21.3.12

Jorge Bastos lança “Hemorragia” em São Paulo


O livro do poeta e crítico literário Jorge Henrique Bastos, um paraense radicado em São Paulo, traz homenagem a dois nomes ilustres da literatura paraense, o filósofo Benedito Nunes e o escritor Haroldo Maranhão. O lançamento será nesta sexta-feira, 23, a partir das 18h, na Livraria Martins Fontes - Vila Buarque - , na capital paulista. 

Editado pela Reflexão, "Hemorragia" reúne poemas escritos entre 1999 e 2009. Traz textos que refletem as experiências vividas pelo autor, neste período, em Portugal, Espanha e Brasil. É o segundo livro de Jorge Henrique, que já lançou também “A Idade do Sol”. 

Entre outros trabalhos, como editor, em 1994 organizou o livro "A Criação do Mundo Segundo os Índios Ianomami" para a Editora Hiena, além de dirigir uma coleção de ensaios para a editora Pergaminho, onde publicou Paul Valéry, Mathew Arnold e Alexander Blok. Traduziu René Char, Yves Bonnefoy e Ezra Pound.

Nascido em Belém do Pará, Jorge morou em Lisboa, onde foi jornalista no semanário português Expresso e atuou na área editorial. Antes de ir morar na Europa e passar por lá 16 anos seguidos, ele viveu em São Paulo, ligado ao ramo editorial, e em seguida o Rio de Janeiro, onde conheceu Haroldo Maranhão e também Benedito Nunes, que visitava seu amigo constantemente. De Lisboa retornou em 2006, fincando residência em São Paulo. 

Mesmo morando fora do país, Jorge sempre manteve contato com Haroldo e Benedito. Quando escreveu os poemas deste segundo livro, os enviou ao filósofo que não só leu, como lhe devolveu a obra com uma surpresa. 

“Enviei uma cópia do livro para o Benedito ler, pois mantinha contato com ele e com o Haroldo Maranhão, por cartas. Ele leu e para minha surpresa a resposta veio em forma de estudo que ele escreveu sobre o livro”. Completamente inédito, o estudo sairá depois num livro que Victor Pinheiro - estudioso da obra de Benedito Nunes - está organizando e será publicado em Belém pela Secretaria de Cultura do Estado.

Jorge conta que regressou logo depois disso para o Brasil, porém seus compromissos profissionais o impediram de lançar o livro até então. “Mas ele precisava ser publicado, ainda mais porque o Benedito faleceu em 2009. Aproveito e faço uma homenagem a ele e ao Haroldo no livro”, explica o poeta, que foi entrevistado pelo Holofote Virtual e falou mais sobre sua obra e o encontro com os saudosos Benedito Nunes e Haroldo Maranhão.

Jorge Henrique Bastos, em São Paulo
Holofote Virtual: Benedito Nunes faleceu em decorrência de uma hemorragia, aos 81 anos. O título do livro faz alguma alusão a isso?

Jorge Bastos: Não, este título já existia desde Portugal e não faz menção ao filósofo.

Na verdade é uma imagem que trouxe desde a minha juventude em Belém, quando vi uma pessoa acidentada na carroceria de um carro e que me impactou para sempre, mas observa que a ilustração da capa é um quadro do Francis Bacon que deforma tudo.

Isso me fez pensar na vida, no nosso destino, no sentido da morte, e me acompanhou ao longo da vida até a escrita do livro. Hás de ver que há um poema que dá título ao livro, e refere-se um pouco a esse fato distante. Acontece que na origem do meu regresso para o Brasil está o falecimento de um grande amigo meu, Pedro Henrique Bortolon. Como demorei para editar o livro por questões que já expliquei, o Benedito acabou falecendo também. Por isso dedico in memoriam o livro para ele e o Pedro. 

Holofote Virtual: Como foi o processo de trabalho para fazer este livro? 

