27.7.22

UFOPA lança livro no X Fórum Social Panamazônico

"Luta pela terra na Amazônia: mortos na luta pela terra! Vivos na luta pela terra!", projeto literário de extensão da UFOPA, será lançado em Belém, no próximo dia 30, no hall do centro de convenções Benedito Nunes, na UFPA, dentro da programação do 10o Fórum Social Pan-Amazônico, que abre nesta quinta-feira, 28, e sege até 31 de julho, em na capital paraense.  

O livro tem quase 800 páginas, reúne 20 trabalhos assinados por quase 30 pessoas, entre filhas, filhos, parentes, amigos e pesquisadores mobilizados para recuperar a história dos defensores da reforma agrária, direitos humanos e meio ambiente mortos no Pará. 

Nas páginas desta obra constam casos de dirigentes sindicais, advogados, religiosos, chacinas e defensores do meio ambiente. O fotógrafo Sebastião Salgado cedeu fotos do Massacre de Eldorado, enquanto o procurador da República Felício Pontes assina artigo sobre a missionária Dorothy Stang, assassinada em 2005. Já o professor de Direito Rafael Pimenta, irmão de Gabriel, assina o artigo sobre o defensor dos direitos humanos. 

Em meio ao delicado ambiente que nubla a vida da sociodiversidade amazônica, marcado pelo aceno que se ergue a partir do governo nacional em favor de toda ordem de violência, em alinhamento com os setores mais conservadores da nossa sociedade, um livro brota dos sertões da Amazônia. O lançamento nacional já rolou no dia 18 de julho, no Campus I da Unifesspa, em Marabá, quando o assassinato de Gabriel Pimenta soma 40 anos de impunidade. Depois de Belém, ainda haverá lançamentos em Imperatriz (MA), no dia 19 de agosto e em Xinguara, nos dias 13 e 14 de setembro.

A violência nas paragens da região é compreendida no livro sob o prisma estrutural que marca o avanço do capital sobre a Amazônia, como atesta os recentes acontecimentos transcorridos no estado do Amazonas, que redundou no assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips. Fato precedido pela chacina da família do senhor Zé do Lago, ocorrida em janeiro, no município de São Félix do Xingu, no Pará. 

Romaria em memória de Dorothy Stang, 
assassinada em 2005, em Anapu-Pa.
Registro de Miguel Chikaoka
cedido ao livro.

Tais violências representam digitais do processo da integração subordinada da Amazônia aos circuitos econômicos mundiais. Há sangue em todas as latitudes. Sangue de indígenas, quilombolas, camponeses e das pessoas a eles alinhados, como advogados e religiosos, entre outros sujeitos. 

Os 20 trabalhos estão divididos em seis seções. Dão corpo à obra: Camponeses, onde são realçados nove casos, entre eles, o de Raimundo Ferreira Lima (Gringo), João Canuto, Expedito Ribeiro, Virgílio Sacramento, José Dutra da Costa (Dezinho), Avelino Silva; em seguida vem o capitulo dos Massacres, que contempla os casos da Chacina Ubá, Chacina da fazenda Princesa e o Massacre de Eldorado.

Gabriel Pimenta, João Batista e Paulo Fonteles integram o bloco dedicado aos advogados que combateram o latifúndio, enquanto que no quarto item, estão a Irmã Adelaide, Padre Jósimo e a Romaria das Meninas, que compõem a seção dedicada aos religiosos. Na parte dedicada às entrevistas, seguem relatos do Padre Paulinho, ex-coordenador da CPT do Pará, e o recém falecido dirigente camponês do Maranhão, Manoel da Conceição. Por por fim, o sexto anexo faz um resumo sobre casos de mortes e o andamento dos processos.   

Felício Pontes assina artigo sobre a missionária Dorothy Stang, ombreado pelo padre Amaro, agente da CPT em Anapu, sudoeste do estado, onde a missionária e igualmente agente da CPT foi assassinada em fevereiro de 2005. Por lá, no Lote 96, as tensões permanecem. Fazendeiros e pistoleiros diariamente ameaçam os moradores e lideranças. Permanências de uma democracia esgarçada, marcada pela concentração da terra e da renda, o Estado autoritário, as coerções públicas e privadas. Toda ordem de abuso contra os mais fragilizados. Assim como Dorothy, Amaro sofre todo tipo de pressão: ameaças, criminalização por conta da missão que desenvolve junto aos camponeses,  até preso foi. 

Familiares assinam artigos sobre a memória das vítimas

Paulo Fonteles, morto em 1987.
Registro de Miguel Chikaoka cedido ao livro.
José Dutra da Costa (Dezinho), dirigente sindical e quadro da Fetagri sudeste do Pará foi executado em 2000 na porta de sua casa em Rondon do Pará, quando o natal se avizinhava. Grileiros de terra, fazendeiros e madeireiros estavam incomodados com a atuação do presidente do Sindicato dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Rurais (STTR) do município.  

