Nesta época tudo que não é, se torna tradicional aqui em Belém do Pará. Duvida? O sábado véspera da grande procissão do Círio de Nazaré já está marcado, há dez anos, pelo arrastão que leva milhares de paraenses e visitantes ás ruas de nossa cidade. É uma festa de fazer arrepiar da cabeça aos pés... Leia mais sobre o Arrastão do Círio, no texto enviado por Yorranna Oliveira, da assessoria do Instituto Arraial do Pavulagem. E não falte nesta grande festa da cultura popular. As fotos são de Karina Paes.
Véspera do Círio de Nazaré. Hora do almoço em Belém do Pará. Fogos explodem no céu. As ruas próximas à Estação das Docas estão entupidas de gente. Buzinas enlouquecem os ouvidos. O sol e o calor castigam.
Músicos com instrumentos de percussão, pessoas com brinquedos e adereços de miriti, papel e garrafas pet, homens e mulheres em cima de pernas de pau. Dia de Arrastão do Círio, o cortejo que reverencia a Virgem de Nazaré, o universo ribeirinho, os brinquedos de miriti, o trabalho dos artesãos, a cultura popular. Há um colorido vertiginoso na paisagem.
Neste sábado, 9 de outubro, o Arrastão do Círio completa dez anos de homenagens à padroeira dos paraenses e da Amazônia. O Cortejo só inicia quando Nossa Senhora aporta em terra firme, vinda do distrito de Icoaraci, em Belém.
É o término da Romaria Fluvial. Nesse momento, fé e festa se encontram enquanto os músicos do Batalhão da Estrela tocam o hino do Círio de Nazaré – “Vós sois o Lírio Mimoso” -, no ritmo da Marujada de Bragança. Eles são acompanhados pela voz de um público que abarrota as ruas ao redor e se espreme na tentativa de ver, tocar, tirar uma foto da imagem, gravar o instante de homenagens.
“É o que nos liga ao Círio de Nazaré. Nós, assim como o Auto do Círio e a Festa da Chiquita, já estamos atrelados a ele. O Arrastão é inspirado nesse cenário plástico e artístico dos brinquedos tradicionais, como o roque-roque, o soca-soca, a girândola, que estão presentes no cortejo. É uma imersão na tradição popular do Círio”, afirma Júnior Soares, músico do grupo Arraial do Pavulagem.
A Santa vai embora depois da homenagem e o Arrastão do Círio segue por outro destino. Ele percorre o Ver-o-Peso em direção à Praça do Carmo, no bairro da Cidade Velha. E o povo vai junto, cantando, dançando, pulando ao som de carimbó, retumbão, boi-bumbá entre outros ritmos da Amazônia. Com direito a banho de cheiro na Feira do Ver-o-Peso.
Este ano, a cobra grande de miriti, símbolo da homenagem e que faz alusão à corda dos promesseiros, do Círio de Nazaré, será substituída por uma cobra feita de garrafas pet.
O trabalho realizado por artesãos da capital paraense, crias das oficinas artísticas da Fundação Curro Velho, garante maior resistência do brinquedo às apresentações, mostra a possibilidade de criação a partir de outros materiais, além de reafirmar o caráter sustentável cada vez mais presente nas ações do Instituto Arraial do Pavulagem. Mas os demais brinquedos de miriti permanecem no cortejo.
Quem participa da festa vem dos mais diversos cantos do Pará, do Brasil e do mundo. É gente que vem para o Círio e fica sabendo do lado cultural e profano do evento. Gente que vem para a Romaria Fluvial e resolve ver aonde vai parar toda aquela alegria, todo aquele colorido e agitação.
Gente que vem amanhecida do Auto Círio, e que ainda pretende participar logo mais à noite da Trasladação, ficar na Festa da Chiquita e no dia seguinte ainda tem pique para acompanhar o Círio. Haja fôlego. E tem gente que vem só para o Arrastão mesmo.
Ao chegar à Praça do Carmo, os músicos do grupo Arraial do Pavulagem continuam a festa, num palco montado para receber atrações musicais de várias partes de Belém e do Estado. Todos para também homenagear Nossa Senhora, tocando os ritmos da região amazônica.
Bastidores - O cortejo sai pelas ruas de Belém, graças ao trabalho do Instituto Arraial do Pavulagem, com o apoio da Prefeitura Municipal. O Instituto é hoje um ponto de cultura, o “Arraial do Saber”, do Ministério da Cultura. Ao longo do ano, ele promove outros cortejos: o Cordão do Peixe – Boi em fevereiro, no Carnaval, e o Arrastão do Pavulagem em junho, para comemorar a Quadra Junina. E o Boi Orube, do Conjunto Satélite, também ajuda a dor o tom e a sonoridade da festa.
O Arrastão do Pavulagem é o mais antigo de todos. Ele começou em 1987, da iniciativa de um grupo de músicos e compositores paraenses com um traço em comum: valorizar e divulgar a música de raiz feita na Amazônia e construir uma relação mais próxima com o público.
Com esse intuito, o grupo iniciou uma brincadeira aos domingos na Praça da República, usando a alegoria de um boizinho na tala para atrair o público presente para apresentação musical, no palco do Teatro Experimental Waldemar Henrique. Os cortejos de cultura popular, os “Arrastões do Pavulagem”, começavam aí.
Como a bateria numa escola de samba, os integrantes do Batalhão da Estrela são os responsáveis por dar o tom ao cortejo. O Batalhão é formado por percussionistas, pernaltas, dançarinos, pessoas que carregam materiais, água e os músicos do grupo Arraial do Pavulagem.
Gente jovem, gente velha, que gosta de rock, samba, axé, forró, música clássica e de Arraial do Pavulagem. Gente que mora nos mais diversos bairros da região.
Gente que nasceu, escolheu ou foi escolhida pela Amazônia para morar, como a inglesa Kezia Lavan, de 33 anos. Ela é violinista, e toca percussão no cortejo. Há um ano morando em Belém, e depois de cinco meses no município de Curuçá, no interior do Estado, o choque cultural para Kezia nem existe mais. “Já acostumei”, diz a professora de inglês, com o sotaque carregado.
O Batalhão ensaia quase o ano inteiro. Participa de oficinas de percussão, dança e artes circenses, promovidas pelo Instituto Arraial do Pavulagem, através do Ponto de Cultura Arraial do Saber, para fazer bonito nas apresentações.
O músico Rafael Barros, de 35 anos, comanda essa ‘orquestra’ de rua. É ele quem dita o ritmo e as variações da percuteria (mistura de elementos de percussão com os de bateria) do Batalhão. Há cinco anos no Arraial, ele foi convidado só para dar uma oficina de percussão no Instituto. Depois vieram os convites para ensaiar o Batalhão da Estrela e para participar da banda.
“As coisas foram acontecendo e estou aqui até hoje. O Batalhão consegue agregar as pessoas. Ele tem universitário, serviços gerais, médico, advogado. Tem gente que toca heavy metal e toca no Batalhão. Tem gente que vai pra Timbalada, mas gosta do Arraial. O Batalhão tem isso, da pessoa querer estar aqui”, analisa.
Serviço
Arrastão do Círio 2010. Dia 9 de outubro, véspera do Círio de Nazaré. Saída da escadinha da Estação das Docas. Concentração a partir das 10h. Av. Boulevard Castilho França, s/n – Bairro da Campina. Mais informações: www.arraialdopavulagem.com.br
Um comentário:
Grata pela divulgação, Luciana. E não deixe de comparecer ao cortejo tbm, estás convidadíssima.
Abraços.
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