Jorge Bastos: Minha produção poética é muito lenta. Escrevi meus primeiros poemas em Belém, mas logo em seguida eu mudei para São Paulo, depois Rio de Janeiro, em seguida Lisboa, e regressei definitivamente para o Brasil só em 2006. Ou seja, foi uma longa temporada homérica. Como deve imaginar, essa "deslocalização" contínua, essa deriva, fez-me experimentar muitas coisas, conhecer línguas e literaturas, paisagens e expressões. 

Costumo dizer que procuro atingir uma tensão poética que me leve a escrever o poema após todo um processo estético, emocional. A Emiliy Dickinson afirmou que o verdadeiro poema é como uma "descarga elétrica que atravessa a espinha dorsal". Só os grandes poetas conseguem atingir isso. Na medida do possível, procuro fazer o melhor e exprimir-me da forma mais verdadeira. 

Holofote Virtual: Como você conheceu Benedito Nunes e Haroldo Maranhão? 

Jorge Bastos: Em 1985 mudei para São Paulo, e no ano seguinte a Martins Fontes, editora onde trabalhava, transferiu-me para a filial do Rio de Janeiro, onde conheci o Haroldo Maranhão. Já lera praticamente todos os livros do Haroldo, e nos tornamos muito próximos nesse período, pois eu morava bem perto da sua casa no Aterro do Flamengo. Todas as vezes que o Benedito ia ao Rio, o Haroldo me ligava e saíamos para almoçar, não sem antes o Benedito passar pela livraria e fazer sua razia bibliófila. Fizemos isso várias vezes, e muitas mais conversamos longamente sobre figuras como o Mário Faustino, o Max, etc.

Era muito engraçado, um trio de paraenses atravessando o centro antigo do Rio, contando piadas e rindo discretamente. Tenho muitas saudades desse tempo, do Haroldo, que quando faleceu eu ainda estava em Portugal, e até hoje recordo como a notícia me abalou no meio do verão sufocante lusitano. O resultado está num poema deste livro, o "Pertença". O mesmo aconteceu quando soube do falecimento do Benedito e do Max. Escrevi uma rememoração sobre o Haroldo e sobre o Max que o Elias Pinto teve a amabilidade de publicar no Diário do Pará. 

Holofote Virtual: O que mais te impressiona em Benedito Nunes? 

Jorge Bastos: Quando mudei para Portugal, em 89, levei toda minha biblioteca.

Os livros do Benedito me acompanharam, e acompanharam todo meu desenvolvimento como jornalista, função que assumi por quatro anos após aterrissar em Portugal. O Benedito foi um ser admirável, um ensaísta completo e dos mais estimulantes que surgiu no pensamento brasileiro, e não só. Seus estudos sobre Clarice, Cabral e Guimarães Rosa nortearam minhas indagações. Mas há um livro sobre o qual me debrucei vezes sem conta, o estudo profundíssimo sobre Heidegger, o Passagem para o Poético.

Tenho acompanhado junto ao Victor o seu trabalho de reedição da sua obra. É um trabalho que o Benedito iria se orgulhar. Mas acho que, como paraense, seu amor pela terra, e a decisão de nunca sair de lá (embora viajasse muito) são fatores que todos deveriam saudar.

Holofote Virtual: Quais trabalhos editorias você já realizou? 

Jorge Bastos: São vários livros, de Herberto Helder a O. Henry, traduzido por Fernando Pessoa, antologia da poesia brasileira, o Macunaíma, do Mário de Andrade, obras que publiquei no Brasil e em Portugal. Sem contar o trabalho editorial propriamente dito, e que está nos catálogos de editoras como a Martins/Martins Fontes. Quando voltei para o Brasil, trouxe três inéditos que só agora começo a publicar. 

Holofote Virtual: Como será a divulgação de Hemorragia. Pretende lançá-lo em Belém? 

Jorge Bastos: Ainda não sei se lançarei em Belém, meu trabalho como editor, e num momento que enfrento um novo projeto, não me permitem ausentar-me de Sampa. Mas talvez mais para frente consiga uma surtida relâmpago, até para aproveitar e mostrar meu apoio ao Lúcio Flávio Pinto que está sendo perseguido de forma vil pela justiça paraense.

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