23.7.13

As “Paisagens Engolidas” de Véronique Isabelle

Paisagens Engolidas
Intitulado “Mergulhar nas águas e trilhar o Porto do Sal, ensaios sobre um percurso etnográfico”, o trabalho de Mestrado em antropologia, de Véronique Isabelle, resultou em uma exposição “Paisagens Engolidas”, que será aberta, só nesta terça, 23, das 11h às 18h, logo depois da artista enfrentar, às 10h, a defesa da tese, também na Casa Rosada, na Cidade Velha. Antes, a canadense conversou com o Holofote Virtual. 

Véronique nasceu em Québec (Canadá), nos anos 1980, mas desde 2008 vive e trabalha em Belém. Chegou aqui à convite do artista plástico Armando Sobral, para participar da exposição “Realidades Transitórias”, na Casa das Onze Janelas, junto com quatro outros artistas quebequenses.

Ficou. E rápido, não só se adaptou, como se inseriu e interage agora em diversos contextos artísticos. Véro, como é chamada pelos amigos, achou seu caminho e estabeleceu um contato real com uma cultura tão diferente da sua. 

O resultado é este. Cinco anos depois, cá está ela defendendo seu trabalho de Mestrado, realizado na Universidade Federal do Pará, sob a orientação do Prof. Dr. Flávio Leonel da Silveira. "A experiência do lugar e o encontro com as pessoas da cidade foram tão marcantes, que decidi morar na cidade, por um tempo indeterminado, a fim de desenvolver novas linhas de pesquisa, no meu trabalho artístico”, diz. 

Encantados
Membro do Coletivo do Atelier do Porto, onde atua artisticamente, além de Mestre em Antropologia Social, Véronique também é Bacharel em Artes Visuais, formada pela Université Laval (Québec) e École Supérieure des Beaux-Arts de Marseille (France). 

Individualmente, expôs as pinturas “Larguer les Amarres” (2005) e “Le quai et l’écho (2008), na Galerie 67, em Québec (Canadá). 

E além exposição coletivas na França, no Brasil e no Canadá, também participou também em belém, das exposições “Paná Paná” (2010), na Galeria Théodoro Braga, “Entre nós” e “Gravura contemporânea no Para”, no CCBEU, e do XXX Salão Arte Pará, como artista convidada. 

Em São Paulo, ano passado, organizou e participou do projeto “Coletiva/Coletivos” reunindo três exposições coletivas e ciclos de conferências. 

A seguir, Véronique, que vai defender o trabalho de mestrado e abrir exposição na bela Casa Rosada, um casarão restaurado pela Alubar, em parceria com a Universidade Federal do Pará, através do Fórum landi, contou mais sobre sua pesquisa.

Véronique em ação, no Atelier do Porto
Holofote Virtual: O que você mostra nesta exposição?

Véronique Isabelle: A exposição reúne trabalhos produzidos no decorrer dos dois anos de pesquisa que realizei no Porto do Sal, onde a arte se apresenta como meio de inserção e imersão em suas paisagens portuárias. 

As obras se apresentam como um conjunto de encontros gravados, inscritos, desenhados, pintados que possuem um caráter documental próprio, testemunham um tempo compartilhado, se configuram como experiência artística singular. Meu olhar estrangeiro proporciona outra perspectiva para abordar essas paisagens. 

Holofote Virtual: O teu olhar estrangeiro te ajuda a ver estas paisagens sob outras perspectivas?

Véronique Isabelle: O olhar estrangeiro examina a realidade com menos preconceitos por ser menos ligado a laços que poderiam prejudicar sua percepção, sua compreensão e sua apreciação das informações que recebe e percebe. Por isso o olhar estrangeiro convida, às vezes, a “re-olhar” o que parece tão familiar ou mesmo despercebido. 

Porto do Sal (Foto: Elaine Arruda)
Pouco a pouco, ao me aproximar das pessoas do Porto do Sal e das suas paisagens, percebi o quanto o lugar é marginalizado por grande parte da população. Na margem da margem. 

Então, realizei um percurso sinuoso que levou meu olhar na busca do que não é visível à primeira vista; meu olhar se prolongou no desenho, na fotografia, nas narrativas, no olhar do Outro e esse olhar se volta sobre ele mesmo, retorna a si dadivoso. 

