7.1.15

Solano Star: clima de revival, lata e rock na veia

Discosaoleo: Travessa Campos Sales, 628, porão.
Quem nunca viu uma apresentação dessa banda, que figura entre as mais expressivas do rico cenário rock paraense, anos 1980, que tente ver agora. 20 e tantos anos depois, a Solano Star faz um show singular, nesta quinta-feira, 8, às 19h30, na Discosaoleo, loja de vinil que tem investido em shows de bolso, com no máximo 50 pessoas na plateia. Garantir lugar ao sol não vai ser fácil. O ingresso custa R$ 15,00.

Não foram muitos os neurônios bons que me sobraram após os anos 1980. O nome da banda, inspirado no famoso navio que naufragou no litoral brasileiro, o Solana Star, em 1987, carregado com latas de maconha, é apenas um detalhe na história da banda paraense Solano Star. 

Por isso, recorri à memória de dois integrantes da banda, Cláudio Coimbra, o idealizador, e Clemente Schwartz, o primeiro vocalista, além de consultar também o “polêmico” Decibéis Sob Mangueiras, livro do amigo roqueiro de longas datas também, o jornalista Ismael Machado, para para abrir o bate papo do Holofote Virtual com Cláudio e Clemente. Os dois me concederam relatos incríveis sobre a formação da banda, lembrando aqueles anos loucos que vivemos.

O navio afundou, mas o rock paraense emergiu!
Vendo o cenário musical de hoje, mais profissional, com espaço não só pro rock, e com bandas e artistas reverberando nacionalmente, não se pode imaginar o campo de guerra que já tivemos, naquela outra época, em Belém, e nem estou me referindo ao lendário e fatal Rock 24 Horas, que transformou a Praça Kennedy (hoje Waldemar Henrique) em campo de batalha, nos idos anos 1990, causando um enorme vazio, transformando roqueiro em marginal, e seguindo assim por anos até a retomada em meados dos anos 2000. Mais detalhes sobre isso consultem mesmo no livro do Bill (Ismael Machado). Ainda que o digam polêmico, o livro é um recorte importante da história do rock paraense nos anos 1980.

Quando tudo começou...

“O grupo de rock Solano Star começou precisamente em 1988 (ou seria 1987?), num show no Deodoro de Mendonça a convite do Marcius Cabral, onde estavas lá por sinal!”, me diz Cláudio Coimbra, remexendo a memória, no início da madrugada desta quarta-feira, 7, via Ipad. 

O início de tudo está linkado à Icoaracai, a querida Vila Sorriso, situada a alguns quilômetros de Belém, reduto importante de toda esta cena. Foi lá que, de certa forma, nasceu a Solano, assim como foi onde muitos dos nossos principais roqueiros e atuais astros da música paraense andavam, se reuniam e criavam bandas inacreditáveis. Até hoje há um aboa movimentação por lá  ebandas da anitga, ainda se reencontram, vez em quando, pra tocar.

“Formamos a Solano Star quando eu saí de uma banda, em Icoaraci, que queria revolucionar o mundo com um som pós moderno, enquanto eu queria fazer Rock'n Roll. Juntei o Clemente a um baixista e um baterista de Icoaraci (Xande e Pascoal) e a coisa começou”, continua Coimbra.

Foto histórica (Luciana Medeiros) da 1a apresentação 
da Solano Star (1988, no Colégio Deodoro de Mendonça)
Clemente Schwartz conta a mesma coisa, com mais detalhes: Cláudio já havia tocado no Nó Cego e numa outra banda de Icoaraci (do Bill, o Ismael Machado, na tal banda que queria mudar o mundo), mas que o guitarrista estava mesmo era a fim de formar a dele, com a proposta que ele queria: puro rock´n´roll.

“Após me apresentar as primeiras músicas, dentre elas, a “Pirado rock”, que vai rolar neste primeiro último show, o Cláudio me convidou para ser o vocalista, uma vez que, a essa altura eu havia estreado como cantor de banda rock, no Nó Cego, substituindo interinamente o Sérgio Darwich, que tinha ido fazer um curso em Recife”, conta Clemente, o Cleo. Os ensaios começaram, portanto, em Icoaraci, como também conta Ismael no livro. 

