4.11.10

Amazônia Doc abre debate sobre o real e o ficcional no documentário

Jean Claude Bernadet, Vitor Lopes, Otto Guerra entre outras celebridades estiveram na abertura do festival, que também contou com presença massiva do público

O clima na abertura do Amazônia Doc – Festival Pan Amazônico de Cinema, na noite desta última quarta-feira, 03, foi contemplado por uma platéia ávida e interessada. As cadeiras, todas ocupadas pelo público não deixaram dúvidas de que o documentário, hoje, no Brasil, tem alcançado e formado novas platéias, graças a sua reinvenção, aos novos incentivos e a uma longa e incansável discussão, uma delas, mote desta segunda edição do festival, sobre o que é o real e ficção no cinema documental brasileiro e aqui, mais especificamente, na Amazônia.

O visual glamouroso à entrada do cinema mais antigo em funcionamento ininterrupto no país deixou muita gente na dúvida se era por ali mesmo que se chegava ao interior do Cine Olympia, na Praça da República, em Belém do Pará, e onde, nos próximos dias o cinema retoma seu lugar de encontro, de entretenimento, de grandes discussões e descobertas.

Até dia 14 de novembro, mostras, oficinas e debates estarão contaminando a cidade, no bom sentido, espalhando-se ainda pelo Instituto de Artes do Pará e Cine Líbero Luxardo do Centur. Veja a programação e participe.

A sessão especial de abertura exibiu o longa "Viajo porque preciso, volto porque te amo" (premiére 66º Festival Internacional de Veneza, prêmios de Melhor Direção e Melhor Fotografia no Festival do Rio 2009 e Prêmio do Júri de Melhor Filme no 12º Festival de Cinema Brasileiro em Paris), dos pernambucanos Karïm Anouïz e Marcelo Gomes, contando com a presença de Ofir Figueiredo, titular da Produtora Rec, responsável pelo filme e que por sinal, há 15 anos atrás morava aqui em Belém e fazia parte do cenário artístico e de criação que movimentou a cidade nos anos 80.

Após a cerimônia conduzida pela jornalista e documentarista, uma apaixonada confessa pela sétima arte, Úrsula Vidal, e com falas da produtora executiva do festival, Zienhe Castro, do secretário de cultura Cincinato Marques Jr. e do produtor Ofir Figueredo, o coquetel foi servido, deixando que cineastas e público interagissem. No hall do Olympia, entre outros, foi possível conversar com Jean Claude Bernadet, Victor Lopes e Otto Guerra, além de Ofir, quatro dos inúmeros outros convidados do festival.

Ofir contou um pouco sobre a construção narrativa de “Viajo porque preciso..”, em que as imagens do filme são reais enquanto o texto é ficcional. “Além dos dois meses de viagem pelos estados do Ceará, Bahia, Pernambuco, Paraíba e Alagoas, utilizamos imagens que ficaram arquivadas por 8 anos”, disse.

O filme conta a história de um geólogo, o Zé Renato que enquanto percorre longas estradas no nordeste observa a vida das pessoas e repensa o amor. “Os nomes são ficcionais, mas as meninas são prostitutas de estrada”, disse dando um exemplo.

“Esse filme começou sua viagem como um curta ainda em 1999. A produtora, que já tem 13 anos, começou fazendo cinema, só que antes de concretizarmos este filme, o Marcelo Gomes e Karïm Anouïz já tinham feito, respectivamente, “Cinema, Aspirinas e Urubus”e “O Céu de Suely” e daí percebemos que tínhamos muitas imagens de cunho antropológico e humano que poderiam complementar o que queríamos fazer”, finalizou.

Enquanto isso, mais ao lado, surge uma crítica e ela vem de Jean Claude Bernadet que me falou sobre o filme de abertura. Para ele, este é um filme de expectativas para o público e por isso mesmo deve dizer a que veio o festival.

“Hoje foi a estréia e o primeiro filme não tem nada haver com a Amazônia, então acho que há uma necessidade de focar mais a perspectiva que o festival quer ter e como dura poucos dias ele deve deixar mais claro as suas opções estéticas e políticas”, crivou.

Jean Claude Bernadet, sempre crítico
O teórico de cinema, crítico cinematográfico, cineasta e escritor, porém, diz que gosta de “Viajo porque preciso...”. “É um filme magnífico mas não tem nada haver com tinha sido colocado como perspectiva do festival, filmes de um panorama amazônico”, repetiu.

Ele chama atenção disso com a intenção de que o foco e o espaço não se perca. “As falas que precederam a projeção abordam um festival Pan Amazônico e é muito interessante porque é um festival muito diferente do de Manaus, que é um festival muito caro, então este é um festival cultural voltado para a Amazônia”, ressalta.

Jean Claude será a estrela de uma das programações paralelas do Amazônia Doc, onde ele exibirá seus filmes para falar sobre montagem de documentário.

Vitor Lopes, português naturalizado brasileiro, radicado em São Paulo e quase um paraense de tantas participações suas aqui neste cenário cinematográfico pensa diferente.

“Este ano abrimos para um recorte”, disse ele que participou da organização também no ano passado. Ele concorda com a opinião de Jean, a acha pertinente, mas chama atenção para o foco da discussão deste festival que é o limite entre o ficcional e real no documentário brasileiro.

Vitor Lopes, com o público
“A Mostra Pan Amazônica traz filmes de temas daqui, mas são filmes daqui com narrativas diferentes e alguns de projeção internacional, como um filme boliviano que será exibio e que é uma ficção de arte, mas com narrativa pan amazônica. Neste sentido, acho que o filme de abertura representou muito bem a essência do festival. Concordo que a temática dele não seja Pan Amazônica, mas o território narrativo e cinematográfico entre o documentário e a ficção foi bem contemplado”, disse Vitor que é curador da Mostra Pan Amazônica.

Além da curadoria, Vitor participa do seminário que está acontecendo das 15h às 18h no Cine Líbero Luxardo, onde vai falar sobre o cinema latino no mundo. No ano que vem, ele deve participar como realizador. “Meu documentário Serra Pelada fica pronto no início de 2011 e vai vir pra cá, já está prometido e quem sabe será o filme de abertura”, brinca.

Outro convidado que não é novidade em Belém, embora sua presença aqui seja rara, é Otto Guerra, o cara que fez “Wood & Stock - Sexo, Orégano e Rock`n Roll”, uma animação inspirada nos quadrinhos da Revista Chiclete com Banana, coqueluche inventada pelo cartunista Angeli nos anos 80/90.

Otto, à extrema direita
Ele veio ministrar a oficina de animação para documentário. “Isso não é uma onda tão nova. O casamento entre o documentário e a animação já tem 100 anos”, diz bem humorado na frente do cine Olympia, já de saída, mas concorda, “há um novo boom nisso, com certeza”.

Então tá. Agora tenho que correr para não perder o segundo tempo de outra oficina interessante do festival: Roteiro e direção para documentário. Bye!



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