28.4.19

Paulo Nunes e os livros que habitam sua cabeceira

Paulo Nunes
Foto/DOL: Maycon Nunes
O Dia Internacional do Livro foi comemorado em 23 de abril, mas ainda estamos em tempo para falar sobre o prazer de ler um bom livro. O blog publica crônica do professor Paulo Nunes, que mexeu na memória, para tirar do baú ou simplesmente da mesa de cabeceira, uma lista de  livros importantes da literatura brasileira e que marcam sua trajetória. Dicas preciosas! 

Professor da Universidade da Amazônia e autor de, entre outros livros, Traço-Oco (Penalux), seminfinalista do prêmio Oceanos de Língua Portuguesa, Paulo Nunes tem uma paixão pela literatura, não só enquanto leitura ou criação, mas também como pesquisa.

Acaba de lançar o documentário Geração Peixe Frito, dirigido por ele e pela também professora e jornalista Vânia Torres. O filme é fruto da pesquisa acadêmica de alunos e professores da UNAMA e da UFPA. Realizado com finalidades didáticas, retrata os jovens jornalistas e literatos fundadores da Academia do Peixe Frito, entre eles Dalcídio Jurandir e Bruno de Menezes.

O lançamento foi há um mês na Casa da Linguagem, mas a boa notícia é que vai ter sessão no dia 6 de maio, às 16h, no Cibe Libero Luxardo, com bate papo com Alcione Nascimento, mestre em Comunicação, o escritor Salomão Larêdo e o próprio Paulo Nunes. Fiquem com as dicas preciosas dele, agora, um bom domingo!

Livro, livros de cabeceira - Paulo Nunes 

Livro de cabeceira... engraçado, ideia de que não tinha até agora me ocupado. As escolhas são tantas..  Há quem pense que os livros é que nos escolhem. Será? Como fazer para se decidir por um único livro, um 'de cabeceira’? 

Certa vez, minha neta disse, ‘Vô, você vive numa oficina de livros’. Cléa tinha 6 anos.... Bem, já que me meti nesta enrascada, o jeito é preparar um rol de livros que rondam minha cabeceira nestes 50 e tantos anos.

Começo por Sentimento do Mundo, de Drummond; uma coletânea de desalentos, atual e profunda, escrita pelo poeta mineiro mais universal do mundo. De Itabira a Belém, para uma antologia que me marcou, e me religa com minha ancestralidade: Batuque, de Bruno de Menezes. O preto que Bruno representa é marcadamente amazônida. Salto daí para os anos 80 do século XX para o Altar em Chamas, de Paes Loureiro. Todo belemense devia lê-lo. 

A eles se juntam Eneida e seu Aruanda, manifesto de humanismo socialista, e Menina eu vem de Itaiara, de Lindanor Celin... neste reaprendi um ‘jeito bragantino de ser’. E já que Bragança está em pauta, como não dizer de Maria Lúcia Medeiros e seu Zeus ou a menina e óculos? Sim, me identifico com aquela menina míope que servia as mesas do restaurante de sua mãe, um roteiro de encanto.

Edimilson de Almeida Pereira e seu O Livro de Falas é inesquecível; um grande poeta brasileiro da atualidade, ombro a ombro com Antonio Moura e seu Dez. E se Minas está na pauta, como não falar de Indez, de Bartolomeu Queirós? Uma narrativa que remete a ideia de que em cada um de nós morava uma roça. Do suave ao efetivo que é um soco no patriarcalismo brazuca. Trata-se do Livro de Lilith, de Cida Pedrosa, uma poeta que faz das palavras boas aliadas.

Clássicos? Hum... a Bíblia de Jerusalém (Gênesis, Salmos, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos: textos que mexem com o leitor. No mundo de hoje vale viver sem Dom Quixote, de Cervantes? Quixote e Pança fazem falta. Dostoiévski ou Tosltói? Do velho ao novo mundo: Dalcídio Jurandir e sua importante novelística... como calar-se diante de Chove nos Campos de Cachoeira, aquonarrativa atravessada de personagens perturbadores: Irene, Felícia, dona Amélia, Alfredo, Eutanázio. Nunca mais fui o mesmo depois de ler o Chove. 

E se o assunto são os ‘maravilhamentos’, tem primazia o Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. A passagem em que Riobaldo afirma "Diadorim é a minha neblina..." é epifânico,  encantador. Tem ainda Dois irmãos, de Milton Hatoum (espécie de Esaú e Jacó redivivos, numa Manaus tão pacata quanto tumultuada); D. Casmurro, um Machado tantas vezes relido; e as viagens em Os Lusíadas, de Camões, e n’A Odisseia de Homero. Inês de Castro e Penélope são tão marcantes quanto Capitu; artimanhosas, proativas, sedutoras... 

Mas o ‘livro dos livros’, lido na casa de meus pais, é As Mil e uma Noites. Sherazade, a de artifícios orientais, me fez decidir ‘este é o meu livro de cabeceira’; recomendo, colecionador que sou, as edições da Brasiliense, da Ediouro ou da Cia. das Letras, traduzida por Mustafa Al Harouche, da USP. Toda vez que necessito de entusiasmo, Sherazade vem ao meu ouvido e me sopra uma de suas narrativas. Eu, leitor, não resisto. As noites árabes, ah! Literatura, livro de cabeceira.

(O blog agradece a colaboração do professor Paulo Nunes)

Nenhum comentário: