29.12.10

Entrevista: A hora e a vez do cinema na trajetória de Ester Sá

O ano chega ao fim, mas 2010 deixa saldo positivo para o ano novo, como a produção de “Quem vai levar Mariazinha para passear”,  roteiro premiado pelo edital do Curta Criança, do MinC. A produção começa em janeiro, com previsão de filmagens para fevereiro, em Belém. 

No filme, os anjos 001 e 002 desceram à terra curiosos por conhecer os homens, mas por causa da chuva ficam presos dentro de um teatro e resolvem fazer uma boneca Mariazinha, uma bonequinha de papel que conforme uma superstição popular, tem o poder de controlar a chuva.

Enquanto a chuva não passa, os dois iniciam uma brincadeira de contar histórias. Logo a boneca Mariazinha vira a personagem mitológica Psiquê, e dá início a trama do mito grego. Os personagens recortados ganham vida própria e conduzem o espectador para dentro do seu universo fantástico.

O roteiro é de Ester Sá, artista que vem, nos últimos anos, nos presenteando com vários projetos na área de teatro, mas que traz na bagagem uma trajetória surpreendente. Na década de 90, por exemplo, a conheci soltando a voz nos bares. Um pouco mais adiante, lá estava ela, nos palcos, atuando no teatro de formas animadas.

Depois, fazendo uma especialização em Imagem e Sociedade, na UFPA, investigando a comicidade na obra de Charles Chaplin. Mais tarde, surge com o projeto do Festival Territórios de Teatro, que no ano que vem chegará a sua IV edição.

Mas como já disseram a vida é uma caixinha de surpresas. E eu que achava que a Ester já tinha nascido na arte, me surpreendi mais ainda em saber sobre os primórdios de sua trajetória. A atriz e pesquisadora que fez Iracema Voa, inspirada na vida e obra da folclorista e radialista Iracema Oliveira, formou-se em contabilidade, depois de ter passado, na verdade, em administração.

Pode ser de pasmar, mas pensando bem, as pessoas inquietas são assim. À princípio parecem não saber o que fazer e vão buscando caminhos até se acharem. E foi exatamente o que aconteceu com a Ester, que se considera hoje uma mulher de teatro, sem nenhuma dúvida quanto a isso. Não é à toa que ela sustenta-se só de arte há mais de 10 anos.

Cena de Por a Caos
Só que agora, embora mantendo os pés, as mãos e a cabeça no universo cênico, Ester entra na vibe da sétima arte e mergulha no cinema de animação. 

Adaptado do espetáculo homônimo, “Quem Vai Levar Mariazinha para Passear”, o primeiro trabalho da Desabusados Cia, que também é responsável pela montagem de Por A caos, o filme vai misturar as linguagens e também terá em cena os mesmos atores da peça, a própria Ester Sá, e o amigo e parceiro de palco, Maurício Franco.

Os primeiros experimentos para a animação dos personagens, porém, já começaram, sob os cuidados de Andrei Miralha, um dos caras premiados da animação paraense. Ester já editou até um teaser desta experimentação e postou em sua página do Facebook.

O Holofote Virtual fez uma entrevista com Ester para falar de sua trajetória.  Apaixonada pelo que faz, brincante de Cordão de Pássaro, desde que trabalhou com Iracenma, ela faz , no bate papo descontraído que segue aqui, uma  breve retorspectiva de sua carreira. 

Holofote Virtual: Quando falastes da tua formação em contabilidade fiquei surpresa...

Ester Sá: Pois é, tive dificuldades em escolher o curso na faculdade, não encontrava na época um curso que eu realmente me identificasse, pensei em fazer publicidade, mas acabei me inscrevendo para administração, fui aprovada, e depois lá dentro troquei para contabilidade.

Na época achava que era isso, mas depois percebi que não seriam estas as minhas profissões. Eu era muito nova, passei no vestibular com 15 anos e pouco conhecia de arte, imagina se eu teria já as respostas pra vida...

Holofote Virtual: Sendo assim, como rolou esta guinada certeira para a arte e mais?

Ester Sá: Na faculdade mesmo conheci um amigo, o Moacir (que até hoje é um irmão pra mim) que me apresentou arte e o círculo cultural, daí eu desembestei. Primeiro fui cantora, e atuei na noite de Belém por alguns anos até que tive vontade de fazer um show com um roteiro mais teatral (na verdade eu já estava com vontade de fazer teatro e ainda não sabia) então pra dirigir o show eu procurei a pessoa de teatro que conhecia, a Dedé Bandeira. Eu a considero a minha madrinha, pois ela conseguiu interpretar meu desejo antes de mim e me aconselhou que eu fosse cursar escola de teatro isso foi em 1995.

Holofote Virtual: E o show, ficou bom?

Holofote Virtual: Mana, o show acabou nem rolando, mas daí eu fui me inscrever na Escola de Teatro, que na época era uma escola experimental, ficava ali na Magalhães Barata. Acho que em 1997 eu ainda dei uma saída e passei um ano longe, mas em 1998 eu voltei pra ficar. Daí pra cá, o teatro é o centro da minha vida. Logo depois, em 1999, eu sai do emprego de bancária que eu tinha, e desde então tenho me dedicado ao teatro e a arte.

Holofote Virtual: O Quem vai levar Mariazinha... foi o primeiro espetáculo montado pela Desabusados Cia., vamos falar disso um pouco...

Ester Sá: O Mariazinha surgiu em 2006, quando fundamos a Desabusados Cia, que é o meu grupo de teatro. Este espetáculo, e este ano de 2006, com certeza é um marco na minha vida. Foi a partir de 2006 que resolvi tomar as rédeas da minha carreira, e também iniciei a parceria com o meu amigo-irmão Maurício Franco, que bons frutos tem nos rendido.

