24.7.21

Entrevista: Gileno Foinquinos e o Voo do Carapanã

Lançado em abril deste ano, “Voo do Carapanã”  traz oito faixas autorais no estilo jazz amazônico. O projeto de gravação foi selecionado pelo edital de música Lei Aldir Blanc-Pa 2020. 

Paraense de Cametá, Gileno Foinquinos é considerado referência da guitarra jazzística. O contato com a música veio cedo, com o violão aos 6 de idade e aos 13 anos já tocava profissionalmente em bandas de baile e com artistas do cenário em Belém. 

Morando em São Paulo há mais de 30 anos, ele já tocou com muita gente da cena paulista e paraense. Já participou de diversos grupos, fez e continua fazendo inúmeras conexões musicais que vão do jazz instrumental à guitarrada, samba, carimbó. 

Há 20 anos ele desenvolve seu trabalho autoral, e atualmente integra a Silibrina, banda paulista com influências do jazz e ritmos da cultura popular brasileira. Voo do Carapanã é seu 8o disco, que conta com participação de músicos de gerações distintas, mas conectadas pela música instrumental, e laços de amizade, como César Augusto “Gugu” (bateria); os jovens e talentoso Wesley Jardim (baixo); Willian Jardim (guitarra), além de Márcio Jardim, Wendel Brandão e Joelson Lopes. A seguir, a entrevista com o músico sobre o álbum, a trajetória e as novidades que estão vindo aí na carreira neste segundo semestre.

Holofote Virtual: Vôo de Carapanã é seu oitavo disco, lançado no início deste ano, com 8 músicas!  Fala sobre as escolhas desse trabalho, desde as composições, ritmos e estilos musicais presentes, parceiras...

Gileno Foinquinos:
Sim é meu 8º disco. É um trabalho totalmente autoral onde desenvolvo minhas influências dos ritmos do Baixo Tocantins como banguê, samba de cacete, carimbó, entre outros. Assim, esse trabalho representa  um verdadeiro amadurecimento musical, pois consegui imprimir nesse trabalho um pouco mais de minha identidade, desenvolver uma linguagem própria e valorizar nossas raízes, transformando esse universo do jazz em sua vertente amazônica.  

Para esse trabalho "Voo do carapanã" ensaiamos em torno de 6 meses em busca de uma nova sonoridade, caminhos sonoros, formas de tocar, dinâmicas diferentes. Nosso resultado foi muito satisfatório em função do respeito e admiração mútuos que rolam entre nós. Assim, a reunião de duas gerações da música instrumental paraense a minha e a do baterista César Augusto (Gugu), quase cinquentões, com dois meninos os irmãos Willian Jardim, 18, e Wesley Jardim, 20, talentos que estão em plena ascensão no cenário musical paraense. 

Holofote Virtual: Você já havia trabalhado com eles de alguma outra forma?

Gileno Foinquinos: Acompanho os irmãos Wesley e William desde que são crianças, sempre frequentaram minha casa em Belém. Eu e o pai deles o Márcio Jardim somos amigo de longas datas, ele gravou meu primeiro CD de música instrumental o "Cacique Camutá", lançado em 1998 aqui em Belém e sempre estamos trabalhando e gravando juntos. 

Trabalhar com eles foi um grande presente pois acompanhar a trajetória deles desde o berço e vê-los tornarem-se grandes pessoas e exímios músicos profissionais não tem preço, só me orgulha e enriquece cada vez mais nossa música.Eles são talentosos refletem a nova geração da música paraense.

Acho muito importante valorizar e reverenciar nossos mestres da música e ao mesmo tempo oportunizar novos talentosos produzidos no Pará, passando conhecimentos, direcionando, fomentando o conhecimento e saberes culturais locais e concebendo a música como chave também de transformação social. Foi com essa concepção inovadora de agregar duas gerações da música e valorização dos ritmos regionais que desenvolvi o Voo do carapanã sob minha direção musical, produzido e gravado em Belém.

Holofote Virtual: A música instrumental paraense, aliás, tem uma história. Desde quando você se interessou por esse tipo de composição?

Foto: Renata Sobral
Gileno Foinquinos: Desde muito cedo inteirei-me pela música instrumental e isso foi graças ao convívio e influência de grandes músicos como Mini Paulo, Sagica, Kzam Gama, Pardal, Tinoco Costa,Dadadá Castro, Nego Nelson, Sebastião Tapajós que inclusive é grande amigo do meu pai. Meu pai (Lucimar Foinquinos), durante um longo período foi músico, guitarrista, e era integrante da banda Os populares de Cametá, isso me influenciou bastante apesar de ele ter tentado me sugerir seguir outros caminhos que não fosse a música... não teve jeito já estava completamente imerso nesse universo.

Nos anos 90, acompanhei o frenesi pelo qual passou a música instrumental paraense onde as praças da cidade ficavam lotadas por conta das várias apresentações que ocorriam pautadas nesse estilo de música. Em 1994, integrei a banda Amazônia Jazz Band e outras bandas de música instrumental muito ativas naquela época, as bandas Pandora e Estado de Espírito, grupos importantes na medida em que incentivaram a propagação da música instrumental pela cidade.

Belém é realmente uma fonte de grandes talentos. É incrível a nossa riqueza e versatilidade cultural, o poder de criação de música em todos os estilos: brega, carimbó,  guitarrada, música popular paraense e nesse caldeirão sonoro temos também a música instrumental. 

Holofote Virtual: Soube que você se inspirou em um estudo sobre o carapanã, para compor a faixa título. É isso? E o que exatamente imprimiu no disco?

