23.3.19

Artes cênicas ganha novo fôlego na cena cultural

Saiu o resultado do Edital da Mostra de Teatro Nilza Maria, o 1o lançado pela atual Secretaria de Cultura do Estado do Pará. Dos 54 grupos inscritos, 16 vão compor a programação, que será realizada de 27 a 31 de março no Parque da Residência - Teatro Gasômetro, Coreto e Anfiteatro – e no Teatro Waldemar Henrique, com entrada gratuita, comemorando o Dia Mundial do Teatro. O blog também publica o bate papo feito na semana passada com Adriano Barroso, Diretor de Artes Cênicas da Secult. Ele falou das ações da atual gestão na construção de uma política cultural para as artes cênicas e outras linguagens.

A lista publicada no Diário Oficial do Estado, nesta sexta-feira, 22, trouxe 17 espetáculos selecionados pela comissão formada por gestores da Secult e da Fundação Cultural do Pará, mas apenas 16 foram confirmados pela secretaria, que divulgou a noticia ontem, no final da tarde, pelas redes sociais. O espetáculo que fica de fora é “A Casa do Rio”, do Grupo Gruta, “uma das atrizes, não poderá participar”, informou ontem ao blog, Adriano Barroso, Diretor de Artes Cênicas da Secult.

Ficaram na programação, os espetáculos “Cada qual no Seu Barril”, da Cia. dos Notáveis Clowns; “Mukt Paier – Pés Livres”, de Paulo Roberto Alves, “Um homem sem títulos”, com Leonel Ferreira, da Cia. de Teatro Madalenas, que também entrou com mais um espetáculo na mostra “Marahú”, numa homenagem ao poeta Max Martins.

Também entraram “A Menina que dá com a cara nas paredes”, de Glaucia Pinto; “Solo de Marajó”, do Usina de Teatro, inspirado na obra de Dalcídio Jurandir; “A Mario Quintana com ternura”, de Gilberto Moura de Andrade; “Eu Mulheres”, de Patrícia Passos Nascimento; “Kaique, Internamente”, de Bruno Torres da Silva e “Guerra ao Horror", do Grupo Teatro Variete.

Fio de Pão, um dos espetáculos mais aplaudidos da In Bust
O público vai ver também “Viva o Circo”, da Companhia Foskaluz de Teatro; “A Pena e a Lei”, da Troupe Vira Rumos; “Sorteio de Contos”, com Lucas Alberto da Cunha, da Cia Sorteio de Contos; “Tremilikes, A Bruxa Do Futuro”, de Willian Furtado Souza; o engraçadíssimo “Fio de Pão - A Lenda Da Cobra Norato”, da In Bust – Teatro com Bonecos e “O Jardim de Alice”, do Projeto Camapu, estes dois últimos com trabalhos de atores, bonecos e marionetes.

A Secult espera que esta iniciativa traga de volta a efervescência das mostras de teatro que a cidade já teve na década de 1980, inicio da década de 90.  “Tínhamos um público enorme, os artistas todos se frequentando. Essa foi a ideia inicial para a construção desse edital. A ideia é que todos os anos tenhamos a mostra pra gente voltar a comemorar o Dia Mundial do Teatro”, diz Adriano Barroso, que também é ator e autor de teatro.

Marahú - Cia Madalenas de Teatro 
Uma homenagem à Max Martins
Ano que vem a intenção é lançar outros editais, um edital de fomento, para montagens e circulação, e um edital para quem mantém seu próprio espaço. Adriano explica que, neste caso, envolvendo todas as linguagens. 

“O que foi resistência até o ano passado, a gente quer que se transforme em existência. Temos poucas casas teatrais, ainda mais depois do desmonte que fizeram na politica cultural, separando Fundação Cultural do Pará e Secult, que são duas coisas independentes, mas que dividem a mesma verba para a cultura, então isso foi um crime que aconteceu. A Secult só gerencia o prédio do Teatro Gasômetro e o Theatro da Paz, em termos de espaço”, diz Adriano. 