“Ensaiávamos num barracão da casa de nosso amigo Getúlio, cuja família nos aturou durante um bom tempo fazendo barulho, naquele quintal. A guitarra do Cláudio era uma coisa tosca e eu a chamava de “pau elétrico”. Eu não tinha microfone e cantava com um que tanto fazia ser eu cantando ou o Cauby Peixoto, a desgraça seria a mesma. A parte mais prática é que o local de ensaio era pertíssimo do final da linha de ônibus, o que nos garantia uma volta todos sentados. Nesta época, eu e Cláudio tocávamos com o Pascoal no baixo e o Alexandre na bateria, ambos de Icoaraci”, lembra o vocalista.

“Entre 1988 para 1990, Pascoal e Alexandre, mais entusiasmados com as bandas deles, foram se desanimando com a gente e então recorremos ao Rodolfo Klautau para a batera, e o Toni Soares, que queria tanto participar da banda, se dispondo a aprender a tocar baixo. Só que até que isto acontecesse, vários baixistas, inclusive nosso querido Claudio Darwich, e bateristas como Mauro Farias, passaram pela Solano Star”, continua.

Ensaio na Discosaoleo, sem Clemente ainda
Clemente saiu da banda logo depois, em 1990 , para fazer carreira-solo, cantando no Clube do Blues, fazendo shows pela noite com o Renato Torres, Ulisses Moreira, Rubens Stanislaw. 

“Hoje canto até no carnaval de Bragança. Acabei de confirmar minha presença, com Olivar Barreto e Alba Maria, com o Trio Balancê, na Segunda Feira Gorda no Largo de São Benedito. Depois da minha saída, Marianinho assumiu o vocal. Com a tomada de rumo de cada um, a banda se desfez naturalmente”, busca no fundo do baú.

O último show valendo da Solano Star, segundo Coimbra, foi em 1995, no saudoso bar Go Fish, que tinha a frente entre os sócios, a jornalista e hoje presidente da Funtelpa, Adelaide Oliveira. Noites memoráveis, aliás, naquele lgar cheio de bibelôs. A presença marcante da banda no cenário também rendeu três troféus Edgar Proença, em 1993.

Entre os melhores shows já realizados pela Solano Star, figuram, na opinião de Cláudio, o que foi realizado no Teatro Waldemar Henrique, em 1990, os das três edições do Rock 24h, e o da Estação Verão, em 1991, em Salinas, quando a banda abriu o show do Barão Vermelho, uma influência mais do que clara da Solano Star, que nasce sob a égide do bom e velho rock`n roll. Felizmente eu estive em todos!

Os anos se passaram e depois da banda, cada um tomou seu rumo. Clemente é correspondente do Diário do Pará, em Bragança, onde mora e tem um jornalzinho quinzenal sobre o município. Cláudio Coimbra é geólogo, em Brismane, na Austrália; Rodolfo Klautau tem uma pousada na Ilha Grande (RJ). O Jonas, bem, ninguém dizer ao certo, mas acho que foi morar em Brasília. Antes integrou a banda Tribo, depois Epadu, entre Belém e o DF.

Ana Clara, Toni Soares, Rui Paiva, Sonia Nascimento 
e Cláudio Darwich - mais do que convidados especiais!
A Solano Star ainda voltou a se encontrar nos anos 2000, em um show na Mystical na boate do André Kaveira. 

Na Discosaoleo

Depois disso, só mesmo amanhã (08). Chamado de primeiro último, o show  na Discosaoleo terá participações da cantora Sônia Nascimento, que já gravou música do Solano Star e do músico Toni Soares, que já passou pela banda, além de Ana Clara Matos, representando, ali, a nova geração da música paraense. 

O baixo será assumido por Cláudio Darwich (Nó Cego) e a bateria, por Rui Paiva (Álib de Orfeu). No repertório estarão, sem dúvida, as emblemáticas, “Meu Amor Brigou Comigo” e “Punk de Nada”, que até hoje rolam de vez em quando na rádio Cultura. As duas canções e outras da época foram gravadas numa demo K7, lançada no início dos anos 1990 e que hoje podem ser ouvidas no soundcloud da banda: https://soundcloud.com/solano-star. Trilha que ontem só me ajudou a imergir, ontem, nos velhos tempos e que rendeu o papo que vocês conferem a seguir. Com a palavra, Cláudio Coimbra e Clemente Scwhartz.

ENTREVISTA

Memória do rock paraense e outras boas histórias

Solano Star (1990). Foto do acervo de Cláudio Coimbra
Holofote Virtual: O show desta quinta está mexendo um tanto com nossos corações de eternos adolescentes. O que vocês lembram daquela época?