O nome de Dezinho chegou a constar na lista de pessoas marcadas para morrer por conta do combate que realizava pela reforma agrária. As autoridades do Estado sabiam. Todos sabiam. Nada foi feito. A hoje advogada e filha do dirigente sindical, junto com a viúva assinam o relato, Joélima da Costa e Maria Joel, respectivamente.  Com o assassinato de Dezinho, dona Maria assumiu a direção do sindicato. Assim como o esposo, dona Joel viveu e ainda vive inúmeras situações de ameaça. 

A professora da rede pública e mestra em História pela UFPA, Luzia Canuto, narra a saga do pai, João Canuto e dos irmãos que foram assassinados na cidade de Rio Maria, sul paraense. Como Dezinho, Canuto foi morto em dezembro. O crime ocorreu no dia 18. João foi morto com 18 tiros desferidos à queima roupa. Anos depois três filhos de Canuto foram sequestrados. Somente um sobreviveu, Orlando. Entre os acusados das atrocidades na cidade de Rio Maria, sul paraense, constam fazendeiro Vantuir Gonçalves Cardoso e o político Adilson Laranjeira. Eram tempos da União Democrática Ruralista (UDR). Instituição animada pelo hoje novamente governador de Goiás, Ronaldo Caiado. 

Execuções e chacinas notabilizaram o sul e sudeste do Pará como as regiões mais delicadas na luta pela terra do Brasil.  E permanecem como área de risco.  Como outros casos marcados pela impunidade, o recurso usado pelos defensores dos direitos humanos foi apelar para Organização dos Estados Americanos (OEA) como forma de responsabilizar o Estado Brasileiro. O caso mais recente que tramita na OEA é do advogado Gabriel Pimenta. 

Em 2011 foram mortos na cidade de Nova Ipixuna, nas proximidades de Marabá, o casal de agroextrativistas José Cláudio e Maria do Espírito Santo, no Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Praia Alta Pinheira.  O único nesta categoria nas regiões que aglutinam mais de 500 projetos de assentamento. Muitos batizados com os nomes dos dirigentes assassinados. A maioria dos projetos foi reconhecido após o Massacre de Eldorado, ocorrido em 1996. 

A morosidade do Incra é colocada como fator que redundou na tocaia que matou o casal, que também teve os nomes em listas de marcados para morrer. Os irmãos de José, a advogada recém formada, Claudelice Santos é quem assina o artigo junto com Claudenir.  Ela e a família assumiram a bandeira ambientalista do casal.  Claudelice fez parte de uma turma de Direito da Terra, da Unifesspa. Iniciativa criada e direcionada para pessoas ligadas à defesa da reforma agrária, direitos humanos e do meio ambiente. 

Oficialmente o Estado do Pará declara que 19 trabalhadores rurais ligados ao MST foram mortos pelas tropas da PM no Massacre de Eldorado. A chacina ocorreu na Curva do S, na cidade de Eldorado do Carajás, em 1996. A ordem partiu do ex- governador já falecido, o médico Almir Gabriel (PSDB), que tinha como secretário Paulo Sette Câmara. 

As tropas foram comandadas pelos militares Major Oliveira e o coronel Pantoja. Os laudos comprovam que boa parte dos 19 sem terra foram executados à queima roupa.  Da cúpula de mandantes, somente Oliveira encontra-se vivo. Assim como em outras casos, o manto da impunidade cobre o caso. Os advogados José Batista Afonso e Carlos Guedes assinam o artigo. 

O sangue não conhece cercas na Amazônia. A História da “conquista” da fronteira é uma história de expropriação de suas populações e assassinatos. Situações amalgamadas por precárias investigações, processos morosos e inconclusos no Judiciário – quando os mesmos chegam a ser instaurados -, este célebre por sua parcialidade em situações de conflitos que envolvem grandes corporações, grileiros de terras e fazendeiros e a sociodiversidade local da região.

“Quem não vive na Amazônia não sabe como o perigo nasce e descamba com o sol e vem ainda com a noite, cotidianamente” esclarece o derradeiro texto do livro, assinado por  Júlia Iara, militante do MST/MA, publicizado quando da passagem de 21 anos do Massacre de Eldorado, em 2017.

Serviço

Lançamento do livro Luta pela terra na Amazônia: mortos na luta pela terra! Vivos na luta pela terra! 

Belém – 30/07

Local: UFPA – Fórum Social Panamazônico (FOSPA), hall do Auditório Benedito Nunes

Hora: 11h 

Imperatriz/MA – 19/08

Local e hora: a definir

Xinguara – 13 e 14/09

Local: Sintepp – (Sindicato dos Trabalhadores e das Trabalhadoras em Educação Pública do Pará)

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