26.9.20

Amazônia Doc: filmes liberados na AmazôniaFlix

É verdade, mas só neste final de semana. Depois de encerrar sua programação, com cerimônia virtual de premiação, na última quarta-feira (23), o Amazônia Doc resolver disponibilizar novamente todos os filmes do festival, na AmazôniaFlix, é só acessar. Na reportagem a seguir, saiba quais foram os premiados e também como foram as emoções do encerramento e os impactos deste ano.

Foi uma verdadeira avalanche de filmes. Confesso que não consegui ver todos e vou aproveitar este final de semana.  Sábado  (26) e domingo (27). Dois dias para escolher entre 54 opções, o que assistir. São longas, curtas e médias metragens selecionados este ano para as mostras competitivas desta sexta edição que chegou em formato 3 em 1 e totalmente on-line. Além de todos os outros tantos que na correria do próprio trabalho no festival, acabei perdendo, vou começar pelos filmes premiados, são mais de 20.

O longa metragem paraense “Transamazonia”, por exemplo, foi o vencedor do prêmio principal do Festival Amazônia Doc. E aqui, temos um fato histórico: é a primeira vez que uma diretora trans ganha a premiação. O filme percorre a rodovia que corta toda a Amazônia brasileira, trazendo para o público a perspectiva de pessoas trans e travestis que vivem às margens deste lugar marcado pelo abandono. Parece que pouca coisa mudou desde "Iracema, uma Transa Amazônica", de Jorge Bodanski, feito há 30 anos.

Renata Taylor – que assina o filme junto de Débora Mcdowell e Bea Morbach – estava na cerimônia de premiação e foi surpreendida com a notícia, marcando um dos momentos mais emocionantes da live de encerramento do festival. É o primeiro filme de Renata, que revelou algumas dificuldades que ela e a equipe enfrentaram para realizá-lo. 

“Chegamos a ser hostilizadas em certas situações, mas mesmo assim seguimos. Foram três anos de muito trabalho. Para mim, protagonizar esse processo é uma forma de deixar a mensagem que nós, pessoas trans, podemos ocupar qualquer espaço, basta nos dar oportunidade”, conta a diretora, que tem forte atuação no movimento LGBTQ paraense. O filme também foi premiado como melhor direção em longa no Festival Mix da Diversidade, de 2019, em São Paulo.

Na mostra competitiva de longa metragem, destaque também para os ganhadores das categorias Melhor Roteiro, para o filme “Soldados da Borracha”, de Wolney Oliveira, e Melhor Filme pelo júri popular, para “Xadalu e o Jaguerê”, de Tiago Bortolini de Castro, que também ganhou menção honrosa junto com a produção colombiana “Homo botanicus”, de Guillermo Quintero.

Já na mostra competitiva de curta metragem, o prêmio de melhor filme pelo júri especializado foi para “Quentura”, de Mari Corrêa. A produção traz a perspectiva de mulheres indígenas sobre as mudanças climáticas e suas consequências no cotidiano.

”Uma pergunta me intrigava: ‘será que as indígenas teriam algo em especial para falar sobre as mudanças climáticas?’ As mulheres trazem a perspectiva da roça, elas são as cuidadoras do alimento da comunidade e têm conhecimento profundo sobre as plantas  e seus ciclos. O olhar sensível delas aponta para os impactos dessas mudanças na vida das populações”, explica a diretora, que é fundadora do Instituto Catitu, organização que fomenta a produção audiovisual como ferramenta de expressão para indígenas.

Nas outras categorias da premiação para curtas, como Melhor Roteiro para “Ferroada”, de Adriana Barbosa e Bruno Mello de Castro; e Menção honrosa para “A praga do cinema brasileiro”, de Zefel Coff e Wiliam Alves, filme que traz um recorte único do país retratado em diversos filmes brasileiros. Muito bom. Levou Melhor Filme pelo júri popular para “Ary y Yo”, da cineasta paraense Adriana de Faria, um curta documentário muito poético, narrado em primeira pessoa e que revela uma personagem inesperada para a diretora. 

As Amazonas do Cinema

O 1o Festival As Amazonas do Cinema recebeu mais de 50 inscrições e selecionou 21 filmes que concorreram nas categias de curta e longas. Na mostra competitiva de longa, a vitória foi para o filme “Fakir”, de Helena Ignez, que nos convida a mergulhar na vida e obra de artistas de origem circense, que extrapolaram os limites do corpo em apresentações que foram sucesso no Brasil, principalmente, na primeira metade do século XX. 

