21.7.18

Nos Bastidores do Suspense com Alfred Hitchcock

Estava em casa curtindo o Dia Mundial do Rock, quando chega e-mail confirmando uma agenda na capital paulista, na semana seguinte, um encontro de trabalho que há um mês me deixava no maior suspense. Coincidência ou não, dobrei a comemoração, afinal a curta viagem me levaria também aos bastidores de filmes e da personalidade de um ídolo, nada menos que o mestre Alfred Hitchcock.

A exposição, no Museu da Imagem e do Som de São Paulo, abriu na sexta-feira, 13 de julho, um mês antes da data de nascimento do diretor britânico. E na quinta-feira, dia 18, lá estava eu, às 15h30, depois de uma ótima reunião, e sensação de missão de cumprida, entrando na fila para comprar o meu ingresso e mergulhar nas profundezas da arte hitchcockiana.  Foi a viagem rápida mais produtiva da minha história recente. O melhor foi poder fotografar tudo que quis da exposição. E o que fazer com tanta liberadade? Mais de 800 clics (risos). 

Interativa, com curadoria de André Sturn, ex-diretor do MIS-SP e atual Secretário de Cultura de São Paulo, a mostra “Hitchcock - Bastidores do Suspense” te transporta para atmosfera e universo enigmático do diretor britânico, mestre do gênero.  O processo criativo de Hitchcock é revelado por meio de fotografias, quadros, objetos de cena de filmes, figurinos, manuscritos, storyboards, croquis, matérias de jornais e revistas, além de cartazes de grandes filmes do cineasta que foram criados em diversos países. 

O cinema de Alfred Hitchock  traz contribuições técnicas e estéticas precursoras para o estudo da sétima arte. Autor de 53 longas, produzidos ao longo de mais de 45 anos de carreira, ele era cuidadoso com tudo. 

O processo criativo de Hitchcock é revelado por meio de fotografias, quadros, objetos de cena de filmes, figurinos, manuscritos, storyboards, croquis, matérias de jornais e revistas.  A exposição também é cheia de cartazes de grandes filmes do cineasta. Há cartazes raros de filmes exibidos em diversos países, um deles é o cartaz japonês de Intriga Internacional. 

Ele dizia que filmar era passar o roteiro pela câmera.  Em várias das fotografias da exposição, publicadas mundo a fora, o vemos na célebre pose com as mãos fazendo um enquadramento, como que estudando o que a câmera deveria revelar. Em outras ele carinhosamente conversando com as atrizes e atores, como se com cuidado estivesse extraindo o melhor de cada um, sem que eles perdessem a própria autoria. Aliás, reparem que as mulheres de seus filmes imprimem muita personalidade. Cada detalhe em sua obra tem função narrativa.

Em preto e branco para não assustar

É famosa a história de como ele resolveu o sangue de cena que escorreu com a água do chuveiro, em Psicose. Após uma série de tentativas, ele optou pelo chocolate em calda que de cor marrom, deu densidade e veracidade ao ser traduzida como sangue para a película, mas não assustou com seu vermelho macabro, como o diretor não queria. Por isso escolheu em fazer o filme em preto e branco. Uma das narradoras dessa história é a atriz Janet Leigh, que viveu Marion Crane, que é cruelmente assassinada por Norman Bates, enquanto toma uma ducha no banheiro.

A entrevista com ela pode ser vista na exposição, assim como inúmeras outras, além de trechos de documentários que abordam a trajetória de vida e os filmes de Hitchcock. Em um deles sobressai a história da música de Psicose, feita com uma orquestra só de cordas. Os sons cortantes produzidos pelos violinos ficaram imortalizados. Escrita por Bernard Herrmann (1911 – 1975), a partitura manuscrita da música e autografada pelo compositor, aliás, foi a leilão, em Londres, em 2009, mas podemos ouvir cada movimento aqui. Isso é muito assustador.

O material audiovisual da exposição é extenso. Além de entrevistas e documentários, 17 de seus filmes são enfatizados e aproximam a gente dos bastidores de grandes filmes como “O Estrangulador de Loiras”,  “A Dama (Mulher) Oculta”, as duas versões de “O Espião Que Sabia Demais”, que inspirou mais tarde a criação de James Bond e “A Sombra de Uma Dúvida”, parceria surrealista dele com Salvador Dalí. Também compõe a mostra, “Quando Explode o Coração”, “Festim Diabólico”, “Janela Indiscreta”, “Ladrão de Casaca”, “Um Corpo que Cai”, “O Homem Errado”, “Intriga Internacional”, “Os Pássaros”, “Marnie”, “Disque M para Matar”, “Psicose” e “Blackmail, Chantagem e Confissão”; Este último, de 1929, foi o 1º longa metragem do cinema falado da Grã-Bretanha. Hitchcock tinha apenas 30 anos. Exercício de suspense, conteúdo psicológico, narrativa tensa e moderna. Ele é gênio.

