Iniciado em 09 de agosto em Guajará Mirim, município rondoniense e com escala final dia 25 de agosto, em Pimenteiras d’0este, também em Rondônia, o Festival de Artes Integradas-Festcineamazonia Itinerante visitou esta semana a primeira das duas comunidades de descendentes quilombolas alcançadas pelo festival nesta edição pelo Vale do Guaporé.
Por Isamel Machado
De Rondônia
Com 16 anos, Conceição sonha ser médica. Com 58 anos, Armando cultiva
uma barba branca tão ‘preta’, como diria a música dos Secos e Molhados
e apenas espera vender bem a produção de farinha. Aos dois anos,
Jonatas só balbucia as primeiras palavras repousado no colo da mãe
Líbia da Silva, 28 anos.
São três gerações criadas na comunidade de remanescentes quilombolas
de Santo Antonio, às margens do rio Guaporé, distante 700 km de Porto
Velho, em Rondônia. Se tem sonhos ou expectativas diferentes de vida,
na noite de domingo, 18 de agosto, compartilharam o mesmo riso e os
mesmos aplausos durante as apresentações do Festival de Artes
Integradas-Festcineamazonia Itinerante.
Santo
Antonio é um pequeno agrupamento de sete famílias e menos de 50
pessoas. A origem, mais de 200 anos atrás, remonta ao período da
escravidão brasileira.
“Meu bisavô foi escravo”, diz Armando Evangelista Carvalho. O mais
velho morador atual da comunidade lembra o período de criança em que
energia elétrica era artigo nunca sequer imaginado. E ainda se espanta
com a chegada do Festcine. “Eu vejo isso como fantástico”, diz.
A comunidade tem apenas 13 casas. A maioria de madeira e telhado de
palha. Sobrevive da produção de farinha, vendida em algumas
localidades e municípios próximos, por 200 reais a saca. Instalada em
uma reserva biológica acaba por enfrentar algumas contradições.
Não
pode, por exemplo, ter criações de animais, como porcos e gado. Mesmo
com o título de comunidade quilombola, não há o definitivo registro de
terras fornecido pelo Incra. Uma luta complicada e desigual.
“Temos problemas em relação à Saúde e a energia”, diz Andrade Calazâ,
29 anos, o líder da comunidade. Santo Antonio recebe apenas 400 litros
de óleo diesel para abastecer o motor que gera a luz elétrica.
Insuficiente e que precisa ser regrado para durar o mês inteiro.
A escola vai até o fundamental, mas há também o curso modular para
jovens e adultos.
As irmãs Conceição, 16 anos e Aline, 19, cursam o
sétimo ano. Querem mais. Conceição, cursar medicina. Aline, direito.
Sabem que é um desafio para quem mora em Santo Antonio, onde celular é
algo que não existe e a comunicação é feita apenas com um telefone
público que atende a todos.
Mas a televisão é presente. É isso que faz com que adolescentes como
Marciano, 19 anos, use brincos nas duas orelhas e corte o cabelo
estilo moicano disseminado pelo jogador de futebol Neymar.
Às 19 horas, todas essas histórias e contradições postaram-se à frente
da grande tela montada no terreiro maior da comunidade.
Um ‘fumacê’
espantou os mosquitos, dando uma pequena trégua a todos.
Bado cantou ‘Raça’, uma composição cujo tema coincidia com o momento e
o local.
O escritor português José Luís Peixoto foi surpreendido com
uma homenagem feita por um morador, o senhor ‘Cidão’, que recitou uma
poesia inspirada na presença do poeta na comunidade.
A apresentação mais inusitada do dia, no entanto, foi a do palhaço
Martinez.
O terreno acidentado dificultou o equilíbrio no momento mais
difícil, o do malabarismo com facas em cima de um largo pedaço de
cano. E a timidez das crianças fez com que apenas um adolescente
aceitasse participar de uma parte do espetáculo. A noite foi
encerrada com a exibição de filmes.
O Festival de Artes Integradas - Festcineamazônia Itinerante 2013 tem
o patrocínio do BNDES, Governo Federal através da Lei Rouanet,
Ministério da Cultura, Secretaria do Audiovisual, apoio cultural da
Santo Antônio Energia e Parceria Institucional da Fundação Banco do
Brasil.
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