“Gostaria de parabenizar ao festival que traz este belíssimo nome, porque me sinto realmente assim, uma Amazona! É uma iniciativa de extrema importância diante de tantos retrocessos. Estimular um sentimento de identidade pan-amazônico, nesse momento de queima e destruição, mostra o valor deste festival”, considera Helena Ignez, um dos maiores nomes do cinema nacional.

Os demais prêmios da mostra de longas foram: Melhor Direção para “Currais”, de Sabina Colares e David Aguiar; Menção honrosa para “Duas Company Towns”, de Priscilla Brasil; Prêmio Especial do júri para “Portunõl”, de Thais Fernandes que também levou o prêmio de Melhor Filme pelo júri popular.

Na mostra competitiva de curtas, dois filmes de países vizinhos em destaque. O Melhor Filme para o júri especializado foi o colombiano “Até o fim do mundo”, de Margarita Rodrigues Weweli-Lukana e Juma Gitirana Tapuya Marruá; Melhor Roteiro para “Tesouro escondido do Equador”, de Kata Karáth e Ana Naomi de Sousa, do Equador; Menção honrosa para os filmes “Mulheres Xavantes coletoras de sementes”, de Daniele Bertollini, e “Opará – Morada dos ancestrais”, de Graciela Guarani.

Além de ganhar o prêmio de Menção Honrosa, a cineasta Graciela Guarani também esteve presente no festival com a oficina “Narrativas Originárias”. “A proposta foi de um bate-papo em que através da perspectiva e o olhar de cineastas de seus lugares de pertencimento, a gente pôde discutir as sensações por trás da construção das imagens, refletir e dialogar  sobre estes processos de criação”, explica a diretora, que nasceu na aldeia Jaguapiru, na reserva indígena de Dourados do Mato Grosso do Sul.

Curta Escolas mostra a juventude em debate

A mostra “Primeiro Olhar”, do 1º Festival Curta Escolas, trouxe para o festival a produção dos estudantes da rede pública. Após a realização de oficinas de formação, em parceria com o TF Cine Clube, o festival ajudou a realizar os curtas propostos pelos alunos. O resultado foram 11 vídeos de excelente qualidade, o que dificultou o trabalho do júri. 

O jovem Gabriel Fernandes, de 18 anos, é estudante da Escola Dom Calábria, de Marituba. Apaixonado por arte em geral, Gabriel levou para casa o prêmio de Melhor Filme com “Homem na roda”. Na produção, um grupo de jovens garotos da periferia se encontram para conversar sobre assuntos diversos, costurados entre temas como masculinidade, racismo e o lugar de resistência da periferia. “A ideia foi estimular a expressão nossa, como garotos. Falar dos nossos sentimentos para aprender a lidar com eles”, conta Gabriel.

"Famílias periféricas na pandemia”, de Marianna Kali e Renan Kauê, ganhou como Melhor Direção. Na produção dos alunos da escola Paes de Carvalho, eles trouxeram os impactos da pandemia no cotidiano de suas próprias famílias. “Foi uma ideia que surgiu bem em cima da hora, gravamos a rotina de nossas casas nessa quarentena durante um dia. Foi uma experiência linda, uma novidade em nossas vidas”, conta Marianna.

Também ganharam destaque as produções “E aí, pretinha?”, de Mederiá Brandão, Jéssica Paixão e Emanuelle Araújo (Melhor roteiro); “Levanta juventude”, de Henrique Lobato e Vinicius Silva (Melhor filme, júri popular), que também ganhou menção honrosa junto com “Seu Erádio”, de Vanessa Serrão e Rebeka Ferreira. Os filmes podem ser vistos pelo canal do youtube do Festival Amazônia Doc.

Troféus,  Prêmio Selo Ela e as conquistas da sexta edição

Não foi possível que os premiados estivessem presentes na cerimônia virtual, transmitida pelo canal de Youtube e que você, inclusive, pode acessar quando quiser. Mas eles receberão em mãos troféus como o que é confeccionado por um artesão do Marajó, Ronaldo Guedes, há dez anos, desde a fundação do festival. O trofeu da Mostra Primeiro Olhar é obra de outro do também artesão marajoara, Brendo Sampaio. 

