7.4.10

Entrevista: Um engenheiro no universo das HQs e do Cinema


Na próxima semana a recém criada Casa de Oficinas da Caiana Filmes irá sediar mais um curso, desta vez, discutindo as linguagens de cinema e quadrinhos.

Artes irmãs, que utilizam a imagem e a palavra para se expressar e possuem ritmo visual e recursos de montagem parecidos, sem falar de iluminação, enquadramentos e profundidade de campo, utilizados pelas duas.

Tanto a chamada Sétima Arte, quanto as Revistas de HQs surgiram no final do século XIX, durante a Revolução Industrial, e talvez por isso tenham tanto em comum. Mas enquanto os quadrinhos foram se popularizando ao invadirem as tiras dos jornais, o cinema evoluiu com as novas tecnologias, mas isso, desde os tempos dos irmãos Lumiére.

O fato é que há muito tempo uma invadiu o campo da outra, ou melhor, se utilizaram uma a outra, como num caso de amor irrecuperável, com resultados que levam multidões às salas de cinema e aumentam em qualidade as revistas dos exigentes leitores de quadrinho. Para ministrar o curso a produtora também foi buscar um apaixonado.

O curso "Histórias em Quadrinhos e Cinema" será levado pelo crítico e professor Arnaldo Prado Jr., que começou a publicar críticas de filmes em jornais em 1959, iniciando no jornal “A Palavra” e seguindo esta trajetória em “O Liberal Tablóide”; na Página Artística da Folha do Norte e no Suplemento Literário de “A Província do Pará”, até 1964.

“Mesmo quando não escrevia, continuava acompanhando a programação de cinema e estudando a Sétima Arte e as HQs. Minha curtição é tão grande que o banco de dados de minha dissertação de mestrado, ‘Um sistemas de Perguntas e Respostas’, no início da década de 1970, foi sobre histórias em quadrinhos”, diz Prado Jr.

Na década 80, ele aceitou o convite da crítica Luzia Álvares para colaborar na coluna Panorama, mantida por ela até hoje em O Liberal.

Arnaldo, como tantos outros grandes críticos de sua geração, não é cineasta de formação, o que também não uma obrigação. Em seu caso, abraçou a Engenharia Civil e tornou-se professor da Faculdade de Computação da UFPA, hoje aposentado e orientador de TCCs.

É também Mestre em Ciências em Informática, formado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, mas nunca deixou a crítica cinematográfica e ainda manteve, por um bom tempo, um espaço sobre quadrinhos publicado aos domingos no mesmo jornal.

É claro que isso acabava fazendo parte de sua rotina acadêmica. “Quando mais efetivo como professor sempre que possível levava o cinema e os quadrinhos para discussão em sala de aula e os alunos gostavam”, confessa.

No curso, ele irá abordar as adaptações de Super-Homem, Homem-Aranha, Quarteto Fantástico, X-Men, Batman, Homem de Ferro, Hulk e agora Watchmen levadas para a telona.

De acordo com nosso crítico, nas décadas de 1930 e 1940, os seriados de cinema já levavam às telas personagens como O Fantasma, Capitão América, Buck Rogers, Flash Gordon e até Capitão Marvel.

“Naturalmente, com as limitações de recursos e que vistos hoje são soluções precárias”, ressalta.

Atualmente, ele é vice-presidente da Associação de Críticos de Cinema do Pará (ACCPA) e participa das apresentações de filmes programados pela associação no Cine Líbero Luxardo e dos debates sobre cinema, como os que acontecem às segundas-feiras no Cineclube Alexandrino Moreira, no Instituto de Artes do Pará.

É que agora, além da paixão, o tempo dedicado ao cinema e aos quadrinhos, é bem maior. Mais uma prova disso está em Tempos Modernos, seu blog onde o assunto, é... cinema, claro. E HQs.

“O blog tem sido alimentado por alguns textos que venho escrevendo para possível publicação de um livro que descreverá o meu percurso como curtidor e estudioso de cinema e de histórias em quadrinhos”, avisa.

O Holofote Virtual o procurou para uma entrevista a que ele gentilmente atendeu brevemente, um pouco antes do último feriado da sexta-feira santa, e que agora está disponibilizada a seguir.

Para os interessados no curso, há mais informações sobre inscrição e conteúdos no blog da Caianna Filmes.

Agora, vamos aproveitar e saber mais o que Arnaldo Prado Jr. tem a dizer sobre o que mais gosta de ver, ler e também escrever.

Holofote Virtual: O que veio primeiro em tua vida, as HQs ou o Cinema?

Arnaldo Prado Jr.: Vieram praticamente ao mesmo momento. Das revistas em quadrinhos para os seriados de cinema. E também o interesse em estudá-los. A partir da década de 1950 passei a comprar livros sobre cinema e sobre histórias em quadrinhos, o que aparecia. No entanto, logo no início, livros sobre cinema eram mais fáceis de conseguir, na verdade o cinema se firmou como arte bem antes dos quadrinhos.

Holofote Virtual: Desde quando quadrinho e cinema conversam e se fundem? Isso entra nas conversas que vão surgir durante o curso?

Arnaldo Prado Jr.: Não pensei situar no tempo e no espaço essa conversa e essa fusão porque minha aprendizagem sobre essas duas artes faz com que eu as considere associadas desde que se iniciou meu interesse e, sobretudo meu estudo de cinema e de quadrinhos, aliás, praticamente no mesmo momento.

Os desenhos animados no cinema foram os primeiros a levar para as telas, traços registrados primeiro em papel, personagens estáticos que passaram a se movimentar nas telas. Como artes sequenciais baseadas em imagens, em palavras e sons possuem elementos comuns como planificação, enquadramento, luz, sombra, enfim há muito tempo conversam e se fundem.

Holofote Virtual: Quais foram as primeiras experiências de quadrinhos no cinema a que você assistiu e quais foram suas impressões?

Arnaldo Prado Jr.: As minhas primeiras experiências com cinema e histórias em quadrinhos, associados, vêm do final da década de 1940 e início da seguinte, quando assisti seriados de cinema do Flash Gordon, do Capitão Marvel, do Homem Morcego (naquele tempo ele não era Batman), do Super-Homem, de Nyoka, filmes do Durango Kid, do Rocky Lane para citar os mais marcantes.

Era tudo fantasia e ver o Capitão Marvel voar no cinema nas vesperais passatempos do Olympia era como ver vivas as figuras que já curtia nas revistas, uma nova dimensão à imaginação de garoto onde predominava a curtição pela aventura.

Holofote Virtual: Assim como o cinema incorporou ouniverso das HQs, estas inovaram em sua linguagem, tornando suas ilustrações minuciosas, com indicações de planos como em um filme. Em que obras temos os maiores exemplos disso?

Arnaldo Prado Jr.: Como artes seqüenciais, baseadas em imagens e em textos, acho que tiveram desenvolvimentos independentes, porém com características comuns.

O detalhamento em ambas foi surgindo pelo próprio desenvolvimento das linguagens. Um exemplo de transferência mais direta dos quadrinhos para o cinema está em “Sin City”, dirigido por Frank Miller e Robert Rodriguez.

“Watchmen” segue bastante a planificação dos quadrinhos. “300”, dirigido por Zack Snyder com roteiro dele mesmo, de Kurt Johnstad e Michael Gordon, baseado na graphic novel de Frank Miller e Lynn Varley é também um bom exemplo de adaptação para o cinema de uma história em quadrinhos. Das graphic novels, “V de Vingança”, para mim, não foi uma boa adaptação.

Holofote Virtual: A esta fusão de linguagens também foi inserida uma sofisticação do material gráfico das revistas em quadrinho. Isso não teria elitizado, de alguma forma, as HQs, aumentando o preço do exemplar?

Arnaldo Prado Jr.: Tanto os filmes como as HQs são produzidos industrialmente em sua maioria e buscam mercados lucrativos.

A melhoria da qualidade de impressão, claro, aumentou o preço das revistas, no entanto elas continuam sendo produzidas e compradas. Não sei se podemos falar em elitização.

Holofote Virtual: Qual a principal intenção do curso?

Arnaldo Prado Jr.: Vou procurar dar elementos para que os participantes vejam o cinema e as histórias em quadrinhos como meios de expressão dotados de linguagens próprias, para permitir que construam conhecimento que lhes tornem capazes de avaliar criticamente uma obra em suas vertentes artística, política, industrial, comercial, social, cultural, enfim nos diversos aspectos de uma sociedade da informação.

Holofote Virtual: O que se deve esperar mais?

Arnaldo Prado Jr.: Devem esperar um curso participativo, cooperativo em que todos participem da construção.

Claro, tenho um roteiro pré-definido e vou tentar segui-lo, afinal de contas não vou improvisar, mas não será um curso meramente expositivo, pretendo aprender com o pessoal. Espero dos participantes uma contribuição escrita, tipo um trabalho final de curso, mas dimensionado individualmente.


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