20.5.13

Homens e Caranguejos no Pará e no Acre

Escrita e encenada por Luciana Lyra, em parceria com o Coletivo Cênico Joanas Incendeiam, o grupo se apresenta nos dias 22 e 23 de maio, no Teatro Waldemar Henrique, em Belém, e nos dias 25 e 26, na Usina de Arte João Donato, em Rio Branco, sempre às 20h. 

A história de um menino pobre abrindo os olhos para o mundo desenha a dramaturgia de Homens e Caranguejos, construída a partir do romance homônimo de Josué de Castro. Inspirado na obra do geógrafo e sob influência de parangolés de Hélio Oiticica, o espetáculo traz canções originais compostas a partir dos ritmos do mangue beat e hip hop. 

Movidas pelas múltiplas vozes e um tema, a fome, a dramaturga e atriz Luciana Lyra se aliou ao Coletivo Cênico Joanas Incendeiam, composto pelas atrizes Beatriz Marsiglia, Camila Andrade, Juliana Mado e Letícia Leonardi, e juntos realizaram a montagem de Homens e Caranguejos, baseado no romance homônimo do geógrafo pernambucano Josué de Castro, escrito em 1966. 

Através do projeto contemplado pelo Prêmio Funarte Myriam Muniz de Teatro 2012, Homens e Caranguejos circulará pelas regiões Norte e Nordeste do Brasil até o final deste ano. “O objetivo é difundir a obra e o legado de Castro acerca da miséria e da fome no Brasil, principalmente nessas regiões onde ainda hoje são vigentes práticas rudimentares de alimentação, apresentam cultivo agrícola limitado, bem como maior percentual de pobreza e ocupação imprópria do espaço público no país”, justifica Luciana Lyra.

Nos meandros desta sua única investida literária, Castro discorre sobre o cotidiano da Aldeia Teimosa, comunidade ficcional, onde não se paga casa, come-se caranguejo e anda-se quase nu. A trama gira em torno de um menino de onze anos, que chegou aos mangues do Recife com sua família, fugindo da seca de Cabaceiras após a morte do irmão mais velho. 

Sua vida se divide entre ser um catador de caranguejos, a vontade de brincar e a amizade com um ex-seringueiro que vive no seu mocambo com suas pernas imóveis. Para Luciana Lyra, o espetáculo é permeado de histórias tocantes, cômicas e analisa o fenômeno social da fome em todas as suas contradições e consequências com o objetivo de desnaturalizá-la e problematizá-la como uma criação humana. Para isso, o grupo foi além da obra. 

“A ideia não é a transpor literalmente o romance, mas sim, a criação de fricções entre o universo criado por Josué e o cotidiano de duas comunidades brasileiras: a Ilha de Deus, em Recife, e o Boqueirão, em São Paulo, são os pontos investigados pelas atrizes desde 2010”, ressalta. 

Lyra diz que a dramaturgia é alimentada não somente por Josué e pelas comunidades, mas afetada por pensadores e artistas, que vão em busca da revolução social através de muitas maneiras, tais como teatro de Brecht, o Cinema Novo de Glauber Rocha, parangolés e penetráveis de Hélio Oiticica. 

A dramaturgia também é embalada pela influência do mangue beat de Chico Science e do movimento do hip hop paulistano, parâmetros que inspiraram a montagem da peça que pode ser assistida sob a perspectiva de um palco arena. “Considero o espetáculo uma estratégia de guerrilha, no qual comunidades e atrizes estão sujeitas ao discurso, de desejos atuantes no processo social”, define. 

Encontro - A montagem surgiu a partir do encontro entre Luciana Lyra (então, Cia. Duas de Criação), atriz, diretora e dramaturga recifense, e o Coletivo Cênico Joanas Incendeiam, cujo ponto de partida, em 2010, surgiu do embate criativo das artistas envolvidas com a força imagética e dramática do romance Homens e Caranguejos, de Josué de Castro. 

Entre 2010 e 2012, os grupos viveram o processo de criação do espetáculo, passando a integrar, como linha de pesquisa, o Grupo Terreiro de Investigações Cênicas (IA/UNESP), assim como o projeto passou a fazer parte da investigação de pós-doutorado em Antropologia (FFLCH/USP), da encenadora, diretora e dramaturga Luciana Lyra e do Núcleo de Pesquisa em Performance e Drama(NAPEDRA/USP-UNICAMP).

Nesta investigação, foi-se aprofundando o conceito de Artetnografia, complexo metodológico de apreensão das experiências de campo pelos artistas, no fomento à cena performática. Guiadas pela Artetnografia, a equipe de criação do trabalho encontrou comunidades semelhantes à Aldeia Teimosa, lugarejo ficcional do romance de Castro, criando uma fricção entre o real e o imaginário. 

Caíram em campo na Ilha de Deus, no coração da cidade do Recife, e no Boqueirão, em São Paulo, buscando descortinar a atualidade da obra de Josué, entrecruzando a experiência do cientista, poetizada em seu romance. O espetáculo já estreou na cidade de São Paulo em maio de 2012 e já esteve em Mogi das Cruzes, Suzano e São Roque, e em Recife - PE. Em março e abril de 2013, cumpriu temporada no Teatro João Caetano, em São Paulo. 

O romance - Traduzido em várias línguas, o romance do geógrafo já foi adaptado para o teatro pela francesa Gabriele Cousin com o título Le Cycle du Crabe ou Les Aventures de Zé Luiz, Maria et Leurs Fils João, em 1969, mas nunca foi encenado e nem outra dramaturgia foi produzida em âmbito nacional, especialmente criando interfaces do texto romanceado com a realidade de comunidades existentes no Brasil contemporâneo, como é o caso desta montagem. 

“Este livro é a história da descoberta da fome nos meus anos de infância, nos alagados do Recife, onde convivi com os afogados deste mar de miséria. Procuro mostrar neste livro de ficção que não foi na Sorbonne, nem em qualquer outra universidade sábia que travei conhecimento com a fome. 

O fenômeno da fome se revelou espontaneamente a meus olhos nos mangues do Capibaribe, nos bairros miseráveis da cidade do Recife: Afogados, Pina, Santo Amaro, Ilha do Leite e tantos outros. Esta foi minha Sorbonne, a lama dos mangues do Recife, fervilhando de caranguejos e povoada de seres humanos feitos de carne de caranguejos, pensando e sentindo como caranguejos”.

Parte da pesquisa de pós-doutorado em Antropologia da encenadora na Universidade de São Paulo, a montagem foi realizada com apoio do Governo do Estado de São Paulo, Secretaria de Estado de Cultura – Programa de Ação Cultural 2011 (teve sua estreia em maio). Cumpriu temporadas em São Paulo, nas cidades de Mogi das Cruzes, Suzano e São Roque e em Recife-PE, cidade natal do autor.

Entre março e abril de 2013, Homens e Caranguejos fez temporada no Teatro João Caetano, em São Paulo-SP. Através do Prêmio Funarte Myriam Muniz de Teatro -2012 o espetáculo circula em 2013, às regiões Norte e Nordeste. Nas cidades de Belém, o grupo conta com o apoio de Universidade Federal do Pará-UFPA e em Rio Branco, Fundação de Cultura Elias Mansour, Usina de Teatro João Donato. 

Ficha Técnica
Dramaturgia e Encenação: Luciana Lyra
Assistente de Direção e Dramaturgia: Mariana Souto Mayor 
Atrizes-criadoras: Beatriz Marsiglia, Camila Andrade, Juliana Mado, Letícia Leonardi
Espaço Cenográfico e Design Gráfico: Vânia Medeiros 
Direção Musical: Nilton Jr. 
Figurinos: Ofélia Lott 
Desenho e Operação de Luz: Silvestre J. R. e Carol Autran 
Preparação Corporal: Viviane Madu 
Preparação Musical: Mestre Nico 
Preparação Vocal: Bel Borges 
DJ/Sonoplasta: Eumar Lima (Mazinho) 
Produção Musical: Buguinha Dub e Paulo César 
Tó Produção Videográfica: Rafaela Penteado 
Operação de Vídeo: Raiça Bonfim 
Fotografia: Alicia Peres 
Produção Geral: 
Realização: Luciana Lyra -Una(L) Temp(l)o de Pesquisa e Criação de Arte, Karla Martins – Decanter Articulações Culturais e Coletivo Cênico Joanas Incendeiam - SP

Serviço
Homens e Caranguejos ( 50 minutos/Classificação: 12 anos). Em Belém-PA: Teatro Waldemar Henrique (Av. Pres. Vargas, 645 – Campina) - quarta, 22, e quinta-feira, 23 de maio, às 20h. Ingressos: R$ 20 (meia R$ 10). Lotação: 170 lugares. Acesso a deficientes físicos. Informações: 91-3222-4762.

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