Abra a porta e surpreenda-se!

Antes de adentrar no corredor em que está a linha do tempo de vida e filmografia do diretor você tem que fazer um pacto com ele. “Entre por sua conta e risco”, avisa uma placa na porta. E não há arrependimento.  O material audiovisual é extenso organizado em cerca de 20 salas em que você pode entrar e experimentar inúmeras facetas do suspense. Em uma bifurcação, por exemplo, duas portas a sua frente. Escola por onde começar. Uma leva a projeção de uma cena de Disque M para Matar. Na sala, em cima de uma mesa, o mesmo telefone que toca na cena, pode ser atendido do lado de cá. Suspiros, um grito. 

Para Hithckcok, porém, suspense não é sinônimo de mistério, muito menos de pregar sustos ou fazer jorrar o sangue vermelho na tela. O que o tornou mestre do gênero foi mesmo a habilidade de deixar o espectador num estado de angústia e desconforto a espera do que poderá ocorrer. Assim, na sala de “Sabotagem” (1936) - ou “O Marido era o Culpado”, nome dado em português - ,  a tensão vem materializada em várias gaiolas com diversos despertadores, cujos sons remetem ao de uma bomba prestes a explodir. 

Em uma das gaiolas, um vídeo mostra a longa e angustiante cena que mostra a caminhada do garoto Steve que é encarregado de deixar uns rolos de filmes na estação de metrô em Piccadilly Circus, juntamente com um pacote, que ele inocente, não sabe, mas carrega uma bomba, que é detonada no ônibus ainda ocasionando a morte dele e de outras pessoas.

O glamour também está na exposição, que traz a sala com figurinos e joga luz sobre o trabalho de Edith Head (1897 – 1981), a figurinista que trabalhou com ele em dez filmes, sendo decisiva para a construções de personagens femininos como o Grace Kally em “Marnie - Confissão de uma Ladra" (1954). Os modelos não fugiam a regra de preciosismo do diretor, e eram pensados por Edith para contribuírem com o clima de suspense em torno das histórias.

Em outra sala, você vê um baú, e não fique na dúvida. Abra, lá dentro, a corda de Festim Diabólico está pendurada e você vê o vídeo do estrangulamento da vítima de Farley Granger e John Dall. Nos bastidores de Psicose, além da fachada do (gótico) Bates Motel, a casa de Norman Bates está lá e você pode entrar e descer as escadas. Há uma galeria de facas que também se referem ao clássico.  Copos de leite evocam a cena famosa de Suspeita, de 1941. Há ainda o telhado de Ladrão de Casaca, a torre de “Um Corpo que Cai”, o edifico de “A Janela Indiscreta”.  Não deixe de curtir a sala de “Os Pássaros”. A célebre revoada é de arrepiar e parecem vir direto pra cima de você. 

No final uma pausa para ver Hitchcock na TV.

A última sala é como um convite ao descanso, depois de passar mais de duas horas andando, olhando, lendo, ouvindo, se divertindo e interagindo, sentando na cadeira do diretor ou brincando de bater a sua claquete, você se depara com um sofá na sala de ver TV. 

Na telinha, começam a ser exibidas as aberturas de Hitchcock Presents, uma série de televisão americana antológica apresentada e produzida pelo cineasta. Vi todas, mas não sei se estão lá as apresentações de todos os mais de 200 programas que foram ao ar, sendo o primeiro episódio no dia 2 de outubro de 1955 e o último no dia 26 de junho de 1965. 

Entramos às 16h e saímos 19h30, foram três horas e meia de muita informação e alimento para quem gosta de cinema. Simplesmente amei! Lembrei também da exposição de outro ídolo, David Bowie. Com muita sorte, em 2014, percorri a gigantesca exposição, em duas horas e meia recordes de visita, porque era o último dia quando a fila dobrava e dobrava, mas conseguimos entrar nas últimas horas antes de fechar, ufa, essa vida é mesmo um suspense. E não poderia ter sido mais rock'n'roll.

Para quem pretende ir ver a exposição

A mostra "Hitchcock - Nos Bastidores do Suspense" ficará em cartaz até dia 21 de outubro. No dia 13 de agosto, data de aniversário de nascimento do mestre, a entrada que não é cara (custa R$ 12,00, a inteira, na bilheteria) será franqueada. Em setembro, nos dias de 4 a 9, haverá uma mostra com 20 filmes. 

Não sei o horário, mas no dia da abertura, quando foram exibidos, a partir das 23h, Os Pássaros, Trama Macabra e O Homem Que Sabia Demais, na versão de 1956, a exposição ficou aberta por toda a madrugada também. O  MIS - SP. fica na Av. Europa, 158; 3093-7800. 3ª a 6ª, 10h/21h, sáb., 10h/22h, dom. e fer., 11h/20h. Abre 6ª (13). R$ 6 e R$ 12. Até 21/10.

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