Fotos: acervo da cineasta |
Célia Maracajá tem uma longa e bem definida história de atuação no cinema brasileiro, incluindo aí um leque extenso de produções que trazem à tona questões ligadas à região amazônica. Atuou nas minisséries Diários da Floresta e Palmares Coração Brasileiro Alma Africana, no telefilme A Descoberta da Amazônia Pelos Turcos Encantados. Dirigiu documentários como Aprendendo a Voar e a Arte do Saber, em conjunto com realizadores indígenas. Em cena, atuou ainda nos Teatros Oficina ( José Celso ) e Arena ( Augusto Boal).
Na trajetória também atuou em longas como Feio, Eu?, de Helena Ignez, e em filmes clássicos do cinema brasileiro como O Homem que Virou Suco, de João Batista de Andrade e Ladrões de Cinema, de Fernando Coni Campos; Realizou com Luiz Arnaldo, Aikewara, A Ressurreição de um Povo e o Vento das Palavras, Célia hoje vem ministrando Oficinas de Interpretação Teatral para a juventude do MST. É Coordenadora da Oficina de Audiovisual Indígena, em Belém, professora da Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Rio de Janeiro e atualmente faz parte do elenco do projeto Antígona, dirigido por Milo Rau e desenvolvido em conjunto com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra.
Célia define o cinema como um "território de emoções que percorrem insondáveis e profundos caminhos”. Para ela, a Amazônia é o lugar onde “as águas desaguam nas lutas de todos os povos desse imenso continente” e onde “ecoam as vozes das culturas e imaginários dos povos indígenas, negros, ibéricos, caboclos”.
Um de seus trabalhos, a série Transamazônica - Utopias na Selva, desenvolvido a partir do edital Prodav-5 da Ancine, será exibida na TV Cultura do Pará entre 21 e 24 de abril, às 23h. Na entrevista a seguir, Celia traz reflexões acerca do cinema e as histórias contadas a partir do território amazônico.
Holofote Virtual: Você também realiza oficinas de cinema para indígenas, qual é o propósito?
Célia Maracajá: As Oficinas Indígenas de Audiovisual, que realizamos junto aos povos: Aikewara, Gavião, Xikrin, Kayapó, Wai-wai, Parakanã, Assurini, buscaram introduzir no mundo do cinema, estes parentes, a fim de contarem as suas próprias histórias. Resultando disso foram 07 curta-metragens. Acreditamos na arte de contar histórias. O nosso cinema amazônico-paraense busca revelar os muitos brasis do norte brasileiro. Que estas imagens nos encantem. Revelando o novo. Nascido em tempos imemoriais.
No filme Aikewara, a Ressurreição de Um Povo, um documentário longa-metragem que realizei junto com Luiz Arnaldo, narramos a saga do povo Suruí-Aikewara, seu silêncio e seus renascimentos. Na década de 70, o Exército Brasileiro tomou de assalto, e ocupou sua aldeia, no Sul do Pará, e iniciou uma operação de guerra para erradicar os jovens guerrilheiros do Araguaia. Os Aikewaras sofreram uma tremenda violência cultural mas conseguiram superar as marcas dolorosas e recuperaram, na prática, o direito de existir.
Na série Transamazônica- Utopias na Selva, onde fui assistente de direção e coordenei a produção, navegamos no meio de um êxodo, sem precedentes, com milhares de pessoas, vindas de todo país, trazidas em meio a ilusões, sonhando com um pedaço de terra que muitas vezes não existia. Gente que foi largada à própria sorte. Atravessamos também o drama de povos indígenas como os parakanãs, os araras, os apinajés, os tenharins, mundurucus, parintintins para quem a estrada significou invasão e muitas vezes o desalojo de suas terras, e, sofrem agora com as agressões do garimpo, do tráfico de drogas e das madeireiras e o agronegócio. Neste caminho encontramos resistência: sindicatos dirigidos por mulheres, gente que resistiu e doou sua vida em defesa dos povos da Amazônia.
Holofote Virtual: Como você lê esse momento do país, em relação a nossa produção audiovisual?
Célia Maracajá: Aqui em Belém estávamos em plena efervescência com o aumento das produções locais, bem como com as discussões quanto a estética, linguagem, produção, exibição, quando fomos golpeados duramente por esse desgoverno genocida que ocupa a presidência do Brasil. Ao extinguir o ministério da cultura e a política cinematográfica , implantada durante os governos Lula e Dilma, o desgoverno busca nos destruir. Necessário re- existirmos, buscarmos encontrar na ausência a nossa emergência .
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