Meu olhar sobre a estética do Porto do Sal se transformou também ao longo deste percurso e agora, através dessa exposição deixo também emergir imagens ancoradas na poética que é própria ao imaginário relacionado ao Porto do Sal. 

Holofote Virtual: Qual foi e como você fez este percurso? 

Véronique Isabelle: As minhas derivas nas paisagens do Porto do Sal, inscreveram-se num percurso que descrevi com imagens e reflexões a partir das quais retratei o lugar não como ele é, mas como ele se deu a ver para mim. 

Convido aqui o público a mergulhar num conjunto de imagens recolhidas, produzidas e reunidas ao longo da minha experiência singular do campo de pesquisa, de imersão nas paisagens portuárias peculiares de Belém. 

Rock e Luis sentados na ponte (extrato nogueira s/papel, 2012)
Holofote Virtual: Como foi que a tese se tornou exposição?

Véronique Isabelle: Esse mestrado me permitiu criar as condições para que eu pudesse me aproximar desse universo, o Porto do Sal, e a partir daí tentar questioná-lo sob diversas perspectivas. 

A antropologia me permite aprofundar minha compreensão dos lugares e minhas relações com as pessoas e as paisagens e a arte se torna para mim um meio para me engajar nessas novas paisagens, assim como uma ferramenta de pesquisa e um agente relacional. 

Holofote Virtual: Depois deste Mestrado o que você ainda pretende investigar? 

Véronique Isabelle: Sinto a necessidade de desenvolver uma prática que implique cada vez mais uma investigação em contato direto com o mundo, que me possibilite experimentá-lo através do meu trabalho. 

Foi no Brasil que afirmei o desenvolvimento de uma prática artística baseada em experiências de imersão. Sendo assim, este desejo de realizar um trabalho em contato direto com a realidade vivida pelas pessoas, me levou naturalmente a propor reflexões que me aproximaram, pouco a pouco, do campo antropológico. Pretendo continuar a atuar nesta interdisciplinaridade e realizar projetos que me permitam criar novas formas artísticas a partir dessa relação. 

O Atelier do Porto
Holofote Virtual: Você disse que houve uma aproximação marcante com a cidade e as pessoas. Eu te vejo sempre no circuito artístico. Fala um pouco desta relação. 

Véronique Isabelle: Existem pessoas queridas com quem eu trabalho, que me inspiram nas suas produções tanto pessoais quanto sociais. 

Existem alguns a quem chamo “artistas cidadãos”, preocupados em atuar na vida social em diferentes perspectivas a partir da arte, que servem para mim de referência. 

Nomeio aqui por exemplo Armando Sobral, Armando Queiroz, Elaine Arruda, Paula Sampaio e Miguel Chikaoka. Trabalho também no Atelier do Porto e esse projeto de atelier, para mim, é uma maneira de ser e de atuar no mundo. O Atelier do Porto me proporciona essa perspectiva por exemplo de agir diretamente numa determinada realidade. 

Na Ponte Brilhante, aquarela s/papel, 2011
Holofote Virtual: Como você vê a cena atual da cidade? 

Véronique Isabelle: Tem ideias e produções lindas que circulam por ai que estão dialogando diretamente com a realidade rica e peculiar dessa região, acho que o lugar em si, nas suas questões sociais, ambientais e culturais provocam e instigam uma outra maneira de pensar e fazer a arte. 

Além disso, é importante também acompanhar e participar do movimento atual de reivindicação por melhores condições para escoar essa produção artística diversificada. 

Holofote Virtual: Mas a sua exposição é só hoje, mesmo? 

Véronique Isabelle: A exposição, por enquanto, esta marcada somente para o dia 23 de julho. Um dia apenas! Logo depois vou viajar para Québec, no Canadá, rever minha família, meus amigos queridos e pegar um friozinho gostoso!

Um comentário:

Anônimo disse...

Que linda !
Que trabalho lindo !
Se pudesse iria lá na Casa Rosada.
Já conheço parte do trabalho dela e de outros artistas visto no Ateliê do Porto que é uma iniciativa de trabalho coletivo genial .
Marly Silva