Richard Wagner, no XII Festival de Ópera do Theatro da Paz |
“O Navio Fantasma” faz a última récita nesta quarta, 25, depois de duas apresentações com a casa lotada. Ingressos esgotados um mês antes, apontaram para o sucesso conquistado junto ao público. Além disso, a obra de Richard Wagner, dirigida por Caetano Vilela mostrou que, cada vez mais, a cena da ópera no país caminha para a pluralidade.
O encenador William Pereira, hoje um dos principais nomes da ópera no Brasil, era uma das pessoas atentas, na plateia. O diretor veio de São Paulo exclusivamente para ver a montagem de Wagner. “Era uma mistura que não dava para perder: Wagner, Caetano Vilela, o Miguel Campos Neto regendo. São pessoas que gosto muito e acompanho tudo que eles fazem”, disse no intervalo dos dois primeiros atores para o terceiro.
A montagem de óperas de concepção contemporânea é algo recente e ainda raro no Brasil, estimulando jovens encenadores e plateias plurais. Embora a preferência dos aficionados ainda seja pela obra tradicional, isso está mudando. Até pouco tempo atrás, se ia ao teatro para aplaudir solistas de renome, mas hoje a ópera está se tornando uma arte mais próxima do teatro.
Rodrigo Esteves encarna o Holandês Voador |
“Eu acho uma maravilha tudo isso acontecendo. É fundamental, afinal ópera não é museu, ópera tem que dialogar com o público e acabar um pouco com clichês da ópera descritiva, onde o que importa é o óbvio.
Caetano é brilhante nesta obra de Wagner”, comentou o diretor. "Ele consegue pegar uma ópera do Séc. XIX e dar uma roupagem de Sec XXI, sem trair a história, respeitando o autor”, complementa.
Para William, as montagens tradicionais não fazem mais tanto sentido para um público que tem acesso a tanta informação, vinda do cinema, da TV entre outros canais de acesso ao mundo, e que não quer mais ver um discurso passadista no palco. Hoje, a ópera também está na internet, como aconteceu nesta última segunda-feira, atraindo milhares de acessos ao Portal Cultura, que logo após colocar no ar o link da transmissão ao vivo do Theatro da Paz, atingiu seu ápice.
“Achei sensacional a montagem de O Navio Fantasma, pois vejo que a linguagem da ópera pode conviver harmonicamente com uma coisa mais ousada. E isso, o festival está fazendo muito bem, ao juntar obras mais tradicionais, com coisas mais ousadas e contemporâneas”, acrescentou William Pereira, que já dirigiu óperas nos Teatros Municipais do Rio e de São Paulo.
Em Belém, ele dirigiu O Guarani, dentro do Festival de Ópera do Theatro da Paz, e mais recentemente esteve em Brasília, onde dirigiu Carmen, de Bizet, e Olga, obra contemporânea, de Jorge Antunes. Apaixonado pelo que faz e com base em São Paulo, ele diz que não tem um lugar de onde seja, que o seu trabalho é a sua casa.
O baixo russo, Denis Sedov, é Darland |
récita, no dia 23, ele se diz surpreso com o resultado.
Tem uma coisa chamada maldição da segunda recita, quando sempre alguma coisa dá errado e por incrível que pareça, nesta segunda récita deu tudo certo. Eu fiquei impressionado, porque tecnicamente, vocalmente , artisticamente, tudo se encaixou. Agora que começa o entrosamento das pessoas”, disse.
A obra de Richard Wagner é considerada difícil por exigir muito de todos, não só do coro, mas da orquestra e dos solistas. E para Caetano Vilela, este nível de exigência aumenta ano a ano dentro do festival. Mas ele faz questão de ressaltar que com o aprimoramento crescente do coro, é cada vez mais fácil realizar peças mais ousadas.
“O coro está se aprimorando, o nível de exigência dessa encenação é completamente na entrega, e eles alcançaram isso. Foi um trabalho diferente do que eles fizeram em Il Trovatore ou em Elixir de Amor, que é obra mais campestre, suave e leve.
O diretor Caetano Vilela, |
Diretor atento a todos os detalhes da montagem, Caetano tem seu feeling em tudo que passa pelo espetáculo, indo da cenografia ao figurino, passando claro, pela luz e a encenação.
As informações técnicas que ele traz de sua formação em teatro fazem diferença na montagem. Atualmente ele integra a nova geração de encenadores que populariza a ópera no Brasil, com espetáculos lúdicos, fiés às obras, mas sem clichês e que permitem contemporaneidade com qualidade, acentuando o brilho dos solistas e das orquestras.
“Cada ópera pede uma coisa diferente. Este é um espetáculo muito contemporâneo e moderno. Gosto dirigir títulos que me permitam ousadias, preciso imprimir ali minha identidade, nisso eu sou exigente. Não costumo dirigir o que não dialogue com meu repertório, eu venho do teatro, então o que eu levo disso para a ópera é a misancene. O Navio Fantasma me permite fazer isso, como Richard Strauss e todos os discípulos de Wagner. Não me vejo fazendo algo mais conservador”, comenta.
Senta (Tati Helene), com tecelãs, no 2º ato: emoção |
Surpresas - A ópera de três atos teve montagem em Belém com apenas um intervalo.
Os dois primeiros acontecem juntos, com momentos de extrema beleza, mas ao ser indagado sobre o que ele mais destacaria no espetáculo todo, Caetano pinçou cenas que tem emocionado também o público, no segundo ato da ópera.
“Comecei o projeto de encanação pelo terceiro ato, que eu já sabia que eu ia usar em recursos cênicos que o navio já me daria. Eu já tinha tudo em mente. O segundo, embora eu já soubesse o que aconteceria, me surpreendeu.
Quando aquele painel fecha com a tecelagem, há uma entrega surpreendente do coro feminino e da soprano Tati Helene, proporcionando um caráter emotivo à cena toda.
E eu não esperava por isso. Para mim, o segundo ato é um espetáculo de teatro perfeito com começo, meio e fim. É quando se fala das relação humanas, dos egos. O elenco toma conta de todo o ato e aparece muito mais que a própria encenação. Estou muito feliz”, finaliza.
Serviço
“O Navio Fantasma”, de Richard Wagner. Última récita, dia 25 de setembro, às 20h. O encerramento do XII Festival de Ópera do Theatro da Paz será neste sábado, 28 de setembro, às 20h, com um concerto aberto, na frente do Theatro da Paz. Mais informações: www.festivaldeopera.pa.gov.br.
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