Durante a Mostra de Teatro Nilza Maria também será lançado um “edital de pautas livres nos espaços da Secult. “Além do Teatro Gasômetro, o Museu do Estado, o Forte do Castelo e o Museu de Arte Sacra também serão palcos para espetáculos de todas as linguagens, não apenas as artes cênicas”, disse Adriano.

Adriano Barroso, em 2013, foi uma das vozes mais ativas no Movimento Chega, que exigia a saída de Paulo Chaves da Secretaria de Cultura. Na época, a classe artística repudiou a política de eventos, em detrimento do incentivo, o descaso com os fazedores de cultura, a falta de diálogo com a secretaria. Hoje, na diretoria de artes cênicas da Secult, ele reconhece que nem sempre querer é poder. Leia o bate papo com ele, que rolou na semana passada, logo após o lançamento do edital Mostra Nilza Maria.

Holofote Virtual: Adriano, o que mais te entusiasmou com o lançamento deste edital da Mostra de Teatro Nilza Maria, uma bela homenagem, aliás!

Adriano Barroso: De uma maneira mais ampla, eu te diria que minha empolgação é que eu tenho mais de 30 anos de carreira, uns 30 de militância, a gente viveu, nesse longo “inverno” que tivemos, um desmonte enorme da outra gestão. Éramos relegados à marginalidade, realmente, porque a gente não conseguia participar de nenhuma discussão, nenhuma conversa, a gente era invisibilizado.

Não competitiva, a Mostra Nilza Maria também será oportunidade para homenagear e entregar troféus. Decidimos premiar 20 pessoas. No dia 31, domingo, vamos fazer uma celebração para entregar uma placa para dona Nilza, agradecendo o empréstimo do nome e sua historia, além de 10 pessoas, por carregarem a bandeira do teatro há um tempo, e mais 10 por manterem seus espaços há pelo menos três anos, e que estão na resistência. Serão 20 prêmios para dizer muito obrigado por terem mantido essa chama acesa. É um troféu, não em dinheiro. E vamos juntos.

Holofote Virtual: De que maneira a Secult pensa em reverter essa situação? 

Adriano Barroso: Acredito nessa nova gestão, com a vinda da Úrsula (Vidal), que é uma pessoa que frequenta e que sempre frequentou os artistas, sempre esteve próxima aos artistas, entendendo os artistas, e que traz esse pensamento de que a gente ainda tem muito que fazer, construir, porque a máquina estava extremamente engessada. 

Precisamos ir tomando os primeiros passos. É um ano ainda atípico, que estamos vivendo com a herança da gestão passada, a gente faz o PPA para o ano que vem. Na verdade, a gente começa a trabalhar valendo no ano que vem. Esse ano eu acho que a ideia fundamental é quebrar esses conceitos de que a secretaria estava de costas para o artista, trazer o artista pra dentro para discutir coisas, chegar perto do artista. Acho que essa nossa função de facilitar o acesso entre o artista e seu publico é o que a gente deve fazer esse ano, mas queremos dar passos muito maiores.

Holofote Virtual: Vocês estão pensando em edital de fomento também e, claro, que chegue para todo o Estado, não só Belém. Como fazer isso dada às dimensões do Estado, como mudar a política de eventos tão criticada também na gestão anterior?

Adriano Barroso: Então, nós somos uma Secretaria Estadual. Estamos há três meses trabalhando. Esse mês, nós vamos fazer as escutas em Santarém, já em abril chegamos a Marabá, vamos integrar essa ideia do Governo Itinerante do Governador Helder Barbalho. 

Temos três sedes do governo. É o que nós queremos fazer mesmo. A nossa missão é fazer uma politica de cultura. Logicamente que estamos fazendo eventos, neste momento, mas essa relação não deverá ser a marca dessa gestão. A gente está fazendo eventos pontuais, que acho que são importantes para construir novamente um diálogo com os artistas, mas, mais do que isso. O artista é nosso meio. Nosso fim é o cidadão. A gente quer chegar com isso no cidadão. 

Holofote Virtual:: Nesta itinerância, como será feita a mobilização junto a produtores e artistas? São realidades diferentes em cada região, como vocês pretendem se instrumentalizar para realizar uma política de cultura que atenda as demandas?

