3.5.17

Campanha para reeditar "Ponte do Galo" continua

O prazo para o financiamento coletivo que pretende reeditar uma importante obra do escritor romancista paraense Dalcídio Jurandir, encerra em 34 dias. Até o momento, no Catarse, apenas 60% do valor total foi arrecadado. Falta menos da metade, mas falta. “Ponte do Galo”, o sétimo romance dos dez que formam o chamado Ciclo do Extremo-Norte, foi publicado em 1971 pela Editora Martins/MEC. Conversei com um dos organizadores da campanha sobre o projeto de reedição e o que precisa ser feito para que efetivamente ele se concretize.

Baseado na economia colaborativa, o financiamento coletivo tem como fundamento a premissa de que juntos todos podem conquistar seus objetivos. Foi exatamente nisso em que Denis Girotto, da Pará.grafo Editora, de Bragança, e André Fernandes, da Toró de Letras, acreditaram. Os dois são leitores de Dalcídio Jurandir, que se incomodaram com a dificuldade de reunir toda a sua obra e resolveram intervir neste processo de desatenção que pesa sobre a cultura paraense.  

“A maioria dos livros de Dalcídio estão esgotados e sem reedição há anos. Juntamos nossas vontades de fazer a literatura paraense ser reconhecida por nosso próprio povo (porque é de uma grandeza valiosa), ao fato da editora ter recém-iniciado os trabalhos. Sonhamos em trabalhar com uma obra desse tamanho e importância. Bem, aqui estamos”, comenta André.

Ele diz que as pessoas têm recebido bem a ideia e ajudado a divulgar. Nas redes sociais foi criada uma boa rede de interessados, mas nem todos participam, efetivamente, comprando o livro. “É a única coisa que de fato vai garantir que este projeto se torne realidade e cumpra a finalidade de resgatar essa obra do esquecimento”, enfatiza.

O ritmo de colaborações vem diminuindo e preocupando os organizadores. O financiamento coletivo precisa provocar uma Catarse, daí talvez o nome da plataforma mais antiga do país, e pela qual Denis e André realizam a campanha. É preciso o corpo a corpo, fazer com que pessoas que acreditam no mesmo que você se voltem à campanha e ajudem não só a difundi-la como também colaborem.

Experimente ser um patrocinador de cultura

Poderia ser mais fácil, mas ao que parece, embora esta ferramenta já tenha se mostrado eficiente e confiável, tirando muitos projetos do papel e deixado colaboradores felizes com o resultado, ela ainda causa espanto, descrédito ou não é do conhecimento de um número alto de pessoas que poderiam somar com esta e tantas outras excelentes iniciativas que buscam novas formas de produzir e distribuir cultura. 

É um desafio para todos, mas patrocinar com R$ 10,00 ou um pouco mais reais, a reedição de Ponte do Galo, também pode ser tornar uma bela experiência, algo digno de se deixar em sua história de vida.

Já colaborei e escolhi um valor que me dá em contrapartida, uma edição impressa. Quero muito que a meta seja alcançada e que possamos reeditar outras obras mais, de muitos outros autores.


“Temos escritores, artistas plásticos, fotógrafos, atores, músicos etc. de qualidade surgindo todos os dias e fazendo mais sucesso lá fora do que aqui. Isso sem falar nos antigos, já consagrados, mas que não podem mais ser encontrados porque não há um incentivo do porte que precisamos”, comenta André, que cita Antonio Tavernard, Maria Lúcia Medeiros e Eneida de Moraes, que também merecem reedições.

“Quem vem tentando salvar essa memória é a iniciativa privada, através de editoras regionais e nacionais, mas que também tem que trabalhar a formação do seu público de leitores, já que os jovens de hoje passam pela vida escolar inteira sem ter ouvido falar dos nossos principais autores. É um trabalho grande”, diz André que ainda conversou mais um pouco com o blog, sobre Dalcídio Jurandir.

Porque ler e onde encontrar Dalcídio Jurandir

Holofote Virtual: Ponte do Galo é o livro mais raro de Dalcídio. Por que nunca antes houve nova reedição?

André Fernandes: Não é fácil entender porque os livros do Dalcídio Jurandir não têm tido reedições constantes. Várias editoras já iniciaram trabalhos de reedição de toda a obra, mas pararam pelo caminho. Cito a Cejup, Falângola, Editora da UEPA e a Editora da UFPA. Perceba que são editoras paraenses. As grandes editoras nacionais ainda não abriram os olhos para reeditar seus livros. Apesar de a Record ter lançado algumas primeiras edições, não trabalhou com as reedições. 

Não quero pensar que é por considerarem ser uma obra de caráter regional, pois não avalio assim. A obra dalcidiana trata de temas universais inerentes ao ser humano, bem como a de Guimarães Rosa, por exemplo.

Holofote Virtual: Onde encontrar as obras editadas de Dalcídio Jurandir

André Fernandes: Alguns livros do Dalcídio foram reeditados e por diferentes editoras. O “Chove nos Campos de Cachoeira”, por exemplo, foi reeditado recentemente pela editora 7Letras e até pouco tempo estava disponível para venda. Os reeditados pelas editoras da UFPA e da UEPA (“Belém do Grão-Pará”, “Marajó” e “Primeira Manhã”), também lançados ano passado pela Editora Marques, podem ser encontrados em livrarias de Belém, como a Fox. Os demais apenas nos sebos virtuais, com preços exorbitantes (por serem raros hoje), ou com muita sorte “garimpando” nos sebos de rua.

Dalcídio Jurandir na entrega do Prêmio Machado de Assis
na Academia Brasileira de Letras - 1972  (acervo/família) 
Holofote Virtual: Na tua opinião. Qual a importância de Dalcídio para a literatura brasileira?

André Fernandes: Dalcídio Jurandir foi o autor que conseguiu retratar da forma mais fiel a vida e os dramas do povo amazônico. E ainda fez isso com maestria e de forma poética. Sua escrita é um entalhe perfeito da vida do nosso povo, formando emblemas humanos complexos e fiéis à realidade cabocla e ribeirinha, misturados com floresta e campos alagados de rio e chuva.

Durante sua vida, Dalcídio foi aclamado por escritores como Jorge Amado, Graciliano Ramos, Oswald de Andrade, Clarice Lispector, Raquel de Queiroz, e o português Ferreira de Castro, para citar alguns. Seus livros tiveram capas de Cândido Portinari e foram publicados em Portugal e Rússia. Sua morte foi transformada em poema por Carlos Drummond de Andrade, no famoso “Canções de alinhavo”.

Foi premiado pela Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de sua obra, que naquele momento ainda estava no sétimo romance, justamente o “Ponte do Galo”. Como José Cândido de Carvalho disse: Dalcídio foi “um romancista tão grande quanto a sua ilha”. Aqui deve ter ficado claro como não é fácil entender porque sua obra ainda é de difícil acesso.

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