15.12.10

Edir Gaya comenta o show Invento de Sônia Nascimento

O texto a seguir foi publicado originalmente no Caderno Magazine, de O Liberal, edição desta quarta-feira, 15 de dezembro. As fotos desta postagem são da fotógrafa Ana Flor.

Invento transforma brisa em tempestade

Por Edir Gaya*

A “brisa leve e deliciosa” que Sônia Nascimento começou a soprar com “Invento”, durante as três semanas de temporada no “Reator”, se transformará inevitavelmente em tempestade nesta quarta-feira, 15, quando a cantora que retorna ao palco após um afastamento de 13 anos apresenta o espetáculo de despedida da temporada deste ano, no Teatro Margarida Schiwasappa.

Escrevi a matéria de lançamento da Sônia como cantora na década de 90, com o “Jardim Elétrico”, ao qual se seguiu depois “Florbella Spanka”, sempre ao lado de Renato Torres e Rubens Stanislaw. A garota, muito compenetrada e aparentemente retraída, se revelou, então, um furacão. Sacudiu a cena musical da cidade com um repertório que não fazia concessões ao óbvio e que mergulhou fundo nas raízes do pop-rock para se transformar na trilha sonora dos que faziam o circuito dos bares descolados nos agitados anos 90 em Belém.

O talento cênico e o timbre singular de Sônia, aliados ao repertório ousado e à competência de músicos como Renato e Rubens, explicam o sucesso daquele período.

"Poucas cantoras de Belém, na década de 90, aliaram tão bem a genuína MPB com uma pegada pop. Não foi à toa que se tornou uma das principais cantoras da cidade à época, marcando presença nos principais bares. Até hoje uma galera ao mesmo tempo exigente e 'descolada' lembra com saudade dos shows da Sônia e suas bandas. É a oportunidade de matar a saudade e aguardar novas ousadias", diz o jornalista Edson Coelho, a respeito do retorno de Sônia Nascimento.

Sônia estava devendo ao seu público um show no formato de “Invento”, espetáculo no qual o rock e o pop são a moldura sobre a qual a canção brilha em primeiro plano. Esse mergulho no gênero que caracteriza a singularidade da música brasileira é o grande mérito do espetáculo.

Muita gente de peso já anunciou a morte da canção, mas Sônia mergulha na busca da consistência da palavra cantada, abordando desde o velho tema do que era para ter sido e que não foi, até as ilusões perdidas quanto ao futuro da canção:

“Era pra eu mudar o mundo inteiro ao meu redor/Era pra gritar o que ninguém ainda escutou/Era pra ser bom ou pra ficar muito melhor/Era pra voltar o tempo que ainda não passou/Vou, hei de partir/Aprisionado nas canções/Se sou o escravo dessas ilusões”, anuncia a moça, em “Prisão”, do Moska; e arremata, em “Pérolas aos poucos”, de José Miguel Wisnik: Eu jogo pérolas aos poucos ao mar/Eu quero ver as ondas se quebrar/Eu jogo pérolas pro céu/Pra quem pra você pra ninguém/Que vão cair na lama de onde vêm”. E tudo isso com uma pegada rítmica firme, mas muito suave.

Vi o show na terça (07.12) com a Valéria e as crianças (Gabriel, Leon e Manuela). Ficamos todos encantados e surpresos com as possibilidades cênicas e sonoras do Reator. Nando Lima e o pessoal responsável pelo espaço são realmente geniais.

Quanto a mim, o retorno da Sônia premiou com a inclusão de uma canção recente que fiz em parceria com o Renato Torres, “Algum mar”, harmonia complicada à qual o arranjo apurado do Renato, a execução firme do baixo de Rubens, a delicadeza do bandolin de Diego Xavier e a interpretação de Sônia deram o tom de simplicidade que marca o que é de fato belo. Com “Invento”, Sônia realiza o desejo que Renato Torres manifesta por nós que amamos a canção brasileira, na letra de “Algum Mar”: “ousar ouvir na minha voz/algo mais do que palavras vãs/Algum mar fundo o bastante/Pra se mergulhar”.

*Edir Gaya é jornalista e músico compositor.


Serviço

Show Invento. Nesta quarta-feira, dia 15 de dezembro, a partir das 20h. No Teatro Margarida Schivasappa dentro do projeto Uma Quarta de Música. Ingressos R$ 10 e R$ 5,00. 

Patrocínio do Governo do Estado, Edital Prêmio Secult de Música, Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves. Apoio cultural da Intimidia, Sol Informática, La Maison Du Pain, Apce Música, Na Music, Produtores Criativos e Reator. Mais informações: 91 8134.7719.

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