Cláudio Coimbra: Lembro de uma cena efervescendo na cidade. A gente se relacionava com outras bandas e músicos. Conhecia artistas plásticos, atores de teatro. É sempre vinham várias ideias bacanas de todos os lados. Mas também tinha uma certa disputa suja, vindo de algumas bandas, jornalistas e pessoas ligadas ao meio musical. Acho que isso ajudou um pouco a atrapalhar a carreira de muita gente boa na época.

Clemente Schwartz: O mais fantástico de tudo era o movimento no Teatro Waldemar Henrique. Nós fazíamos o monopólio das pautas (risos). Na véspera da abertura das pautas para o semestre, estávamos nós no Bar do Parque para amanhecer já a caminho do Waldemar Henrique. Resultado: pegávamos todas as datas e uma ou duas bandas abriam para as outras, o que proporcionava uma ciranda roqueira de-li-ci-o-sa. É claro que todos os outros segmentos de manifestações artísticas têm toda razão em ficar com ódio do que fazíamos, porque não sobrava pauta para ninguém. Mas se não fosse essa fissura, jamais teria havido aquele movimento.

Banda original, com Cláudio, Marianinho, Rodolfo e Jonas
Holofote Virtual: Pelo jeito esse navio não afundou de vez, né ? Voltou para fazer o último show, a despedida oficial que nunca houve, é isso? Um revival?

Clemente Schwartz: A Solano não naufragou, ficou à deriva, foi indo, foi indo... até que deu uma encalhada num porto seguro e ficou quietinho. Acho que enquanto o Cláudio Coimbra estiver vivo, o Solano Star sempre estará também, o problema é que agora, na idade adulta, os afazeres nos impedem de nos ver. 

Cláudio Coimbra: Na verdade, o Solano Star sempre seguiu de alguma forma, enquanto eu estivesse compondo e expressando essas musicas em algum meio (no Soundcloud, por exemplo, há musicas de 2012 a 2014, novas e gravadas em Estúdio). Mas é muito complicado fazer isso com a distância entre nós e, principalmente, sem estar junto a um público fisicamente. Afinal isso é Rock'n roll.... Então eu sempre sonhei em estar de volta, tocando, divulgando. E Belém sempre foi o porto seguro desse navio.... Agora a curiosidade é saber como será esse reencontro depois de tantos anos, com diferentes gerações que jamais nos viram ao vivo...

Holofote Virtual: A banda não está completa.  Rodolfo não veio. Falem dessa configuração que vai estar na Discosaoleo.

Cláudio Coimbra: Infelizmente Rodolfo está atarefado no trabalho dele e não pode vir. Mas vamos com o Rui Paiva, que viveu essa coisa do rock daquela época conosco. O Cláudio Darwich também foi uma pessoa muito envolvida musicalmente comigo e chegou a fazer show com o Solano. O Clemente foi o nosso primeiro vocalista, e marcou uma época no Solano. Interessante que ele marcou demais a banda mesmo tendo tocado conosco por um curto espaço de tempo relativamente. Mas sempre esteve também envolvido conosco em relação a curtir som, ter ideias, etc.

Cláudio Coimbra e Toni Soares (acervo do Claudio Coimbra)
Holofote Virtual: E nesse hiato de espaço e tempo, vocês estão ensaiando como? No reper’torio vão ter músicas novas?

Clemente Schwartz: Tenho ensaiado aqui em casa, em Bragança, sozinho, ouvindo gravações e cantando junto. Escolhemos 12 músicas no total. Umas, bem dos primórdios; outras, dos tempos em que o Marianinho fazia o vocal e eu só vim conhecê-las depois, em 2007, quando participei de uma gravação com Cláudio, Rodolfo e Jonas, em Brasília-DF; e mais duas que o Cláudio fez recentemente, ambas em inglês, em parceria com um letrista londrino. Além disso, o Toni vai fazer participação cantando “Tome Nota”, composição do Cláudio Coimbra com o Torquato Neto (uma letra do Torquato que o Coimbra musicou) e o Toni gravou. É uma pena, mas, não dá para tocar tudo que a gente tem vontade.

Cláudio Coimbra: Estamos ensaiando na loja do Leo. É uma coisa meio "tiro curto", porque serão pouquíssimos e curtos ensaios, já que tenho muito pouco tempo aqui no Brasil, e cheio de compromissos familiares. Então estamos montando primeiramente as músicas pra que o Clemente e os convidados possam, nos últimos ensaios, chegar pra cantar com tudo pronto. O repertório, pela familiaridade dos músicos com as músicas, privilegia as da antiga, mas vamos tentar incluir algumas musicas desse período 2012-2014.