Foto: Wesley Jardim

Gileno Foinquinos: Na verdade a ideia quando criei a música Vôo do carapanã que dá nome ao disco foi por que na época estudava muito a peça Voo do Besouro, do compositor russo Nikolai Rimsky-Korsakov, e percebi que era um verdadeiro desafio tocá-la, então inspirei-me nesta obra para criar a versão amazônica do Voo do Besouro. Coloquei esse nome pois sempre gostei da sonoridade dos termos do vocabulário indígena que inclusive uso também para nomear meus outros discos e composições. 

Neste sentido, considero o Voo do carapanã uma composição-desafio pois ao longo de muito tempo venho estudando-a para executá-la com primazia e sem escorregar no dedilhado, ela começa lenta, mas depois termina literalmente voando fazendo alusão ao voo rápido e frenético do carapanã. 

Holofote Virtual: A pandemia trouxe dificuldades e também abriu algumas portas no mundo digital. Como tem sido a difusão do disco, tens feito apresentações? Você acredita que esse ano as coisas melhorem, no que diz respeito ao trabalho presencial dos músicos?

Gileno Foinquinos: Confesso que não era muito adepto do mundo digital mas foi uma porta que se abriu, é fundamental usar as ferramentas digitais, precisamos nos reinventar pois essas alterações no mundo digital e expansão midiática vieram para ficar e são importantes para que o artista divulgue seu trabalho e alcance cada vez mais público.

Aderi aos novos formatos de apresentações musicais nos meios digitais e estou assimilando essa nova forma de fazer música. Entendo que o retorno presencial dos shows vai demorar um pouco mas é importante perceber que a vacinação está avançando e alcançando cada vez mais pessoas, isso nos enche de esperança para que possamos voltar também a fazer shows presenciais e sentir a interação e energia do público. 

Holofote Virtual: Você tocou e ainda toca com grandes músicos, paraenses e também nacionais. E conseguiu se estabelecer fora daqui vivendo de música. Conta um pouco dessa trajetória, o que foi mais difícil e como foi que rolaram os primeiros contatos com esse universo profissional, a partir de São Paulo.

Foto: Divulgação

Gileno Foinquinos: Com certeza foi difícil a inserção no cenário musical paulistano, pois São Paulo tem outra forma de respirar e viver a música é um universo de sonoridades e opções e em um primeiro momento precisamos nos adequar aos vários tipos de trabalhos. Inicialmente tocava em São Paulo com artistas locais como Matogrosso e Matias, Simoninha, Leo Maia... sempre fui de livre escolha, nunca me restringia a tocar somente um estilo musical, fiz algumas gravações com nomes importantes como Roberta Miranda e Roberto Carlos.  

Sabemos que o estilo instrumental não era uma vertente muito comercial então precisava trabalhar em diferentes frentes até me inserir e firmar meu trabalho autoral. Aos poucos fui estabelecendo uma rede de amizades muito importante, conheci  depois grandes nomes da música paulistana como Bocato, Nailor Proveta. Conheci um grande baixista Rubem Farias, aí ele montou um grupo de música instrumental Funk Brasil. 

Depois conheci o grande maestro Josoé Polia que convidou-me para participar da Orquestra de música Afro-brasileira (FILAFRO)  e então não parei mais, pois depois que a gente se insere as pessoas vão nos conhecendo pelo nosso trabalho, profissionalismo e vamos conquistando credibilidade. Atualmente sou guitarrista da Banda Silibrina  comandada pelo pianista Gabriel Nóbrega. Fiquei muito contente com o convite para integrar essa banda que é super respeitada no cenário musical brasileiro, é uma super responsabilidade que requer muita dedicação e uma carga horária de estudos diários.

Holofote Virtual:  Você é de Cametá, terra, por excelência, cultural e diversa, e onde também nasceu Cupijó.  Você costuma se inspirar na região em suas composições?

Foto: Divulgação

Gileno Foinquinos: Sim, o trabalho é completamente voltado para a cultura do Baixo Tocantins, precisamente a cidade de Cametá, minha cidade natal. Eu sempre fiz muitas pesquisas sobre os diversos ritmos de nossa região e agrego elementos do nosso folclore com diversos estilos no nosso Brasil e do mundo, tais como: choro, maxixe, música erudita e jazz e desenvolvo minha identidade e personalidade musical. Verdade. O mestre Cupijó é um dos grandes representantes da cultura de Cametá, inclusive meu pai estudou com ele. Conheci também a obra do mestre Manoel Verdaco o qual me influenciou também. 

Holofote Virtual: Quais os planos para esse segundo semestre, vai ter clipe desse novo trabalho, há uma agenda prevista?

Gileno Foinquinos: O segundo semestre está repleto de projetos. Em setembro já está previsto show de gravação do DVD do Voo do Carapanã no Teatro Waldemar Henrique. Estou desenvolvendo projetos culturais por meio de editais em São Paulo. Inclusive fiz recentemente temporada de música instrumental que está disponível no meu canal do Youtube.

Estou trabalhando em meu novo single chamado Desengano, um zouk, componho em diferentes estilos. Tenho parceria com grandes poetas aqui da cidade de Belém, o Dudu Neves e o Jorge Andrade, participamos com nossas composições de vários festivais de música pelo Brasil. Assim estou sempre na conexão Cametá/Belém/São Paulo, pesquisando, compondo e tocando Brasil afora. 

Para acompanhar as novidades: 

https://www.gilenoguitarra.com.br

Para ver mais:

https://www.youtube.com/watch?v=-uX1lEK9ULg

https://www.youtube.com/watch?v=oZxbpePXPJk

Nenhum comentário: