Ararajuba: cênico e brincante, ambiental e inclusivo |
O passarinho que dá nome ao grupo, sempre formoso, é interpretado por uma criança, ou mais de uma. A personagem, porém, não tem fala, mas às vezes cantam. Invariavelmente, porém, transitam entre as cenas, tornando esses momentos mágicos durante o espetáculo. Adoro quando passam à frente da minha câmera deixando rastros de vôos rasantes.
E pensar que tudo isso surge durante a Belle Époque, quando pessoas das camadas mais populares tiveram contato, mesmo que indireto, com as companhias e espetáculos de ópera apresentados no Theatro da Paz. Poucos tinham acesso à sala de espetáculos, mas podiam ouvir as apresentações do lado de fora e, posteriormente, muito provavelmente também escutavam os nobres para quem trabalhavam comentando sobre os dramas e as árias performadas.
Surge assim o que também chamamos aqui de Ópera Cabocla. Fascinante, indo da simplicidade a grandeza artística. Testemunho da criatividade e resiliência. O Teatro de Pássaro é uma forma de expressão própria e rica em significados, inserindo as influências europeias, mas incorporando elementos locais, criando uma identidade cultural que é um orgulho nosso!
Memórias recentes tecidas em tradição secular
Os matutos: núcleo de personagens |
Vi o Ararajuba, grupo criado em 2002 pela saudosa Iraci Oliveira, irmã de Iracema Oliveira, Guardiã do Pássaro Tucano e que, por sinal, este ano recebe as homenagens na Feira Pan Amazônica do Livro e das Multi Linguagens. Pois bem, é tradição também que os Pássaros sejam cuidados por núcleos familiares e assim, após o falecimento de Iraci, em 2017, o Ararajuba passou para a guarda da sobrinha delas, a Rosa Oliveira.
“Ela já tinha esse pássaro lá em Mosqueiro, e pela falta de brincantes lá no Pássaro, ela me pediu ajuda, aqui em Belém, para mobilizar outros brincantes, porque a gente também já vem de uma tradição folclórica com outros grupos, outras instituições, como o Iaçá, que eu sou coordenadora. E aí eu comecei a ajudá-la nesse sentido. Quando ela veio a falecer em 2017, a familia veio e disse ‘olha, Rosa, não tem jeito, vais ter que assumir o Ararajuba'”, e assim foi!
Ferramenta para a educação ambiental
Déia Palheta e músicos do grupo Ararajuba |
Déia se refere e defende o Pássaro Junino como uma ferramenta de educação. “É importante que exista uma política pública para o Pássaro Junino que, na minha opinião, além de ser uma tradição cultural, é também uma das primeiras escolas de Educação Ambiental do Brasil. Se você for ver, desde o início do século XX, que essa tradição vem trazendo em suas manifestações o olhar sobre o meio ambiente. Na minha concepção, o Pássaro Junino é um programa de educação ambiental”, acredita.
Escola de brincantes com anos de tradição
Tem Tem: Inês Ribeiro e Olinda Charone |
É o caso do Tem Tem, Pássaro Junino que também se apresentou no mesmo dia, no finalzinho de junho, na Sala Vicente Salles, no Memorial dos Povos, fechando a programação junina realizada pela Prefeitura de Belém. Não tenho aqui toda a ficha técnica mas posso citar as professoras, atrizes e diretoras Inês Ribeiro e a Olinda Charone, que pesquisa o Pássaro Junino, enxergando-o também como uma escola formadora de brincantes.
“O povo do teatro trouxe novidades e nova roupagem aos dramas, e foram muito bem aceitos pela nossa comunidade do Guamá”, diz Mariusa Amaral, guardiã do Tem Tem, emocionada, lembrando sua mãe, Dona Raimunda Amaral, falecida recentemente. “Ela esteve por 25 anos à frente do Pássaro”, comenta a filha que recebeu dela a missão de manter viva uma tradição que está na família há 94 anos.
Revoadas de Pássaros
Suindara, a nossa Rasga Mortalha |
O tema trazido pelo grupo foi "Tragédia no Seringal", ambientada na Amazônia da Belle Époque. E por aí vai! O Teatro de Pássaro segue essencial, educando e encantando novas gerações. É preciso, porém, um olhar mais cuidadoso, política pública e espaços de apresentação.
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