Adriano Barroso: Sim, vivemos realidades muito diferentes. O sudeste do Pará, o Oeste do Pará e a capital são países diferentes, por isso estamos indo para fazer as escutas. Vamos a Santarém, e na verdade na região são 25 municípios. Estamos abrindo as escutas para entender a realidade e o que as pessoas querem.

Holofote Virtual: É preciso fazer esse mapeamento.

Adriano Barroso: Exatamente. A nossa ideia é essa. Ver o que já foi construído, em quatro, oito anos, e que já foi discutido, até na época do PT no governo. Há um mapeamento que foi iniciado, mas ficou engavetado. 

A nossa ideia é beber nestas fontes. E começar a facilitar as coisas. A gente tem hoje uma máquina burocratizada dentro da cultura, e isso é outro trampo que se tem que fazer, que é desburocratizar a cultura. É trampo pra caralho, mas que vamos fazer, queremos deixar esse legado. Facilitar artista e seu publico e a relação com o estado, neste momento, é um trabalho que estamos fazendo, mas vamos avançar.

1a reunião dos Fazedores de Cultura com a SECULT (janeiro)
Foto: Cláudio Ferreira
Holofote Virtual: No início do ano, a secretária Úrsula Vidal, em reunião histórica com os fazedores de cultura, no Teatro Gasômetro, alertou que não há recursos além dos que já comprometidos ainda na gestão passada e que o esforço será enorme para conseguir fazer algo além, ainda este ano. Como está esta situação? 

Adriano Barroso: A gente está revendo toda uma estrutura. Sabemos que o Governo do Estado tinha dois únicos eventos no ano, o Festival de Ópera e a Feira Pan Amazônica do Livro, e mais nada, e zero pra todo mundo e costas pra todo mundo. Então, a gente está revendo essas implicações. Temos dinheiro empenhado para estes dois eventos. Na teoria a gente não poderia nem fazer nada mais, porque só tem recurso pra isso mesmo. A gente conseguiu viabilizar essa mostra graças a um esforço enorme da secretária de pedir um dinheiro pra essas ações. 

Holofote Virtual: São estas as maiores urgências da categoria neste momento?

Adriano Barroso: Esse foi um ponto que discutimos na nossa setorial aqui, que acho que precisa de amadurecimento de todo mundo. Dos grupos, dos artistas, da secretaria de cultura. A Secult não tem que ser paternalista com essas pessoas. 

Precisamos que estejam organizados. Estamos trazendo uma parceria com o Sebrae pra dentro da secult, chamar os artistas para entender a economia criativa dentro da arte. Com o desmonte da cultura, principalmente o teatro, as artes cênicas, foram duramente golpeados. Estamos tentando devolver pro pessoal de artes cênicas essa fé de continuar o palco, de que vale a pena e que tem que ter público. É preciso vender o ingresso, o público precisa ser sensibilizado.

Adriano Barroso recepcionando artistas na reunião da Secult em 
janeiro. (Foto: Cláudio Ferreira).
Holofote Virtual: Adriano, e a tua carreira, em meio aos arranjos políticos e essa missão de fazer política cultural para este estado?

Adriano Barroso: Eu já estava morando em São Paulo, quando a Úrsula me chamou. Eu aceitei o convite porque tinham duas coisas que eu queria testar. Primeiro o nível do meu bocão, porque do outro lado era muito dedo e gritos e bocão, e realmente estou aprendendo que não é simples assim, querer aqui não é poder. 

A outra coisa recai sobre o que a própria Úrsula falou para todos nós que estamos hoje compondo a equipe. Que a gente é um grupo (eu conheço todo mundo que entrou) que está muito a fim de fazer a diferença, é um grupo muito coeso em relação a fazer política pública, entende, na pele, o que é ser artista. Esse papo foi delícia, pois queremos, com aval da secretária, chegar aqui e fazer algo de real importância pra cidade e para o estado. Perdi um filme, uma série (risos), mas entendi que não poderia dizer não a isso.

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