"Narrativas Costuradas" traz os olhares de Mestre Nato e Carla Beltrão sobre o mundo, expressado em linhas, cores e tecidos. O vernissage será na quinta-feira, 08 de novembro, às 19h.
Por João Cirilo
(curador)
Vêm dos bairros do Guamá e da Sacramenta muitos dos temas, matérias e inquietações que perpassam e caracterizam os trabalhos de Mestre Nato e Carla Beltrão. Vêm de seus pequenos ateliês muitas das descobertas, tão pessoais, relativas aos processos de construção, às matérias e técnicas que empregam para desenvolver seus trabalhos.
Mestre Nato aprendeu desde muito cedo o ofício de alfaiate, o que lhe permitiu costurar roupas para homens e mulheres, estes, desde então, os personagens principais de seus trabalhos, sobre e para os quais constrói narrativas dotadas de forte simbolismo; costuradas em estruturas que remetem a oratórios, roupas e estandartes, algumas de suas invenções remetem diretamente às mais belas e intrigantes criações medievais, uma das principais fontes de referência para o artista, em termos temáticos e em termos de forma.
Suas narrativas são construídas a partir de tecidos coloridos, fitas, paetês e enchimentos, que dão forma a suportes que carregam em si elementos culturais e religiosos de diversas partes do mundo, reunidos na série de trabalhos denominada “Sagrado Sincretismo”.
De Mestre Nato (foto: Danielle Fonseca) |
Dos primeiros habitantes edênicos aos santos católicos, passando por lendas e mitos amazônicos, o artista chegou recentemente ao tema da religiosidade afro-brasileira, se interessando por contar histórias de alguns de seus principais orixás e entidades, personagens e temas que recorrentemente surgem embaralhados, correlacionados.
Carla Beltrão, por sua vez, elabora, com base no seu olhar em suspensão sobre o mundo, mapas oníricos, aéreos. Em seus traços se opera a criação de desenhos topográficos de cidades, que só se materializam em consequência de seus gestos; desenhos que se dão por meio de camadas e camadas de tecidos costurados por elementos de risco, em brasa.
Arguta construtora de formas abstratas e pesquisadora voraz de novos suportes e recursos, Carla surpreende pela inventividade e simplicidade de seus métodos, pelo ligeiro processo com que constrói e confere beleza e força à (im)precisão de suas linhas.
Das incontáveis séries, suportes e técnicas com que a artista trabalha, selecionamos para essa exposição algumas de suas peças em tecidos sintéticos, construídas com o uso de pirógrafo, instrumento que ela usa para desenhar sobre superfícies através do calor, da queima, em uma técnica que ela própria denomina de “tecido-gravura”.
Artistas ligados pela amizade, pela idiossincrasia de suas poéticas e pela vivência como arte-educadores, nada é mais prazeroso e provocante do que ver reunidas, costuradas, num mesmo espaço, narrativas desses criadores tão intensos. Há neste conjunto de obras uma pequena, porém, significativa mostra do que os pequenos ateliês-usinas incrustados em dois dos bairros mais populosos e vibrantes da periferia de Belém podem oferecer, em forma de crônicas e de narrativas visuais, que refletem vivências e modos diversos de se relacionar com o mundo.
A Galeria Theodoro Braga, fica no subsolo do Centur - Av. Gentil Bittencourt entre Genralíssimo Deodoro e Rui Barbosa.
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