Clemente Schwartz (Bruno Pellerin)
Holofote Virtual: Cena rock Brasil x Pará... Comentem...

Cláudio Coimbra: Tenho visto, hoje, muito mais espaço, muito mais organização e também um novo formato de trabalho com a acessibilidade a equipamentos e divulgação em mídias sociais. Isso é bacana. Você vê algumas músicas de artistas locais no Soundcloud e até no Spotify, como o Delinquentes, por exemplo. Quanto ao Solano, hoje eu não tenho mais a vontade e nem a disponibilidade de correr atrás de buscar espaço pra banda, mas de divulgar a minha arte, então eu estou satisfeito de poder completar o ciclo de produzir, gravar, divulgar e tocar. Por isso esse show está sendo importante pra mim, que não toco ao vivo há anos com o Solano.

Clemente Schwartz: Acho que cena do rock nunca esteve tão robusta, bem diferente dos primórdios do Solano e do Nó Cego, final dos anos 80, quando havia muitas bandas bacanas, mas a produção deixava muito a desejar. Sou fã incondicional dos meninos do Se Rasgum, mais até do que de qualquer banda local. Acho que eles fazem uma diferença enorme em Belém, tanto para quem gosta do Tom Zé, do Cachorro Grande ou do Macalé. 

Há uma música do Solano Star que se chama “Dias de sol”, de autoria do Marianinho e do Cláudio Coimbra, que eles fizeram logo após o quebra-quebra do Festival 24 Horas, que a letra vislumbra que haja um novo tempo para o rock paraense uma vez que após o corrido todas as portas iriam se fechar para as bandas locais.

Quando Cláudio me apresentou este roquinho em Brasília, e me explicou o motivo da letra, eu de supetão, falei que ele podia ficar tranquilo, pois o sol já havia brilhado mais uma vez para o rock paraense, e então contei os feitos dos meninos dos Se Rasgum, realizando festas quinzenais com bandas ao vivo, no Café com Arte e ainda por cima o festival anual. O Cláudio ficou maravilhado com o que contei para ele, que nem conhece os integrantes. 

Cláudio Coimbra
Holofote Virtual: Legal tocar numa loja de vinil, né? (risos)

Cláudio Coimbra: Fantástico! Além de ser uma loja de vinil, é na Cidade Velha, num ambiente "vintage" e na casa de duas pessoas fantásticas (Leo e Sergio), onde se respira musica! Estamos adorando!

Clemente Schwartz: Bem, eu sou dependente químico de vinil (risos).

Holofote Virtual: Com certeza vão aparecer uns e outros personagens ali. Vamos ver a força do rock paraense anos 1980 se rematerializar?

Cláudio Coimbra: Acredito que não. Não temos essa força mais. Mas espero ver diferentes gerações. Umas curtindo uma época e outras conhecendo um testemunho do que era o rock daqueles tempos. Vai ser pra mim uma celebração! 

Clemente Schwartz: Eu espero, pelo amor de Deus, que o Carlos Ruffeil apareça para nos ver (risso)!

Holofote Virtual: Cláudio Coimbra, ficas até quando em Belém? Como assim fostes parar na Austrália?

Cláudio Coimbra: Toco na quinta-feira e volto pra Austrália no dia seguinte. Por ser geólogo, tive um convite em 2007 pra gerenciar uma mina de níquel e passar 2 anos por lá. Já se vão 8 anos, e das 4 maiores mineradoras do mundo eu trabalhei em todas. Aprendi a amar a Austrália e sou cidadão australiano hoje em dia. Em termos de som, amo tomar café na mina ouvindo Led, Stones, ACDC, Aerosmith no rádio. E toco numa banda de rock na mina, covers de Creedence, Stones, Eagles, etc. É muito bacana, e recomendo a todos fazerem uma "trip downunder".

Um comentário:

Anônimo disse...

Super legal a matéria,pois além de gostar da banda,sou amigo dos integrantes,desde já confirmo mha. presença e mando um grd. abç. aos queridos Cléo,Claudio Coimbra,Claudio darwich, tenho certeza q vai ser um sucesso total, e o local vai ser pequeno pra tantos fãs....!!!