada à travessa Campos Sales (batizada de Gaiola Dourada) e sobre os Festivais Radiofônicos dos Irmãos Nobre promovidos pela Rádio Club do Pará PRC-5.
Holofote Virtual: Há algum tempo havia uma vontade tua de chamar atenção para esta casa onde eles moravam, na Campos Sales, hoje abandonada. Em que pé ficou este assunto?
Gilda Maia: Ainda não se fez nada. E do jeito que as coisas andam, provavelmente será mais uma casa pertencente ao Patrimônio Histórico de Belém que irá ao chão. Infelizmente, isso tem acontecido com frequência na cidade e ninguém toma nenhuma providência.
Esta casa é símbolo de parte da história da música da cidade de Belém, mas o descaso existe e está lhe degradando, não demorará muito para virar pó, como as casas que existiam ao seu lado esquerdo, hoje local utilizado como estacionamento de uma loja de Belém. Isso é muito preocupante, pois a história e a memória representam a identidade de uma cidade. Esquecer ou não conhecer essa memória é não se reconhecer nessa história.
1ª apresentação da Orq. Juvenil do SAM, em 1974 |
Holofote Virtual: Belém tem uma história forte ligada a música erudita. Você também atua nesta área. Como você vê o momento atual do ensino da música erudita aqui?
Gilda Maia: Vários trabalhos têm sido realizados em Belém, como Festivais de Ópera, Orquestras e inúmeros recitais de música de Câmara e música Solo. No entanto, viver como músico aqui, ainda não traz uma estabilidade como em outras cidades brasileiras. Hoje, músicos paraenses só têm duas alternativas, ou ir buscar campo de trabalho mais estável e digno em outras localidades ou trabalhar como professores de música.
Holofote Virtual: O que vocês esperam com o lançamento deste livro?
Gilda Maia: Esperamos, além de homenagear a pianista Helena Maia, divulgar, difundir e dar acesso à sociedade em geral sobre esta parte da história da música de Belém.
7 comentários:
Adorei o post. Acho que o Holofote Virtual, do qual sou leitor frequente, deveria postar mais sobre a história da cultura paraense.
Caro Fábio, sempre bem vindo!!! A história da cultura paraense (ontem e hoje) é um dos objetivos do blog, sem dúvida, o pouco tempo da blogueira é que torna as coisas mais lentas... contribuições são aceitas. e um dia chegamos lá. Obrigada!
Luciana, mais uma vez obrigada pelo espaço e por ajudar a divulgar a obra da Helena Maia e da Família Nobre.
Yó, eu que agradeço pela sugestão!!!
bjosss
Parabéns pela matéria!
Leio diariamente o Holofote, ele é um forte instrumento pra promoção da cultura no Estado.
Rosa.
Excelente iniciativa e post!! O que é feito do Museu da Imagem e do Som paraense?
Oswaldo Reis Junior
Oi Oswaldo, boa pergunta. O Museu da Imagem e do Som está situado, sem uma sede própria, no mesmo prédio do Museu de Arte Sacra (entrada pela Padre Champagnat. Até onde sei, nesta nova gestão estadual, ele ainda está sem diretor, mas possui uma equipe que trabalha em seu laboratório e atendimento ao público. No final do ano passado, o Holofote Virtual postou uma matéria abordando o Mis, veja: http://holofotevirtual.blogspot.com/2010/12/sessao-cult-e-reflexoes-sobre.html
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