E o trofeu Eneida de Moraes que será entregue às diretoras premiadas no 1o Festival As Amazonas do Cinema foi uma criação da designer de joias Bárbara Müller, à convite de Zienhe Castro, diretora do Amazônia Doc. Além do trofeu, um dos filmes também levou o prêmio Ela, da Elo Company, um selo de distribuição e fomento à produção cinematográfica independente. E o filme vencedor foi “Rosa Vênus”, de Marcela More.

O 6o Amazônia Doc realizou uma programação de 12 dias com mostras competitivas, oficina, masterclass, web encontros. Tudo de forma on-line, um desafio. Na cerimônia de premiação, a emoção pairava no ar. Zienhe Castro – diretora-geral, produtora e curadora do festival – trouxe os números desta edição. As mostras competitivas, dos três festivais, somaram 65 filmes, sendo mais de 50 deles inéditos, oriundos de cinco países da Pan-Amazônia. Contabilizou-se mais de 5 mil acessos às obras na plataforma streaming AmazôniaFlix. Os onze curtas selecionados para o Festival Curta Escolas foram transmitidos em TV aberta, com alcance para 104 municípios paraenses.

“Estes números são extraordinários para um festival como o nosso, que não é de cinema de entretenimento, mas de reflexão e debate. Foi muito desafiador realizar esta edição, fomos atravessados pela pandemia e precisamos nos reinventar, migramos para o mundo online e ainda agregamos mais festival ao Amazônia Doc. Cumprimos nossa missão com resiliência”, conta a diretora-geral. 

As ações de formação do festival trouxeram resultados positivos. As oficinas prévias do “Curta Escolas” alcançaram mais de cem alunos, além de duas oficinas especiais para os jovens selecionados pelo festival. Foram realizadas também duas oficinas, duas masterclass, um webinário e oito web-encontros, todos com lotação máxima de participantes.

Para Marco Antônio Moreira, um dos curadores do Amazônia Doc, todo este movimento que o festival propicia é fundamental para um novo olhar sobre o cinema amazônico. “O Amazônia Doc representa a nossa produção. Precisamos descobrir a Amazônia efetivamente, para poder revelá-la ao mundo. Não nos falta talento, o que nos falta é estrutura para produzir e distribuir. E o público tem papel fundamental nesse processo de fortalecimento do audiovisual amazônico”. A curadoria do festival recebeu mais de 300 filmes nesta edição.

Júri marcou presença virtual

A cerimônia de premiação também contou com as falas de alguns dos integrantes dos juris oficiais das mostras competitivas. Alguns estavam presentes, como da atriz Wellingta Macêdo, que selecionou os vencedores do 1o Curta Escola, como também Lilia Melo, professora e coordenadora do TF Cine Clube. “Esta iniciativa é uma revolução! Esta garotada está pegando as mazelas que poderiam destruí-los e as transformando em arte”, considera Lilia.

A atriz e produtora paraense Célia Maracajá; e a jornalista paulista Flávia Guerra (SP) enviaram vídeos, como ainda Anna Karina de Carvalho, jornalista. Todas do júri do 1o Festival As Amazonas do Cinema. Para elas, o trabalho de avaliação foi muito difícil. “Tínhamos produções de excelente qualidade, trazendo temáticas diversas. Parabenizo o festival por este recorte de amplas possibilidades”, Anna Karina. 

O cineasta Victor Lopes, do júri da mostra de longas da mostra Pan Amazônica do Amazônia Doc, é presença cativa, sendo um dos fundadores do festival. Para ele, o evento é um termômetro que aponta para bons rumos na produção amazônica. “Mais uma vez, o Amazônia Doc vem com produções de altíssimo nível, muito focado na produção amazônica, o que demonstra que mesmo em meio à um período de grandes dificuldades, nosso cinema está mais vivo do que nunca!".  

Foi realmente um festival desafiador e emocionante. É preciso reformar que a  realização do Festival Amazônia Doc 3 em 1 é do Instituto Culta da Amazônia, com a Correalização do Instituto Márcio Tuma; patrocínio da Equatorial Energia, por meio da Lei Semear de Incentivo à Cultura - Fundação Cultural do Pará - Governo do Pará. E a produção é da ZFilmes; com apoio cultural da Rede Cultura de Comunicação, Sebrae, Ufpa - Curso de Cinema e Estrela do Norte - Elo Company.

(Holofote Virtual com Luciana Medeiros e Luiza Soares)

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