Nosso primeiro trabalho juntos foi a dramaturgia do espetáculo e daí surgiu essa parceira de arte e de vida. Eu e Maurício temos algo que costuma funcionar nas parcerias, agente se completa, ele faz coisas que eu não sei fazer, e vice-versa, e nos ajudamos mutuamente. Costumamos dizer que somos a liga da justiça, cada um com os seus superpoderes... rsrsrs

Holofote Virtual: Chegastes, antes, a participar do grupo In Bust teatro com Bonecos...

Ester Sá: Sobre a In Bust, eu saí no final de 2005, foi uma boa experiência, principalmente aprendi sobre formas de sustentabilidade de um grupo de teatro. Amo e considero um mestre o artista e grande amigo Aníbal Pacha, com quem sempre me aconselho e posso contar com sua amizade e parceria em outros trabalhos, como por exemplo em Iracema Voa, que ele esteve como consultor do trabalho e foi determinante no pensamento da visualidade do espetáculo.

Holofote Virtual: Música, teatro, cinema. Lembrando o Melodia (Luiz), qualquer paixão não satisfaz. Fala um pouco destas tuas múltiplas escolhas...

Ester Sá: Eu penso arte sem amarras, uma linguagem não deve te aprisionar e sim te libertar. Eu sou sem dúvida uma mulher de teatro, mas também amo o cinema, amo a música, e se existe possibilidade de realizar projetos que sejam coerentes com a minha essência que me façam passear por outras linguagens, porque eu não faria?

Minha aproximação com o cinema vem à priori, como espectadora. Depois, ao cursar uma especialização em cinema, pude estudar teoria, e me apaixonar pela linguagem. Por fim, aqui temos um motivo muito especial, que é a parceria de arte e de vida com o meu marido André Mardock que é um grande artista e que enxerga o mundo e a arte pelo audiovisual. 

Ele será o diretor do Mariazinha - o filme e este trabalho será como um filho, não só nosso, mas de toda a equipe, pois estamos trabalhando com uma turma de primeiríssima. Já a música, embora eu ande distante da profissão de cantora, sinto falta de cantar sim, e penso em fazer um show qualquer dia desses, deixa só eu arrumar um tempinho... rsrsrs

Holofote Virtual: Ah, mas tem uma orquestra na tua vida, não é...

Ester Sá: Faço a direção da Ópera Infanto Juvenil “O Viajante das Lendas Amazônicas”, trabalho que me permitiu experiências como me apresentar em grandes teatros do Brasil, como o Palácio das Artes em BH, O Teatro Nacional em Brasília e o Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Embora Ópera não seja a minha linguagem, dirigir um trabalho como esse tem sido uma experiência que tem me trazido grande aprendizado, principalmente no sentido de administrar uma grande e competente equipe de artistas, em prol de um resultado comum.

Holofote Virtual: São muitos trabalhos, muitas portas se abrindo...

Ester Sá: Pois é, no teatro hoje tenho trabalhado em três frentes, uma é a Desabusados Cia, que é o meu grupo, onde produzimos o espetáculo Mariazinha, e também o Por A Caos, e por onde produziremos o filme, dentre outros projetos que estão engatilhados.

A outra frente são os meus espetáculos solo, sendo o primeiro deles o Iracema Voa, que nasceu de uma pesquisa sobre a vida e a obra da artista Iracema Oliveira. Estou projetando um novo espetáculo solo para iniciar o processo e estrear no segundo semestre de 2011, se Deus Quiser... e se o projeto for aprovado...
Em ambos os casos penso sempre em manter os espetáculos em repertório, e trabalhar em cima deles, viabilizando circulação, temporadas.

Sei que é difícil mantê-los em cena continuamente, mas vamos sempre, eternamente pensando em formas de viabilizar nossa arte. O teatro com sua efemeridade característica nos desafia dia-a-dia e descobrir novas formas de continuarmos vivos e em ação, e eu não pretendo desistir!

Holofote Virtual: E ainda tem o Festival Territórios de Teatro que chegou dando uma bela sacudida na cena e nos espaços de atuação da cidade, diga-se...

Ester Sá: A coordenação do festival Territórios de Teatro faço em parceria com o Nando Lima (outro maravilhoso parceiro que tenho a honra de ter). Em 2011 o festival vai para sua 4ª edição, e tem se configurado como uma fala política de resistência dos artistas de teatro da cidade. É um evento importante, pois mostra a nossa produção teatral à cidade.

Holofote Virtual: O cinema é teu mais novo desafio...

Ester Sá: O curta criança é um desses desafios, pois estou na produção executiva do projeto, e estou com uma equipe maravilhosa a coordenar. O filme tem ação direta e animação, e juntos devem formar um filme com unidade. 

Temos o carinho pelo espetáculo e pela essência dele, o que queremos que seja mantida no filme, embora saibamos que apesar do filme nascer do espetáculo, ao mesmo tempo, é outra coisa, uma outra linguagem. será um aprendizado pra todos. aprender a se desprender de certas características do teatro. Achar paralelos para representar, em outra linguagem, a essência do espetáculo teatral.

Holofote Virtual: A produção do curta vai iniciar em janeiro, reuniões, pre-produção pra filmar em fevereiro, certo? Como estão os testes de animação?

Ester Sá: Decidimos pela animação virtual, que será coordenada pelo Andrei Miralha. Já tem um pequeno trechinho que postamos no facebook. Agora em janeiro será dada a largada oficial. Se Deus Quiser lançaremos o filme no natal de 2011.

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