Inspirado no conto de Herman Melville, autor de Moby Dick, o espetáculo chega por aqui, depois de passar por mais de 120 cidades e já contar com três anos de estrada. Selecionado pelo Programa Petrobras Distribuidora de Cultura 2011/2012 e indicado a duas categorias no Prêmio Shell 2008 São Paulo (Melhor Atriz e Melhor Cenário), pode ser visto no Teatro Gasômetro hoje, 28, e amanhã, 29. Entrada franca.
Dirigida por Joaquim Goulart e Daniela Carmona, a montagem é baseada na literatura do século XIX e teve sua adaptação feita pelo dramaturgo espanhol José Sanchis Sinisterra. O espetáculo mostra a relação entre Bartleby, interpretado pela atriz Cácia Goulart, e o advogado, interpretado por Rodrigo Gaion, numa curiosa inversão de papéis. Bartebly resiste às ordens do patrão, usando sempre de forma cortês a frase “Prefiro não”, que desperta uma série de acontecimentos e derruba o sistema de normas, valores e referências de seu superior.
O espetáculo convida o espectador em meio a lirismo, humor e intelectualidade a refletir sobre temas como: o materialismo exacerbado, a difusão da violência, o fracasso ideológico, o individualismo contrastando com a perda da identidade, o nada de vontade, as relações de trabalho e poder em uma sociedade capitalista e alienante.
O cenário é simbólico. Divisórias monocromáticas e pranchetas transparentes retratam a monotonia do ambiente de trabalho e da vida de Bartleby, contrastando com os figurinos, que possuem cores fortes que sintetizam os estados emocionais de cada personagem. A iluminação dá a sensação de um mundo seco e áspero e a trilha sonora busca dar unidade a esse clima do espetáculo.
Para Cácia Goulart, a frase “Prefiro não” mostra a resistência do protagonista, que aos poucos tira a situação de poder do advogado. “Da perda de identidade à impessoalidade nas relações de trabalho, são muitas as questões implícitas no texto. O voluntarioso advogado e o retraído Bartleby figuram como tese e antítese da noção de status, estratificação social e possibilidades de mudanças no mundo contemporâneo”, comenta.
A relação de poder entre padrão e empregado são questionadas. “A cada resposta evasiva de Bartleby, abre-se a fresta para a entrada do insólito nas atitudes e sentimentos despertados no advogado. Contra essa cortês e inexplicável resistência pacífica do copista estilhaça-se todo o sistema de normas, valores e referências de seu superior. Algo da operação de cópia se corrompe. Agora já não é Bartleby que copia para o advogado, mas o advogado que copia Bartleby”, explica Cácia.
E no meio dessa “conturbada” relação encontramos, além dos momentos de reflexão, cenas hilárias. “O retrato da personalidade excêntrica e inativa de Bartleby garante momentos hilariantes ao espetáculo. E o desconcerto que ele provoca em seu superior não é menos engraçado. O empregador é um homem civilizado e não sabe agir à recusa do súdito (isenta de maldade, ironia ou qualquer sentimento humano). Perde pouco a pouco a compostura. Descontrola-se num desespero crescente, que ironicamente quase lhe rouba a humanidade, transformando este advogado de admirável polidez num ser animalizado. E na mesma medida o conteúdo e a linguagem proposta pela encenação revelam um drama profundo e de alta qualidade”, avalia a atriz.
O processo de construção dos personagens foi cuidadosamente realizado em parceria com o diretor Joaquim Goulart e a preparadora de atores Inês Aranha. Para dar vida à Bartleby, Cácia buscou um olhar inexpressivo e movimentação repetitiva, quase robótica. Já Rodrigo Gaion levou intensidade ao advogado. “O jogo cênico e a construção das personagens sintetizam, sob bases não-realistas, o discurso poético do texto original”, define Cácia.
Serviço
“Bartleby”, da companhia paulista Núcleo Caixa Preta. Dias 28 e 29 de setembro, às 19h, no Teatro Gasômetro (Av. Magalhães Barata, 830). Entrada gratuita (retirar o ingresso com uma hora de antecedência na bilheteria do teatro). Censura: 14 anos.
(com informações do Caderno Você, do Diário do Pará)
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